Atualmente a forma de encarar a fraude no desporto deverá compadecer-se de outras análises que não as de tempos idos. Nos dias de hoje a fraude, ou mesmo a corrupção, no desporto não se limita à atividade desportiva/competitiva em si, ou seja, o seu âmbito de atuação encontra-se muito mais vasto. Já não estão, unicamente, em causa subornos a atletas/equipas que visem a alteração dos resultados, ação apontada como uma das mais clássicas (quer pela antiguidade quer pela frequência) de corrupção desportiva. São conhecidas e mediaticamente expostas prodigiosas fraudes no sistema desportivo.
São inúmeros os fatores que estão na origem do alargamento das possibilidades de cometer atos fraudulentos no desporto em geral, nomeadamente a globalização, os avanços tecnológicos, a configuração das associações desportivas (e.g. as SAD´s, as associações desportivas com/sem fins lucrativos, as academias desportivas), entre outros.
No entanto, não se procura analisar as causas da fraude no desporto, nem a sua extensão, procura-se tipificar alguns desses comportamentos, quer constituam eles um ato de corrupção, ou simplesmente um comportamento antiético.
São vários, e em expansão, os “escândalos” que nos são dados a conhecer. Ninguém é indiferente à facilidade com que os agentes desportivos (sejam atletas, dirigentes ou organizações) das mais diferentes modalidades, se conseguem envolver em fraudes e, muitas vezes, gozar de impunidade.
De uma forma muito generalista a Gestão económico-financeira das instituições desportivas é ainda suscetível de potenciar uma panóplia de fraudes e atos de corrupção. As organizações desportivas conduzem a sua gestão financeira de forma análoga a qualquer outra empresa. Igualmente, não difere a forma como esta gestão pode ser danosa. Para além das questões mais comuns, tais como despesas fictícias, usufruto de bens e serviços das instituições, por parte de elementos externos às mesmas, aquisição de produtos para favorecimentos pessoais, é ainda visível a crescente relação entre as instituições desportivas e os agentes dos atletas. É problemático (para a instituição) quando os seus dirigentes (seja um administrador ou um diretor) são, paralelamente, os agentes dos atletas contratados para a organização desportiva da qual fazem parte. Obviamente, estamos perante um conflito de interesses, no qual se pesa num prato da balança o valor da comissão adquirida e no outro o real interesse da transação (interesse no atleta, valor extrapolado, finalidade da contratação). Em território nacional, no que ao futebol diz respeito, ainda vão sendo conhecidos alguns casos, nem sempre por intervenção das entidades reguladoras, mas muitas vezes porque, passando a expressão, “Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades”. As trocas de acusações revelam acima de tudo uma gestão económica e financeira perniciosa. Outro ponto controverso são as Apostas – O mercado das apostas desportivas online tem tido um crescimento exponencial nos últimos anos. São diversos os fatores que podem ter contribuído para este incremento, nomeadamente a internet (seu desenvolvimento, fácil acesso, o anonimato associado, elevado número de utilizadores), os elevados montantes envolvidos, a falta de regulamentação do mercado e o fenómeno da globalização em geral. No entanto, alguns estudos apontam para o facto dos apostadores desportivos de todo o mundo concentram as suas apostas em jogos que ocorrem principalmente na Europa, envolvendo biliões de euros.
Potenciadas pela globalização, as redes criminosas, conscientes deste mercado garantiram a sua presença em instituições desportivas por toda a Europa, investindo monetariamente com intuito de “libertar” dinheiro de atividades ilícitas (e.g. tráfico de droga, tráfico humano). A atividade criminal económica, no desporto, tem vindo a tornar-se muito significativa essencialmente com as apostas relativas aos resultados combinados – Portugal inclui-se na lista[1] dos países da EU envolvidos em casos de viciação de resultados (incluindo só casos do futebol). A problemática da viciação de resultados poderá, a primeira vista, parecer uma questão menor, no entanto, é-lhe subjacente um mercado obscuro que emerge sem regulamentação com baixa deteção e elevada impunidade.
No entanto, relativamente a outras modalidades, pouco ou nada se ouve. “Jogará” tudo dentro da legalidade? Ou será por falta de interesse mediático? Acresce ainda o facto das atenções mediáticas, sociais e reguladoras, estarem voltadas para a competição de elite, ignorando (quase) por completo o que se passa nas camadas inferiores, particularmente no que se refere à viciação de resultados.
Muitas vezes o cidadão comum distancia-se destas questões por considerar que as organizações não são alimentadas por dinheiro dos contribuintes, mas sim de sócios e associados. O que nem sempre é verdadeiro, pois o Estado investe parte do seu orçamento em clubes de futebol; em associações desportivas de basquetebol, andebol, etc; em federações portuguesas das mais diversas modalidades…e ainda bem que o faz. Em bom rigor, o investimento no desporto nacional até poderia ser mais elevado, no entanto deveria ser de forma mais profissional, mais estruturado e melhor planeado, bem como mais rigoroso e mais fiscalizado.
[1] No ano de 2012 Portugal figura como um dos países da EU onde decorrem investigações relativas a viciação de resultados (KEA European Affairs cit in Emine Bozkurt, 2012).