Letónia, Luxemburgo, Estónia, Alemanha, Arménia, Azerbaijão, Suíça, África do Sul, Islândia, Chipre, Dinamarca, Ucrânia e agora Polónia. Cristiano Ronaldo é uma espécie de William Fogg. Percorre o mundo a marcar golos. Já colecciona 13 países e é o nosso elemento mais global, à frente de aventureiros como Eusébio (12) e Figo (11). Como se isso fosse pouco, o capitão tem ainda o dom de qualificar a selecção para as meias-finais do Europeu com um oportuno golo de cabeça. Vamos a Donetsk no dia 27 para defrontar um dos dois últimos carrascos em Mundiais (França-2006 e Espanha-2010) e a pensar na final de Kiev.
Em Varsóvia, local do primeiro jogo de preparação em 2012 (0-0 com a Polónia), o estádio é invadido de força maciça por adeptos checos e polacos, que gritam descontroladamente czechiiiiiii e polskaaaaaaa a toda a hora. De Portugal, apenas o quem não salta é… e sem grande expressão. Mas isso de jogar fora de casa não é um problema para esta selecção, que entrega o comando do jogo ao adversário como nos anteriores três jogos.
A República Checa aproveita para (tentar) ser perigosa com as diagonais de Jiracek mas não incomoda realmente Rui Patrício nem os centrais Bruno Alves-Pepe. O seleccionador checo Bilek, um valente lateral-esquerdo nos anos 80 com dois golos a Portugal (2-1 em Praga), na qualificação para o Mundial-90, monta a equipa sem o maestro Rosicky, lesionado. Faz estrear Darida mas este é engolido pelo meio-campo português, que corta todas as ligações possíveis e imagináveis para o avançado Baros. Do outro lado, Portugal também é uma selecção apagada, retraída. Parece o cubo de Rubik, em que ninguém consegue achar a resolução, nem por sombras. Pelo meio, Postiga cai sozinho agarrado à perna direita e é substituído por Hugo Almeida. Não há ninguém que faça a diferença? Vamos lá ver… no último minuto da primeira parte, assistência primorosa de Raul Meireles, perfeito controlo com o peito de Ronaldo e remate ao poste! A solução passa por aqui, então.
Quando o árbitro inglês Howard Webb (com quem nós jamais havíamos ganho: empate em Belfast, derrota na Dinamarca e empate na Bósnia) apita para o reinício, Portugal entra a dominar com um cabeceamento desviado de Hugo Almeida aos 17 segundos e, pronto, lá se vai a República Checa. A segunda parte é exclusiva de Portugal. Alugámos o meio-campo por 45 minutos e ficámos ali a trocar bolas e a fazer remates ao boneco. Neste particular, Cech tem responsabilidade a adiar o inevitável. Raul Meireles, Moutinho, Miguel Veloso, Nani, Ronaldo e até Coentrão ameaçam a baliza checa. É uma questão de tempo mas que seja dentro dos 90 minutos porque é injusto jogar mais meia hora. Ronaldo acerta outra vez no poste (aí vão quatro neste Europeu) e Moutinho obriga Cech a defesa de recurso para canto.
O pressing é cada vez mais evidente e o golo até nasce numa jogada quase inofensiva. A bola está com os checos mas recuperamo-la através de Nani, que liberta Moutinho na direita e este cruza para o interior da área. Ronaldo é mais rápido que o etíope Gebre Selassie, ultrapassa-o na curva e cabeceia com categoria. Cech ainda toca na bola mas não evita o golo, a derrota e a ida para casa. É o terceiro golo de Ronaldo ao checo, uma história iniciada com aquele fabuloso cabeceamento na final da Liga dos Campeões em Moscovo-2008, e é também a 11ª vez que Ronaldo abre o marcador. O nosso William Fogg é agora o melhor marcador do Europeu, com três golos. Se juntarmos aqueles dois em 2004 e o outro em 2008 (à República Checa, a Cech…), tem seis no total. Iguala Nuno Gomes neste ranking e está a três do rei Platini – e a um de Shearer.
Os últimos minutos continuam a ser de Portugal, excepção feita aquele raide de Jiracek pelo lado direito em que ultrapassa João Pereira com relativa facilidade. Raul Meireles tenta novamente o golo e João Pereira tem o 2-0 à sua mercê sem Cech na baliza mas demora tanto que permite o corte dos checos. O apito final chega e é a sensação de justiça. O 1-0 peca por escasso. Se isto não fosse o cubo de Rubik, seriam dois ou três. Ficámo-nos pela vantagem mínima na primeira vez que o mui ilustre espectador Rui Patrício não sofre golos no Europeu. Continuamos sem perder no primeiro dia do Verão (RDA-1959, Dinamarca-1966, México-2006 e Coreia do Norte-2010) e continuamos a sonhar. Agora voltamos à Ucrânia. Gostámos tanto que daqui voamos para Donetsk. Depois, só faltará conhecer Kiev.