Uma das coisas que a direita sempre gostou de criticar em Mário Soares foi a sua viragem à esquerda na última fase da vida política. Soares esteve nos fóruns de Porto Alegre contra os riscos da globalização e atacou violentamente Tony Blair e a Terceira Via.
Mais tarde torna-se um dos mais duros críticos do governo de Passos Coelho e da troika. Organiza duas sessões políticas na Aula Magna contra as imposições do governo e da troika onde junta toda a esquerda – estavam lá representantes do Bloco de Esquerda e do PCP, para além do PS, embora não o PS institucional, ainda dirigido na altura por António José Seguro.
Esta “esquerdização”, que já vem do combate a Tony Blair e à Guerra do Iraque, no início do século, mostra que Mário Soares – também nesta questão – teve razão antes de tempo. Ou seja: percebeu muito mais cedo do que qualquer outro português a deriva de mimetização com os partidos de direita que estava a ser empreendida pelos socialistas europeus. E achou por bem dar o seu contributo para travá-la. Esse foi talvez o seu último combate. É evidente que Mário Soares não teve qualquer responsabilidade na criação da geringonça, mas abriu caminhos quando fez questão de juntar a esquerda contra a austeridade. Isto passou-se em 2013.
Mário Soares fica chocado com a possibilidade de António José Seguro dar o seu apoio ao governo de Passos Coelho – como pretendia Cavaco Silva – e entra num processo de conflito com o antigo secretário-geral do PS, a quem acusa de ser pouco duro com o governo de direita. Em 2014 é talvez o primeiro a declarar o seu apoio à candidatura de António
Costa contra António José Seguro, afirmando que Costa seria capaz de “unir a esquerda”. Soares percebeu que a decadência dos partidos socialistas europeus se explicava por terem alienado o discurso de esquerda e se terem tornado irmãos gémeos da direita. Foi o primeiro a perceber isso. E também aí teve razão antes de tempo. Soares e os PS europeus. Ter razão antes de tempo.
