Faz hoje dois anos que nasceu o Novo Banco, fruto da queda do império do Banco Espírito Santo (BES)e da liderança de Ricardo Salgado. O anúncio foi feito pela voz do governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, que decidiu aplicar ao BES uma medida nunca usada no país e que levou o termo “resolução” para as conversas de café.
A generalidade da atividade e do património do banco foi “transferida, de forma imediata e definitiva, para o Novo Banco, devidamente capitalizado e expurgado de ativos problemáticos”, anunciou, na noite do dia 3 de agosto, o Banco de Portugal.
Dois anos depois o que mudou? Praticamente nada. Pela instituição financeira já passaram dois presidentes: Vítor Bento, que substituíra Ricardo Salgado no BES, aceitou ficar no Novo Banco, mas acabou por bater com a porta um mês depois. Seguiu-se Stock da Cunha, que liderou a instituição financeira até ao final deste mês de julho. António Ramalho prepara-se agora para assumir a gestão do banco, estando apenas à espera de luz verde por parte do Banco Central Europeu (BCE) que deverá chegar a meio deste mês.
Apesar de ser licenciado em Direito, António Ramalho tem uma ligação forte ao mercado de capitais. Esteve ligado ao Totta & Açores, ao Pinto & Sotto Mayor e ao Crédito Predial Português, regressaria mais tarde à banca, como administrador do BCP. Sai da presidência da Infraestruturas de Portugal para liderar a instituição financeira.
Para trás ficou um processo de venda falhado e o impasse no relançamento desse processo, no início deste ano.
Os dois processos foram feitos com Stock da Cunha e em relação ao que está em curso só existirão novidades em setembro. Há duas modalidades em ponderação para a alienação do banco, mas só no próximo mês se saberá qual segue em frente. É possível uma venda a investidores estratégicos e há quatro propostas em cima da mesa. Uma delas é apenas uma carta de “intenções”, do BCP, a que se juntam as do BPI e dos fundos Lone Star e Apollo/Centerbridge. Em alternativa, pode haver uma dispersão em bolsa, numa operação que poderá ser aprovada pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários se apenas destinada a investidores institucionais e não no retalho. Não se sabe, por isso, se terá de participar numa nova fusão bancária.
Perdas atrás de perdas Stock da Cunha saiu do banco sem conseguir colocar o banco a dar lucros. Ainda na sexta-feira passada foi anunciado um novo resultado líquido negativo – desta vez de 362,6 milhões de euros no primeiro semestre de 2016, superiores ao do mesmo período do ano anterior.
O Novo Banco justifica que o resultado foi influenciado negativamente pela “provisão para custos de reestruturação e pelo registo da totalidade do valor relativo à Contribuição Sobre o Setor Bancário e das contribuições para o Fundo de Resolução Nacional e Fundo Único de Resolução”, revelou em comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.
Enquanto decorre a venda, o Novo Banco continua a implementar o plano de reestruturação, que agora será levado a cabo por António Ramalho. Tem pela frente um plano em curso que prevê vender 700 milhões de euros em ativos imobiliários até ao final do ano. Também em mãos terá a alienação de várias operações internacionais, nomeadamente as subsidiárias em França (BES Vénétie) e Macau (NB Ásia).
Face às perdas e à possibilidade de não aparecer uma proposta razoável para comprar a instituição, o governo já admitiu numa carta recente enviada à Comissão Europeia que não injetará mais dinheiro. O banco poderá até ser liquidado.
Já em fevereiro deste ano, o PCP tinha proposto a nacionalização da instituição financeira, defendendo que, uma vez que o Estado pagou pela resolução do antigo BES, deverá ficar responsável pelo banco. Uma proposta que surgiu depois de Vítor Bento, ex-presidente do BES, ter dito que a nacionalização do Novo Banco “seria uma saída possível”. Tudo em nome de uma consolidação bancária a pensar no “futuro”.
Fumo à vista Também ao final de quase dois anos foi possível encontrar uma solução para os lesados do BES – que está à espera da luz verde final do Ministério das Finanças. Depois de 11 reuniões, o grupo de trabalho constituído pelo Banco de Portugal, CMVM, representante do Estado, BES e a associação que representa os lesados chegou-se a um acordo que pode abranger 90% dos clientes.
De acordo a Associação dos Lesados e Indignados do Papel Comercial, não é a solução ideal, mas é a “possível”. Uma solução em que o Estado não entra diretamente, mas será financiado por várias entidades. Pelas contas da associação, os prazos de implementação da solução serão “muito curtos”.