E se o italiano Giovinco, o jogador mais baixo do Europeu (1,64 m), marcasse um golo ao gigante Neuer (1,93 m)? Isso é que era engraçado, mas quando chegamos a Lviv ainda a meia-final com a Itália está fora da equação. É véspera do Alemanha-Dinamarca, terceira jornada da fase de grupos.
Entre o final do treino e a zona mista, há tempo para entrar numa loja desportiva, cheia de cachecóis amarelos e azuis, da Ucrânia. Jogam em casa mas o preço é de sair dali para fora: 260 uah (26 euros). Enquanto nos espantamos com o excesso de números, o pachorrento vendedor mal sentado na cadeira revira os olhos, encolhe os ombros e dita a sua sentença ‘é caro porque é da Adidas’ e reforça Adidas com escárnio e mal dizer. Estamos conversados, então. Vamos à zona mista dos alemães e por lá passa o tranquilo Manuel Neuer. Temos vontade de lhe chamar “ò Manel” mas também temos a certeza e a noção de que isso ser-nos-ia prejudicial à saúde. Por isso, “Neuer, se faz favor”.
Se já não se lembra, Neuer é o guarda-redes que faz uma exibição de sonho no Dragão em Março de 2008 e depois ainda defende os penáltis de Bruno Alves e Lisandro López para qualificar o Schalke 04 para os quartos-de-final da Liga dos Campeões 2007/08. E é ele também, agora pelo Bayern Munique, quem adia o sonho do Real Madrid em conquistar a décima Taça/Liga dos Campeões ao adivinhar os remates de Ronaldo e Kaká no desempate por penáltis em pleno Santiago Bernabéu, nas meias-finais.
Recordista de minutos sem sofrer golos na liga alemã pelo Bayern (1147), é também um homem do showbiz. Na edição especial do “Quem Quer Ser Milionário?” da RTL, em Novembro de 2011, Neuer arrecada 500 mil euros (entregues a instituições de caridade) sem responder à última pergunta de um milhão: “A que invenção se atribui a Martin Behaim, de Nuremberga. a) compasso b) régua c) globo d) compasso magnético?” Neuer não sabe. “Vamos acabar por aqui”. É a resposta c – aliás, o cosmógrafo, astrónomo e explorador alemão Behaim morre em Lisboa em 1507 depois de se casar nos Açores em 1486. E Neuer não sabe isso? Tsss tsss. Adiante.
Reparámos que o Neuer fala de vez em quando com os apanha-bolas durante os tempos mortos. Porquê?
Peço-lhes uma bola para tocar nela, senti-la com as mãos, o peito, os pés e lembrar-me da sua medida e do seu peso. Sabes que o guarda-redes é o mais solitário dos jogadores? [risos]
Mas da baliza tem-se uma visão privilegiada?
Isso é verdade, somos como os treinadores. Cá atrás, vemos situações curiosas como por exemplo determinadas acções repetitivas deste ou daquele jogador adversário ou até de companheiros nossos. Com a nossa interpretação do jogo, dá para falar durante o jogo ou ao intervalo com quem de direito para avisar sobre determinados perigos e corrigir posições daí para a frente.
Por falar nisso, nunca o vi discutir com os defesas. Deve ser o primeiro guarda-redes que não sai da baliza a protestar com tudo e todos.
Quando os defesas erram, eles sabem-no automaticamente. Não vale a pena estar a dar-lhes na cabeça. Eu não gostaria que o fizessem a mim… Quando muito o contrário: dar força e ânimo.
Mas nunca levanta a voz?
Claro que sim. Temos que nos fazer sentir presentes mas com moderação e inteligência. Sem exasperação. Até porque também cometo erros. Como os defesas e os adversários. O futebol é um jogo de erros. Não há volta a dar. Quem comete menos erros, ganha.
É então muito diferente de Kahn e Lehmann, os seus antecessores na selecção. Eles refilavam muito…
Admiro-os bastante e tive a sorte de conhecê-los mas não sou a réplica de alguém que admiro. Sou uma pessoa independente com as minhas ideias. Não há nenhum jogador que tenha a chave para todas as respostas certas ou a verdade absoluta, nem mesmo o treinador. Temos de ter sempre muito cuidado com o que vemos e ouvimos para depois fazer o que está certo.