Derek Redmond. A história do homem que ficou em último


Catalunha em pleno Agosto. Estamos em Barcelona e no estádio Lluís Companys a multidão vai aumentando para ver as meias-finais de uma prova que esteve presente em todos os Jogos da era moderna. São os 400 metros, uma volta completa ao estádio. Só é preciso ser um dos quatro primeiros para passar à final. Derek…


Catalunha em pleno Agosto. Estamos em Barcelona e no estádio Lluís Companys a multidão vai aumentando para ver as meias-finais de uma prova que esteve presente em todos os Jogos da era moderna. São os 400 metros, uma volta completa ao estádio. Só é preciso ser um dos quatro primeiros para passar à final. Derek Redmond só quer uma medalha, não interessa qual. Depois de oito operações aos dois tendões de Aquiles, que o impediram de participar nos jogos de Seul, esta é a oportunidade da sua vida.

O Redmond júnior aproxima-se do início da pista, enquanto Jim, o seu pai, se senta nas bancadas mais altas. A pistola dispara e Derek arranca. A táctica é a do costume: correr a um ritmo suave durante quase toda a prova e acelerar ao máximo nos últimos 30 metros. Derek está a ir bastante bem, “o melhor é guardar o máximo de energia para o final”, pensa. Três passadas depois, a 175 metros da linha final, ouve um estalido. A princípio, Derek não consegue perceber o que é. Depois percebe que lhe dói a perna direita. É aquilo a que chamam o tendão do jarrete, que fica na parte de trás da coxa, a dar de si. “Oh não!”, pensa Jim do alto das bancadas, ao ver o filho a coxear com uma expressão de sofrimento no rosto, e a acabar por parar agarrado à perna. Os outros sete atletas ultrapassam-no rapidamente.

A equipa médica aproxima-se, trazendo uma maca. “Não, nem pensar, não saio daqui de maca. Vou acabar a minha corrida”, diz-lhes Derek. Na sua cabeça, ainda é possível apanhar os outros, muito embora o atleta inglês esteja simplesmente a coxear. Ao mesmo tempo, um Jim Redmond desesperado começa a empurrar tudo e todos e a descer as bancadas, pouco preocupado com o facto de não ter nenhuma credencial.

Uns segundos depois, os outros acabam a prova. É aí que Derek percebe que o sonho da medalha, seja ela de que metal for, está acabado. “Estou fora dos Olímpicos, outra vez”, diz para si. Mas quer terminar a corrida. Coxeando devagarinho, cheio de dores e lavado em lágrimas, Derek continua, amargurado. E é então que uma figura curiosa invade o campo: uma t-shirt vistosa que pergunta em inglês “Já abraçou o seu pé hoje?”, umas calças caqui, um boné da Nike, tudo a correr em direcção ao atleta, ignorando os seguranças que o tentam impedir. Jim não percebe espanhol, muito menos catalão. E mesmo que percebesse; naquele momento, a única coisa que importa é o seu filho. Jim corre, alcança Derek, põe-lhe o braço por cima do ombro e serve-lhe de muleta nos 100 metros finais. “Não tens de fazer isto”, diz-lhe o pai. “Tenho sim!” “Se é assim, fazemos isto juntos”. Em Inglaterra, a sua mãe vê a prova pela televisão e chora; não vê o filho assim tão infeliz desde os seis anos, quando não recebeu a bicicleta que queria. Em Barcelona a multidão grita, encorajando Derek. No momento em que cruza a meta, a sua irmã, grávida de nove meses, começa a ter contracções em casa.

Derek Redmond acaba por ser desqualificado. No final da corrida, Linford Christie, o vencedor dos 100 metros e eterno rival de Redmond, dirige-se a ele. É do conhecimento público que os dois se detestam e raramente se falam. Christie aproxima-se de Derek, que chora compulsivamente, e os dois abraçam-se. Ao sair do estádio, as 65 mil pessoas presentes já não recordam quem foi o vencedor da prova. Quando chegarem a casa, vão antes contar à família a história do homem que ficou em último lugar.