O coarguido Manuel Pedro, no âmbito do processo Freeport, confirmou hoje, no Tribunal do Barrreiro, a existência de uma reunião, em janeiro de 2001, com o então ministro do Ambiente, marcada pelo presidente da Câmara de Alcochete, na época.
A reunião realizou-se a 11 de fevereiro de 2002 e juntou o então presidente da Câmara de Alcochete, o socialista José Dias Inocêncio, o ministro do Ambiente José Sócrates e o secretário de Estado do Ambiente Rui Gonçalves, Garry Russel, diretor comercial do Freeport, Jonathan Rawnsely, administrador do Freeport, e Fernanda Vara Castor, na altura funcionária da Direção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território.
Manuel Pedro e Charles Smith, ex-sócios da empresa de consultoria Smith & Pedro, são os dois arguidos no processo e estão acusados da tentativa de extorsão.
Questionado por Afonso Andrade, presidente do coletivo, sobre o motivo desta reunião, Manuel Pedro indicou que visava debater alterações necessárias à viabilização do projeto, nomeadamente retirar hotéis e outras infra-estruturas, na origem dos dois chumbos anteriores.
Afonso Andrade confrontou ainda o arguido sobre um documento de Charles Smith para William Bill Mckinney, o anterior dono dos terrenos do Freeport, no qual se dizia sob "vigilância apertada de ministros", o que levou Manuel Pedro a classificar de "sarcástico" o coarguido no processo.
O presidente do coletivo de juízes perguntou depois a Manuel Pedro se sabia identificar "Pinóquio", "Bernardo" ou o "Gordo", supostos nomes de código constantes no processo.
Manuel Pedro disse que, de todos aqueles nomes apenas desconhecia Bernardo, lembrando que Charles Smith usava alcunhas para toda a gente.
O coarguido especificou que "Pinóquio" era o contabilista da Smith & Pedro, que estava no Algarve, os ambientalistas – "que se opuseram sempre ao projeto e nunca ganharam nenhuma queixa em Bruxelas" – eram "os senhores dos cágados" e, pelo que sabia, "o gordo seria" ele mesmo, disse.
Sobre o alegado pedido de 80 mil libras feito por Charles Smith ao diretor comercial Gary Russel, destinados a um Bernardo, para que o licenciamento do Freeport não sofresse mais atrasos, Manuel Pedro disse:
"Penso que esse dinheiro era para entregar ao contabilista, o sr. José Ginja, para viabilizar protocolos para continuar a desenvolver o projeto, mas não sei o que queria dizer com Bernardo".
O Tribunal perguntou também a Manuel Pedro se sabia identificar uma "Inocência", mas o arguido disse desconhecê-la.
Quando confrontado pelo Tribunal com o depoimento de Mónica Mendes, uma ex-funcionária da Smith & Pedro entretanto despedida, no qual assegura ter ouvido o arguido Manuel Pedro falar com um ex-engenheiro da consultora João Cabral, de pagamentos ao ministro José Sócrates, que seria "o filósofo", Manuel Pedro ironizou, dizendo que não gostava "particularmente de filósofos".
Manuel Pedro negou ainda que alguma vez se tivesse deslocado ao gabinete do advogado Augusto Ferreira do Amaral, para lhe confessar que tivesse feito pagamentos a ministros do governo de então nem tão pouco a José Sócrates.
Na sessão do passado dia 20 de março, Augusto Ferreira do Amaral dissera em tribunal que um dos arguidos, Manuel Pedro, lhe disse que o então ministro do Ambiente, José Sócrates, tinha exigido o equivalente a 500 mil contos (2,5 milhões de euros), para viabilizar o complexo comercial.
No mesmo dia, o advogado de José Sócrates, Daniel Proença de Carvalho, negou que o ex-ministro do Ambiente tivesse exigido qualquer verba para a aprovação do empreendimento.