Depois de muitas peripécias, na sua área política e nos comentários de Marques Mendes, António Vitorino apresenta a sua candidatura presidencial, as peças nas estações de televisão internacional afinam todas pela mesma bitola: trinta segundos sobre a biografia do candidato e o resto sobre os seu notórios atributos físicos. As imagens gulosas não param: a câmara percorre, em panorâmica vertical, centímetro a centímetro o corpo do prometido, com se o quisesse ter. Nos dias seguintes dezenas de títulos de jornais internacionais realçam as suas aptidões físicas.
\r\nAdmirado? Tirando a duração da panorâmica vertical, bastante mais longa para a polaca Magdalena Ogorek do que seria para o putativo candidato do Partido Socialista português, tudo é rigorosamente igual ao que de facto se passou com ela. É interessante verificar que a esmagadora maioria dos espectadores e leitores não se escandaliza, que uma notícia sobre uma candidata presidencial na televisão lhe faça um zoom sobre as mamas e depois se siga uma panorâmica vagarosa dos sapatos altos Louboutin ao rosto, passando devagar pelas pernas longas. Nem ninguém se irrita muito por uma doutorada em História das Religiões, especializada em catolicismo e na Idade Média, ser objecto de dezenas de artigos quase iguais na imprensa internacional, sempre com a mesma ideia no título: “A mais bela candidata presidencial do mundo”.
\r\nO sorumbático “Financial Times” tenta ir um pouco mais além acerca da candidatura de Magdalena Ogorek, 35 anos, à presidência da República polaca: “É a candidata de choque das eleições presidenciais polacas – uma ex-apresentadora de televisão com muito bom aspecto, quase sem experiência política e com o apelido de “Pepino”.
\r\nA selecção de Magdalena Ogorek, de 35 anos, para representar os sociais-democratas polacos, nas eleições de Maio, gerou uma tempestade nos media de Varsóvia, além de ter merecido um perfil especial na revista “Playboy”.
\r\nVamos aos factos. Ogorek nasceu a 23 de Fevereiro de 1979, um ano depois da eleição do Papa João Paulo II, que abriu caminho à queda do regime comunista na Polónia. A jovem nasceu em Rybnic, é licenciada em História, pós-graduada em Integração Europeia na Universidade de Varsóvia, especialização que completou no Instituto Europeu de Administração Pública de Maastricht, e fez um doutoramento em História de seitas heréticas da Idade Média na Silésia e na Morávia. Tem livros publicados, um dos quais sobre os Templários polacos e a sua dimensão mitológica. Dá aulas na universidade e comenta muitas vezes nas televisões assuntos relacionados com o catolicismo. Foi, aliás, a sua fé que a fez recusar, na juventude, ser militante do partido de que agora é candidata: a Aliança da Esquerda Democrática, herdeira formal dos comunistas polacos. Os sociais-democratas estiveram no poder de 1995 a 2005, altura em que o antigo líder Aleksander Kwasnieski era presidente da Polónia. Perderam grande parte do eleitorado a partir de 2004, abalados por escândalos de corrupção.
\r\nA escolha de Magdalena – que ocupou vários postos governamentais e tem carreira académica, mas é mais conhecida do grande público por ter participado em séries televisivas na juventude, em que fazia papéis de loura boa, e por apresentar programas de televisão – é a tentativa deliberada de recuperar espaço mediático. É uma solução adoptada por muitos partidos europeus, de esquerda ou sem ser de esquerda, que quando perdem fôlego escolhem líderes relativamente jovens para sinalizar ao eleitorado que mudaram. Vejam-se os casos recentes do PSOE, com Pedro Sánchez, e sobretudo da Esquerda Unida em Espanha, que aponta o economista Alberto Garzón, 28 anos, como candidato a chefe de governo.
\r\nResta saber se essas mudanças não são apenas cosméticas e se resultam. As sondagens dão a Magdalena só 6% dos votos, mas até Maio muita coisa pode acontecer.
\r\nDo ponto de vista do conteúdo, Magdalena Ogorek considerou que a sua candidatura era “um apelo aos jovens e aos empresários”, coisa que em termos de ruptura de esquerda parece pouco significativa.
\r\nDesse ponto de vista, e também oriunda dos herdeiros dos comunistas da Polónia, a candidatura mais radical parece ser a de Anna Grodzka, pelos Verdes, a primeira deputada transgénero da catolicíssima Polónia, país conhecido pelo conservadorismo e pela homofobia. Anna tem apenas 1% dos votos nas sondagens, que prevêem a reeleição fácil do actual presidente de direita, Bronislaw Komorowski.