Reino Unido. Socialismo regressa ao Partido Trabalhista pela mão de Edward Miliband

Reino Unido. Socialismo regressa ao Partido Trabalhista pela mão de Edward Miliband


O corte com as políticas de Gordon Brown e Tony Blair isolaram o líder trabalhista dentro do partido. O New Labour foi enterrado


A carreira de Ed Miliband como líder do Partido Trabalhista não tem sido fácil. Nos últimos cinco anos teve de enfrentar as críticas dos adversários políticos, imprensa britânica, população e oposição interna. Os desafios colocados não se deveram só ao seu pensamento político – a imagem não tem ajudado Ed Miliband a vencer um concorrente mais popular do que o partido. No entanto, numa altura em que se avalia o trabalho de um governo conservador no poder, o discurso de esquerda facilita a obtenção de votos.

O professor da Universidade de Cardiff Peter Dorey identifica alguns aspectos que ligam as ideias de Ed Miliband ao socialismo. O docente revela que “tem um discurso mais à esquerda do que Tony Blair, pelas críticas que faz ao capitalismo de mercado”. A imprensa acusa-o de ser “antinegócios”. O corte profundo com o “New Labour” verifica-se na tentativa de transformar o “capitalismo predador” em “capitalismo socialmente responsável”, em que a economia “beneficia todos, e não alguns”. Ao longo dos últimos meses, a luta do líder trabalhista tem sido comparar as dificuldades impostas aos mais fracos com os gerentes de topo, que ficaram de fora dos sacrifícios impostos pelas políticas do governo. Tem sido visível a preocupação de Ed Miliband de lutar pelas causas dos mais fracos. A nova face do Partido Trabalhista abandonou definitivamente o centro, que outrora foi ocupado pelo “New Labour”. No entanto, as opiniões são diferentes quando se faz uma comparação com Gordon Brown. Peter Dorey entende que “o actual líder trabalhista vai ser economicamente mais responsável, ao contrário da imagem de gastador e devedor deixada por Gordon Brown”. A falta de visão política é um aspecto que liga os dois trabalhistas.

PERSONALIDADE A oratória é uma característica que favorece o líder do Partido Trabalhista. Não necessita do auxílio do papel quando fala em público. Peter Dorey considera que ele “transmite de forma fluente e articulada os pensamentos”. No entanto, a inconsistência da sua mensagem não permite retirar benefícios. Ao contrário do que acontece com David Cameron, a imagem de Ed Miliband é pouco convincente para a opinião pública escolher um futuro primeiro-ministro.

PERCURSO A ascensão de Ed Miliband à liderança do Partido Trabalhista também foi rápida. Em 2005 foi eleito deputado e, cinco anos depois, chegou à liderança do partido. Peter Dorey é de opinião que “as lutas internas após a derrota em 2010 não se transformaram numa guerra civil devido à sua intervenção”. Contudo, o académico realça a inconsistência e ambiguidade do discurso e as opções políticas do candidato a primeiro-ministro.

MEDIA A relação entre Ed Miliband e a imprensa também não é a melhor. Os meios de comunicação social britânicos têm explorado a imagem “intelectual” do candidato. As sondagens publicadas pelo instituto YouGov.com confirmam as teorias avançadas pelos especialistas. O estudo divulgado revela que mais de metade da população do Reino Unido pensa que a imprensa destaca os defeitos de Ed Miliband. Cerca de 17% dos inquiridos entendem que os media estão ao lado do líder trabalhista. A mesma percentagem considera que a cobertura jornalística tem sido neutra. O problema dos jornalistas com Ed Miliband está relacionado com a sua personalidade e características.

TONY BLAIR A maior dificuldade de Ed Miliband foi conseguir o apoio público de Tony Blair. No início da campanha eleitoral, o antigo primeiro-ministro britânico anunciou estar “a 100% com o líder do partido para defender a manutenção do Reino Unido na União Europeia e o Estado social”. Apesar da declaração, ninguém acredita que o ex-chefe de governo confie plenamente no jovem líder. O aparecimento de várias figuras que pertenceram aos governos de Blair torna as críticas reais. Peter Mandelson diz que “Miliband é confuso e não convence os eleitores”. O homem que acompanhou Tony Blair enquanto este esteve em Downing Street acrescentou: “Neste momento não existe uma narrativa política porque ele não explica como vai fazer crescer a economia.” O antigo ministro do Interior britânico Alan Johnson aponta a imagem de Ed Miliband como um factor negativo. O ex-governante compara a forma como Blair conseguia captar o eleitorado, o que não acontece com o actual líder trabalhista. As declarações dos dois homens fortes dos governos Blair foram proferidas em 2014, mas servem para ilustrar o descontentamento das principais figuras que mantiveram o Partido Trabalhista no poder durante vários anos. As propostas políticas são confusas e a imagem não ajuda na conquista de votos dos menos esclarecidos.

CONFIANÇA Os ataques provenientes de quase todos os sectores não preocupam o líder trabalhista. Na última entrevista antes da pré-campanha, Ed Miliband garantiu que tem condições para ser o próximo primeiro-ministro do Reino Unido. O seu lema preferido, “aquilo que não mata vai tornar-nos mais fortes”, é uma resposta a tudo o que é escrito e falado.