Estante de 2015. Senhores, é favor traduzir


Consagrados, estreantes, regressados. Nomes familiares entre as edições nacionais, ou à espera de um bocadinho de atenção fora dos territórios de origem. Acreditamos que alguns serão vertidos em língua portuguesa e esperamos que outros, já com algum tempo de vida, cheguem até nós com brevidade. Há muito por onde escolher entre os lançamentos mais recentes…


Consagrados, estreantes, regressados. Nomes familiares entre as edições nacionais, ou à espera de um bocadinho de atenção fora dos territórios de origem. Acreditamos que alguns serão vertidos em língua portuguesa e esperamos que outros, já com algum tempo de vida, cheguem até nós com brevidade. Há muito por onde escolher entre os lançamentos mais recentes e agendados para este ano, dos poemas inéditos de Neruda editados pela Seix Barral às conferências sobre tango de Jorge Luis Borges, esquecidas desde os anos 60 e resgatadas em 2013. Maria Ramos Silva selecciona umas quantas referências a ter debaixo de olho nos próximos meses

 

Miranda July
 
Mulheres, homens, um romance e 50 objectos à venda 
 
 A actriz Lena Dunham (“Girls”) não demorou a escrever que o livro, que chega este mês, a fará “rir, arrepiar, e identificar-se com uma mulher que nunca planeou ser”. Dirigimo-nos ao público feminino em primeira instância a propósito de “The First Bad Man”, a estreia no romance de Miranda July, artista, realizadora (“Eu, Tu e Todos os que Conhecemos”, 2005), autora da colectânea de contos “No One Belongs Here More Than You”, que agora nos dá conta da história de Cheryl, que promete cativar tanto o público feminino como o masculino. A protagonista, descrita como uma “mulher vulnerável que vive com um permanente aperto na garganta”, trabalha numa organização não lucrativa dedicada à autodefesa das mulheres. Um dia é confrontada com um pedido dos chefes: acolher temporariamente em sua casa a respectiva filha de 20 anos, Clee, e é aí que o mundo de Cheryl dará uma pirueta. Associado à promoção do livro, o site First Bad Man Store – www.firstbadmanstore.com – tem à venda 50 objectos mencionados na obra. 
 
Deepti Kapoor
 
Uma mulher jovem e solteira entre carros e armas em Nova Deli
O romance de estreia de Deepti Kapoor encontra a sua voz narrativa em Idha, uma jovem entediada da classe média. “Deli não é lugar para uma mulher na escuridão, a não ser que essa mulher tenha um homem e um carro, ou um carro e uma arma”. E se um automóvel permite uma razoável parcela de liberdade, o desejo de embarcar numa relação com um homem mais velho torna-se a certa altura demasiado irresistível. “A Bad Character” é um postal indiano deste século, com passagem pelos meandros do sexo e da cidade em versão local, sobre essa aventura de ser uma mulher, e uma mulher solteira, em Nova Deli. As estruturas narrativas não lineares cultivadas por Marguerite Duras são uma das influências assumidas por Kapoor, uma jovem autora, nascida em Moradabd, que em 1997 rumou a Deli para estudar jornalismo, completando mais tarde um mestrado em Psicologia Social. Passou a década seguinte a colaborar com diversas publicações e a conduzir pela cidade em busca de boas histórias. Vive actualmente em Goa. 
 
Toni Morrison
 
Sai mais um clássico instantâneo para a mesa do canto?
Em “A Dádiva” (Presença, 2009), a primeira mulher negra a ganhar o Prémio Nobel da Literatura (1993) levou--nos até à América do Norte de finais do século XVII. Em Abril, é a vez de chegar às livrarias o 11.º romance, “God Help the Child” (sucessor de “Home”, 2012), que, espera-se, continue a dar seguimento às suas “personagens ricas e diálogos brilhantes”, como prevê boa parte da crítica, ansiosa por mais um “clássico instantâneo”. A escritora, que acumula ainda na lista de galardões o American Book Award e o Pulitzer na categoria de ficção, debruça-se agora sobre o impacto dos primeiros anos de vida, mais concretamente sobre “a forma como os traumas de infância formam e deformam a vida dos adultos”, segundo comunicou o seu agente, levantando o véu sobre o conteúdo de “God Help the Child”. “It’s not my fault. So you can’t blame me. I didn’t do it and have no idea how it happened”: assim arranca a história guiada por uma mulher, Bride, envolta numa mentira cujos ecos ainda e sempre se fazem escutar.
 
Kazuo Ishiguro
 
Amor, vingança, guerra e outras memórias perdidas
Ninguém lhe tira o Booker Prize por “Os Despojos do Dia” (1989), nem o elogio à sua capacidade de ampliar as possibilidades da ficção. Para os fãs de Kazuo Ishiguro, tem sido uma espera longa – já lá vão dez anos desde “Never Let Me Go” (ok, talvez se recorde melhor do respectivo filme, de 2010, com esse triângulo amoroso composto por Carey Mulligan, Keira Knightley e Andrew Garfield). 
Mas eis que chega este ano o muito antecipado “The Buried Giant”, sem que possamos adiantar-nos muito sobre o recheio da obra do escritor de origem japonesa, cuja família se fixou no Reino Unido na década de 60. A Faber&Faber, responsável pela edição do seu trabalho em solo de sua majestade, disponibilizou um breve aperitivo: trata-se de um livro sobre “memórias perdidas, amor, vingança e guerra”. Para quem não aprecia spoilers, digamos que chega e sobra. Para quem espera uma descrição um pouco mais generosa, nada a fazer. É contar os dias, semanas e meses até Abril, momento previsto para o lançamento deste enredo, num cenário pós-Império romano.
 
Mary Costello
 
Uma história de família entre continentes
 Em Abril, nos EUA, os caminhos vão dar a “Academy Street”, onde a irlandesa Mary Costello (não confundir com a personagem da série “Ossos”) ainda não é conhecida como uma frondosa avenida, mas tem tudo para deixar de habitar um pequeno beco literário. De resto, no Reino Unido, de onde nos chega, recolheu vários prémios e granjeou o reconhecimento de nomes ilustres, como Ron Rash e J. M. Coetzee. “Academy Street” acompanha o percurso de uma mãe solteira, Tess, que se desloca da Irlanda para o continente americano, com os anos 40 em pano de fundo. O primeiro romance de Costello, que há vários anos tem andado a conjugar, de forma discreta, a escrita com a casa e a família, sucede ao conjunto de pequenas histórias intitulado “The China Factory”. “A escrita de Mary Costello tem a urgência que os grandes problemas exigem – chamá-los pelos nomes –, e é esse tipo de problemas que fazem um escritor”, defendeu a vencedora do Booker Anne Enright, uma das vozes que alinha no coro de elogios a esta história de família.
 
Jonathan Franzen
 
Depois da liberdade, os segredos que a pureza esconde
Deverá chegar no final do Verão, ou Setembro, para sermos mais exactos, e apresenta-se como um “épico americano multigeracional”, prometendo ser um dos mais discutidos durante o ano em questão. O quinto romance de Jonathan Franzen, o primeiro desde “Liberdade”, esse campeão de vendas de 2010, põe o autor a contar a história da órfã Purity Tyler, mais conhecida por Pip, distinção com um certo cunho dickensiano. Tyler é uma jovem em busca do seu pai, que deambula entre a América dos nossos dias, o sul daquele continente e ainda a Alemanha de Leste, antes da queda do muro de Berlim, acabando por entrar na órbita de um herói fora da lei da internet. “É um livro sobre segredos: segredos de Estado e empresariais, e ainda sobre o poder dos segredos no seio das famílias, sobre a forma como afectam as nossas relações e as nossas emoções”, descreveu Nicholas Pearson, editor no Reino Unido do norte-americano Franzen, que se estreou na ficção em 1988, com o complexo thriller satírico “The Twenty-Seventh City”. 
 
Catie Disabato
 
Todos querem saber onde anda Lady Gaga
No seu Tumblr define-se como “uma loura de seios avantajados de 28 anos em Sunset Boulevard”. É a mesma página onde se congratula quando recebeu a imagem do rosto do seu livro. “Cum caraças, tenho uma capa! É linda. Espero que isto me garanta o acesso aos Iluminatti.” Não se deixe iludir pela aparente leveza dos comentários, nem pelo eventual desinteresse motivado por uma história que mais parece destinada a adolescentes. Esta é a estreia da jovem escritora sediada em Los Angeles Catie Disabato. Combinar humor e actualidade é meio caminho andado para perceber a figura que dá corpo à obra: nada mais, nada menos que a cantora pop Lady Gaga. E se, de repente, a diva da extravagância desaparecesse do mapa durante a gigantesca digressão Monster Ball, deixando 152 datas por cumprir, um prejuízo de milhões à sua editora e milhares de fãs desapontados? É livre de imaginar o que sucederia mas, se não estiver para puxar do miolo, basta pensar que Catie tratou de tudo. E ler, ou tentar fazê-lo, com gosto. Sem receio de um “Bad Romance”.
 
J. C. Hallman
 
Eu, Nicholson Baker e todos os escritores que conhecemos
O amor, a literatura, a vida moderna. Tudo embrulhado numa trama arriscada e divertida – a julgar por algumas apreciações – que pisca o olho a “U and I”, esse clássico de Nicholson Baker sobre a sua relação literária com o escritor John Updike. “B & Me: A True Story of Literary Arousal” é J. C. Hallman de volta aos livros e ao registo ecléctico (ou esquizofrénico, consoante a apreciação) que o tem caracterizado, ora debitando informação sobre xadrez, ora explorando o mundo das utopias. O editor da Simon & Schuster usa a expressão “auto-arqueologia literária” para se referir ao trabalho do californiano Hallman, entretanto comparado a nomes como Geoff Dyer e Elif Batuman, ambos autores de produtos que têm ajudado a talhar um novo género memorialista que chega aos olhos dos leitores de forma refractária, fruto das obsessões de quem assina. Qual fileira de bonecas russas. esta é a história de J. C. a ler e a descobrir Nicholson Baker, na senda das leituras e descobertas de Baker, e em processo de autodescoberta pelo caminho.