Que os partidos em Portugal, ou em qualquer democracia que se preze, só existem porque há liberdade, também é do domínio público (ou devia ser). Que seja tão difícil os partidos (pelo menos alguns partidos) não perceberem o que é viver em liberdade, 41 anos depois do 25 de Abril, já nos deixa algo perturbados (e inquietos!).
Ora os últimos dias têm sido pródigos em revelações no mínimo estranhas. Então não é que PSD, CDS e PS anunciaram estar a preparar um projecto-lei para consagrar o “regime jurídico da cobertura jornalística em período eleitoral”?! Entre várias medidas, uma surreal em democracia: prever a obrigatoriedade de a comunicação social apresentar planos prévios de cobertura das campanhas eleitorais, a “uma comissão mista” (reunindo o presidente e um vogal da Comissão Nacional de Eleições, e um membro do Conselho Regulador da Entidade Reguladora da Comunicação Social), antes mesmo de terminar o prazo para a entrega das candidaturas, com a incumbência de “apreciar os planos de cobertura […] com vista à sua validação”. Nada mais que um “exame prévio”, que lembra o eufemismo encontrado nos tempos do Estado Novo para invocar a censura sem a nomear. PSD, CDS e PS finalmente juntos, mas na asneira.
A título individual, o PSD notabilizou-se por uma outra ideia: quer que o programa macroeconómico do PS seja “avaliado previamente” pelo Conselho Superior de Finanças Públicas e da Unidade Técnica de Apoio Orçamental. Depois do surrealismo em grupo, o surrealismo a uma voz, e os eleitores, cidadãos (e não cidadãos, como alguns não se cansam de repetir) deste país que se calem que isto de democracia tem muito que se lhe diga e só os sábios a sabem praticar.
Mais dia menos dia, teremos os jornais, as rádios e os canais de televisão a enviar os seus textos a uma entidade qualquer reguladora, e os filmes e as peças de teatro a serem sujeitas a uma visão prévia, não vão ofender alguém. As mulheres que se preparem, porque mais dia menos dia terão de manifestar-se no Rossio a exigir o direito ao voto e, se isto continua assim, haverá escravos a chegar ao Cais da Ribeira das Naus. Tudo em nome da governabilidade do país.
Belas eleições que aí vêm!
Escreve à sexta-feira