A Casa Branca está a ser atacada por terroristas e o presidente Sawyer (Jamie Foxx) envolve-se numa luta corpo a corpo com um dos vilões. Quando tenta escapar é agarrado pelos ténis, uns Air Jordan brancos, impecáveis, sem uma mancha de sujidade. É nessa altura que, deitado no chão, numa cena pensada para provocar sorrisos, grita, enquanto pontapeia a cada palavra, “Tira as mãos dos meus Jordan!” O momento retirado do filme “Ataque ao Poder” (“White House Down” na versão original) é um dos sinais mais recentes da importância que os ténis da Nike com o carimbo de Michael Jordan têm na sociedade norte-americana. Porque se o basquetebolista não era um jogador qualquer os ténis também não são. E isso também se demonstra pela quantidade de desportistas que os têm usado desde a introdução do produto no mercado, em 1984, precisamente no ano em que Michael Jordan entrou na NBA, como terceira escolha do draft.
Os contratos de patrocínio estendem-se a outros desportos profissionais, mas é na NBA que os resultados parecem ter mais efeito. Kobe Bryant e Dwyane Wade já não fazem parte do leque, mas há estrelas que resistem, como Chris Paul, Russell Westbrook, Carmelo Anthony e Blake Griffin. E é por isso que, um pouco por todos os bairros norte--americanos, as crianças sonham imitar as vedetas e vêem nuns simples ténis um sinal de ostentação, nobreza e afirmação perante os amigos. A verdade é que o produto é demasiado cobiçado e nem todas as famílias têm capacidade para satisfazer os desejos dos filhos. Os problemas de criminalidade começaram a surgir logo na década de 80 e nunca mais pararam. O número de assaltos a jovens por culpa de um par de ténis aumentou e os dias em que a venda de novos exemplares é aberta ao público costuma gerar motins. Numa dessas ocasiões, em Dezembro de 2011, a polícia foi obrigada a usar gás-pimenta nos arredores de Seattle para diluir vários focos de confronto entre futuros compradores. Em 1988, o director de uma escola secundária em Mumford (Detroit,Michigan) abriu a caixa de Pandora e tornou-se o primeiro a banir a utilização de Air Jordans de forma a controlar os episódios de violência.
O crescente sucesso de Michael Jordan tornou tudo mais difícil. Em 1987 vence o concurso de afundanços com um verdadeiro voo desde a linha de lance livre. Não poderia ter desejado melhor publicidade. É que se há bebidas que garantem que dão asas, os Air Jordan mostravam que era possível voar. As referências em séries e filmes foram aumentando, mas as ligações a crimes mais violentos vão sendo pedras no sapato. Em 1989, Michael Eugene Thomas, um adolescente de 15 anos, foi encontrado estrangulado em Maryland. O rapaz tinha desembolsado 115,50 dólares pelo par e não se mostrou incomodado com os avisos da avó, Birdie Thomas: “Dissemos-lhe que não usasse os ténis na escola. Que podia haver alguém que gostasse deles. Ele respondeu-me:‘Avó, antes que alguém me tire os ténis terá de me matar’.” E foi assim que aconteceu, às mãos de um colega, James David Martin, dois anos mais velho.
Os Air Jordan têm um impacto tão grande que na China houve quem fizesse deles um artigo de colecção. Mick, como se apresentou numa peça da CNN, juntou 283 pares de edições limitadas da marca durante os últimos dez anos e agora, em meados de Fevereiro, levou-os a uma loja de penhores em Pequim. Tudo porque vai casar e precisa do dinheiro para pagar o novo apartamento. De acordo com a notícia, a penhora valeu 160 mil dólares. Um dos pares, assinado por todos os jogadores dos Chicago Bulls em 1993, está avaliado em 17 600 dólares (cerca de 15 500 euros).
Os ténis estão tão enraizados na sociedade norte--americana que podem ajudar no julgamento de Aaron Hernández, prolífico jogador da NFL (New England Patriots de 2010 a 2012) até ser detido pelo homicídio de Odin Lloyd a 26 de Junho de 2013 – foi dispensado pela equipa 90 minutos depois. As sessões estão a decorrer e a acusação está a apostar em provar que as pegadas encontradas junto ao corpo pertencem aos Air Jordan de Aaron Hernández.