Green Sheikh. De rei do petróleo a embaixador do ambiente


embro de uma família real num país rico em petróleo, al Nuaimi seguiu a carreira que lhe estava quase como destinada. Estudou engenharia petrolífera e assumiu um cargo de topo numa empresa nacional. Mas não foi preciso sequer sair dos Emirados Árabes Unidos para perceber que aquele não era o seu papel e começou a…


embro de uma família real num país rico em petróleo, al Nuaimi seguiu a carreira que lhe estava quase como destinada. Estudou engenharia petrolífera e assumiu um cargo de topo numa empresa nacional. Mas não foi preciso sequer sair dos Emirados Árabes Unidos para perceber que aquele não era o seu papel e começou a reescrever o guião. “É preciso ir ao Inferno para apreciar o Céu. Eu fui ao Inferno”, conta ao i, lembrando os dias em que começou a aperceber-se do impacto que o seu trabalho trazia para o ambiente.
Nesse ponto de viragem, trocou o preto do petróleo pelo verde da floresta e acabou, “fruto do trabalho dos media”, por ver o seu nome encurtado de sheikh Abdul Aziz Al Nuaimi para “Green Sheikh”. “O ambiente tornou-se a minha paixão, a minha causa.” Resume assim um percurso que o levou a um doutoramento em Ecossistemas Industriais e de Produção Limpa, um mestrado em Gestão Ambiental e um sem fim de pesquisas, palestras e campanhas ambientais e ao cargo de conselheiro ambiental do governo de Ajman, o menor dos emirados.
Fala com a calma que lhe é natural, a mesma calma com que passa a sua palavra e resolve os conflitos. “Há pessoas que acham que só se mudam as coisas à força, mas esse tipo de mudança acaba por ser apenas temporária”, lembra, “o valor está em mudar as coisas para a vida, sem esforço.” Para quebrar a distância a que um sheikh habitualmente está, Al Nuaimi troca o thobe – traje tradicional – e o lenço Keffiyeh por uma camisa e um fato. Cumprimenta toda a gente com quem se cruza, responde a quem o contacta por Facebook e não hesita em dar o email a quem o pede. “Nós [os sheiks] somos do povo e nunca nos devemos esquecer disso”, refere.

Al Nuaimi esteve em Lisboa para a conferência “Pontes para um Futuro Mais Sustentável” e falou connosco sobre o papel daqueles que, como ele, têm um papel de liderança numa comunidade. Apesar de reconhecer que o líder deve servir de modelo, lamenta que poucos tenham as características que considera fundamentais para quem está na linha da frente: integridade. É por isso que gostava de levar até ao espaço seis líderes internacionais, de modo a que pudessem apreciar a terra de longe. E porquê seis? “Seis é o meu número mágico, é o número de continentes do planeta”, explica. Sendo um apaixonado por viagens espaciais, não se importava de incorporar esta equipa, desde que na nave estivesse um “representante talentoso” de cada continente. “Cada um de nós voltaria à Terra com uma energia inacreditável, que não ficaria só para nós, seria espalhada ao nosso redor.”

Enquanto a viagem não chega, o Sheikh faz questão de provar, no seu dia-a-dia, que é possível mudar hábitos que façam a diferença. Antes de começar a enumerar a sua lista de bom comportamento lança a pergunta: “Quanto tempo demoram os seus banhos?” Enquanto fazemos conta aos minutos, avança que os seus nunca ultrapassam os dois minutos. “Mesmo assim, isso equivale a um 18 litros de água gastos”, salienta. O desperdício evita-se também à mesa e à hora das refeições serve-se de pouca comida, “apenas aquela que acho estritamente necessária”. Muitas vezes, não se serve e espera que os seis filhos terminem, para comer do que sobrou dos pratos deles. “Eu não os ensino, eu mostro-lhes.” Acredita que mais tarde todos eles vão estar mais conscientes da sua pegada ecológica, mas não esconde que a filha de sete anos é a mais interessada. “Pergunta-me porque faço isso, como faço, quais são as consequências, vai ser melhor que eu quando crescer”, brinca, lembrando que pelo menos já mostrou vontade de igualar o pai. “‘Quando crescer quero ser como tu papá’, disse-me outro dia.”

Um papel diferente do que é habitual a um sheikh não deixa de causar estranheza no seu país. Quando, em 1996, decidiu mudar de vida, saía da empresa onde trabalhava e começava, literalmente, a limpar a rua. Mas essa limpeza, lembra, não fica apenas por retirar lixo do chão, “falo de limpar a mente, limpar o coração, só depois disso é que conseguimos pensar melhor e mudar de atitude”, conta. Movimenta-se num país em que metade da população não tem preocupações ambientais e com uma diversidade que chega às 200 nacionalidades diferentes num só território. “São oito milhões de pessoas muito diferentes mas que têm feito um esforço para melhorar a sua consciência ambiental.” E lembra: “Em 1996, quando era chairman da Environment Friends Society, falávamos em construir edifícios com painéis solares e as pessoas riam-se nas nossas caras.” Para quem duvidava, a evolução foi dando respostas.

Abu Dhabi, a capital do país onde falar de aproveitamento de energia alternativa era motivo de riso, alberga, actualmente, a maior central de energia solar do mundo.