Chantelle Winnie. Perfeita imperfeição


A primeira mancha branca apareceu na zona da barriga, ainda com refegos de bebé. Chantelle, petit nom Winnie, tinha quatro anos. A primeira bolinha branca não lhe causou estranheza nem a segunda, ou a terceira. O único alarme que soou foi na cabeça da mãe. Quando as manchas brancas se espalharam pela pele escura, invadindo…


A primeira mancha branca apareceu na zona da barriga, ainda com refegos de bebé. Chantelle, petit nom Winnie, tinha quatro anos. A primeira bolinha branca não lhe causou estranheza nem a segunda, ou a terceira. O único alarme que soou foi na cabeça da mãe. Quando as manchas brancas se espalharam pela pele escura, invadindo tudo, o diagnóstico chegou: vitiligo – uma doença auto-imune, sem cura, que leva à perda de pigmentação da pele. Michael Jackson, que sofria do mesmo, tornou a doença famosa. Nos anos seguintes, o padrão repetiu-se.

Quando chegava a altura de tirar fotos de família, a mãe de Winnie, apelido Brown-Young, ia buscar os produtos de maquilhagem e tentava escurecer a filha. “Ela só queria que eu me sentisse à vontade”, relembra Chantelle, desculpando a mãe, mulher que sempre descreveu como uma pessoa cheia de força. Nos primeiros anos de escola – Chantelle abandonaria os estudos antes de terminar o liceu –, a miúda de seis ou sete anos não sabia que tinha um problema de pele. “Não sabia o que era vitiligo. Para mim aquilo era uma coisa normal”, contou numa entrevista ao site Flare. Mas quando as suas primeira amigas deixaram de falar com ela poucas semanas depois de terem selado amizade, Chantelle ficou confusa. “Só queria perceber o que tinha acontecido e perguntei-lhes. Disseram-me que os pais as tinham proibido de falar comigo para não apanharem a minha doença.” Foi a primeira vez que a modelo, que hoje está a virar o mundo da moda do avesso e a redefinir o conceito de beleza, percebeu que era diferente. “E piorou à medida que os miúdos foram ficando mais velhos e maus.”

Zebra, muuu, vaca. Ouviu de tudo. “Chegaram a perguntar-me se a minha mãe era branca e o meu pai negro e se eu não tinha sido bem misturada na barriga”, contou a Tyra Banks, quando aos 19 anos participou no “American Next Top Model”, o programa televisivo que procura supermodelos. Ser vítima de bullying passou a ser parte da sua vida – tal como as manchas – até que gritou basta. E passou para o lado negro da força. “Agora estes vão ser os meus novos amigos”- contou numa conferência do TedxTeen – “Não queria continuar a ser vítima de bullying, por isso passei a ser bully. E pensei: ‘Se este é o lado que sobra, deve ser o lado bom.’” Não era, e a adolescente que nasceu e cresceu em Toronto, Canadá, tomaria então uma decisão que mudaria a sua vida. “Percebi que estava a pôr-me num molde que não me servia. E decidi criar o meu próprio molde.” Abraçou a doença, assumiu ter orgulho na sua pele, e a sua confiança uniu milhões de pessoas em todo o mundo. O seu mantra, reconhece, passou a ser um cliché, mas um cliché que funciona: “Há beleza em tudo.”

Karma is a bitch, mas também pode ser fada-madrinha. Depois desta decisão, o Instagram fez de Chantelle a rainha dos desfavorecidos. Tornou-a uma inspiração para todos os que se sentem diferentes e hoje Chantelle tem 570 mil seguidores naquela rede social. Foi nesse pico de fama, em 2014, que a supermodelo Tyra Banks a descobriu. Ficou banzada com a sua beleza única, com o seu vitiligo simétrico, e pôs a produção do programa a correr a net para lhe levar Chantelle. “A minha irmã recebeu uma mensagem numa página de fãs que criou para mim no Facebook. Basicamente dizia que a Tyra Banks andava à minha procura e me queria no programa.”

Não havia maneira de  acreditar no que estava a acontecer, mas depois de algumas conversas via Skype voou para Los Angeles para o casting. A sua presença no programa seria curta – na altura sentiu uma facada nas costas quando foi a segunda modelo a ser expulsa -, mas a aparição no pequeno ecrã abriu-lhe muitas portas, apesar de as agências de modelos continuarem a fechá-las na sua cara. Mesmo sem agente, Chantelle tornou-se o rosto da marca Desigual e entrou numa campanha da Diesel. Continua a ser chamada pelos designers para as passerelles e os artistas gráficos não conseguem parar de retratá-la. As entrevistas multiplicam-se e Winnie Harlow, o seu nome de guerra no mundo da moda, tornou-se um hino vivo à alegria de viver. “As pessoas acham que só porque tenho orgulho na minha pele defendo que não se façam mudanças. Eu não sou a favor nem contra nada, só a favor de ser feliz.”