Segunda-feira, 19 Maio de 1975. Em Cleveland, um homem de negócios chamado Harold Franks é atacado, baleado, e morre na loja de conveniência de que é proprietário num ataque que também deixa a mulher ferida. Três jovens, Ricky Jackson e os irmãos Wiley e Ronnie Bridgeman, passam pelo local pouco tempo depois e tornam-se por isso os principais suspeitos. Por culpa de Eddie Vernon, um rapaz de 12 anos que estava num autocarro ali perto com outras crianças. A polícia aproveita o discurso do jovem e o depoimento faz a diferença na condenação dos três suspeitos.
Quase 40 anos depois, a verdade foi novamente escrita. Em 2013, Eddie Vernon alterou o depoimento e deu origem a uma sequência de acontecimentos que está agora a terminar. Depois de ter sido contrariado por outras crianças que estariam consigo, que alegaram ser impossível que tivesse visto o que acontecera do lugar em que estava sentado, Vernon contou finalmente a verdade: “Tudo o que disse foi o que me disseram para dizer. Não tenho conhecimento algum do que se passou no local do crime. Era tudo uma mentira. Eram tudo mentiras.” Eddie Vernon revelou ainda que foi ameaçado pela polícia, que prometeu prender-lhe os pais por perjúrio caso contasse alguma vez a verdade.
O primeiro passo para a nova vida de Ricky Jackson foi dado a 18 de Novembro de 2014 quando a sentença foi anulada e o homem de então 58 anos foi libertado. “O estado reconhece o óbvio”, afirmou o procurador do Ohio, Timothy McGinty. Logo ali, naquele primeiro momento, a emoção de Ricky Jackson veio à superfície no telefonema que fez à família em lágrimas: “Acabou. Vou para casa. Vou para casa. Estejam aqui para me levar na sexta-feira [três dias depois]. E façam com que toda a gente saiba o que se está a passar.” Os 39 anos de sentença injusta não o tornaram uma pessoa amargurada, e até Eddie Vernon mereceu elogios. “Foi preciso ter muita coragem para fazer o que fez. Carregou um fardo durante todos estes anos, tal como nós. Mas no final revelou a verdade e estou muito grato por isso. Muita gente pensa que eu deveria estar zangado, mas foi preciso ter muita coragem para alterar o depoimento”, afirmou, elogiando também o estado por ter a coragem de voltar atrás em algo que estava claramente errado. Por outro lado, falar em justiça leva a uma conversa diferente: “Acho que essa oportunidade se perdeu no dia em que tivemos de ir para tribunal. Mas foi algo que aconteceu. Toda a gente passa por algo na sua vida, isto foi o que nos calhou. O que se passou perdeu-se, não há forma de recuperar.” Uma das maiores tristezas de Ricky Jackson é nunca ter tido filhos.
Cinco meses depois, as notícias sobre Ricky Jackson voltaram a aparecer, com a decisão de o ex-recluso ser compensado monetariamente com um valor superior a 2 milhões de dólares. O quase sexagenário vai receber metade desse valor numa primeira fase – numa conta que será gerida por um conselheiro de forma a facilitar a sua adaptação à nova vida –, enquanto o restante ainda será calculado em pormenor. Feitas as contas, Jackson vai receber 5,92 dólares por cada hora que esteve preso, num total de 14 178 dias atrás das grades por causa de um crime em que não havia qualquer prova física do seu envolvimento. Além disso, o advogado Michael Berry lembra que terá direito ainda a uma verba que supostamente receberia se tivesse mantido um emprego durante todos estes anos. A soma será feita por um especialista, mas Berry pressiona e realça que terá de ser substancial, tendo em conta “o talento incrível e inteligência” que Jackson já mostrou ter desde que foi libertado, em Novembro. “Poderia ter seguido o caminho que quisesse”, acrescenta.
O trio de amigos está actualmente fora da prisão. Ronnie Bridgeman, agora conhecido como Kwame Ajamu, foi o primeiro a sair, em liberdade condicional, em 2003, e depois passou a ter a companhia do irmão mais velho e de Ricky Jackson. No entanto, em relação aos Bridgeman, está ainda por decidir a compensação financeira. Também este mês foram notícia no Illinois os 20 milhões de dólares que um homem recebeu depois de ter estado 20 anos preso por alegadamente ter violado e assassinado uma mulher. Essa verba estabeleceu um novo recorde nos Estados Unidos.
O dinheiro parece ser um factor secundário nesta luta. Essa é, pelo menos, a opinião de Ricky Jackson, que não estava à espera de qualquer dinheiro. Já Brian Howe, advogado do Projecto de Inocência do Ohio, realça que não há valor suficientemente alto para compensar 39 anos passados na prisão por uma injustiça. “Se tivessem vindo falar comigo quanto tinha 19 anos e me dissessem que me deixariam sair da prisão com 60 anos e mil milhões de dólares no bolso… ninguém aceita. Não há dinheiro que compense isso.”