Se o Batman e o Vasco Santana combinassem ir ao cinema hoje, escolheriam ver “Capitão Falcão”. Não sei qual seria o tema de conversa à mesa do jantar que antecederia este encontro, provavelmente um balanço da época do Benfica. Quero crer que o Batman, meu super-herói favorito, seja do meu clube (ainda que o Bruce Wayne seja obviamente um beto do Sporting) e o Vasco Santana, por ter nascido em Benfica, não tivesse tido outro remédio. Sei, no entanto, do que iriam falar estes compinchas à saída da sala: de como este filme, que o realizador e argumentista João Leitão fez com meios que tinha e não tinha, é uma pequena maravilha. O amor move montanhas – e por cá não são poucas as cordilheiras que se atravessam entre a paixão e a execução. É por isso revigorante sair de uma sala de cinema com a sensação de que o amor à cultura pop, o amor a uma ideia, o amor a uma personagem, até o amor transviado à história de um país, pode parir um filme tão arriscado, tão particular e tão fixe. E eu posso dizer “fixe” porque já não sou crítica de cinema há alguns anos.
“Capitão Falcão” foi inicialmente pensado para a televisão mas foi parar ao cinema, o que talvez o condene a ser destratado pela crítica como um subproduto que não merece ecrã grande. Não sei se nos tempos que correm o tamanho ainda importa, tendo em conta que o melhor do cinema está cada vez mais na televisão. Mas admito que os críticos apreciem mais “cinema” do que “filmes”, por isso não espero outra coisa senão que o metam no mesmo saco que um “Sei Lá”, ainda que talvez não utilizem tanto a palavra “inane” para o avaliar.
“Capitão Falcão” é um filme para… olhem: para mim, por exemplo, que me estou sempre a queixar de que não se faz nada porque não se consegue fazer nada, o que me dá uma óptima desculpa para não fazer efectivamente nada. Mas não é só um magnífico labour of love, do coração, para o coração. É também uma comédia que acaba por se insurgir contra o fim iminente da ironia ao ser protagonizado por um super–herói fascista (Gonçalo Waddington, és incrível), que conta com a inteligência do público – coisa rara – para ser devidamente saboreado e compreendido, nestes tempos terríveis em que o politicamente correcto anda a dar cabo de uns quantos recursos estilísticos.
Vesti-vos e ide ver.
Guionista, apresentadora e porteira do futuro
Escreve à sexta e ao sábado