Contra as sanções, marchar, marchar


Há que louvar o perfeito entendimento entre Marcelo e António Costa, que mais parecem Dupond e Dupont


A polémica em torno das sanções a aplicar pela União Europeia demonstra bem a fuga à realidade em que Portugal vive, com todos os órgãos de soberania a entoar a mesma música celestial. Neste âmbito há que louvar o perfeito entendimento entre Marcelo e António Costa, que mais parecem Dupond e Dupont. Na verdade, o primeiro–ministro insiste todos os dias que as sanções não fazem qualquer sentido e o Presidente acrescenta mesmo mais: que as sanções não fazem qualquer sentido.

A narrativa sobre as sanções parece, assim, uma viagem na irrealidade quotidiana em que o país vai caindo suavemente das nuvens. Primeiro, disseram-nos que as instituições europeias não iam levantar qualquer processo a Portugal. Depois, quando o processo foi aberto, disseram-nos que o processo iria ser encerrado sem qualquer sanção. Depois vieram dizer que iria haver uma sanção, mas que seria apenas de zero. Depois dizem-nos que a sanção não vai ser zero, mas que será apenas simbólica. Quando se começa a falar que a sanção simbólica é, afinal, o corte de 16 fundos estruturais, o governo ameaça processar a Comissão Europeia, usando a estratégia do devedor relapso que, quando entra em incumprimento, ameaça processar o seu credor.

Será esta uma estratégia absurda e inconsequente? Não, o governo continua a ter não só um Presidente complacente, como uma maioria parlamentar que o apoiará nesta estratégia. O Bloco de Esquerda considera a ameaça de sanções uma “declaração de guerra a Portugal”, tendo proposto como resposta bélica o referendo ao Tratado Orçamental. E o PCP, que há muito defende a saída do euro, é capaz de ser ainda mais radical na resposta. O país vai assim unir-se num grito de guerra “contra as sanções, marchar, marchar”. Não parece é que o resultado venha a ser muito diferente da versão original “contra os bretões marchar, marchar”, desencadeada pelo ultimato inglês.

Quando se aceitam tratados que impõem certas regras, tem de se estar preparado ou para as cumprir, ou para sofrer as consequências do seu incumprimento. É pena que os nossos governantes não assumam a realidade em que o país se encontra.

 

 

 


Contra as sanções, marchar, marchar


Há que louvar o perfeito entendimento entre Marcelo e António Costa, que mais parecem Dupond e Dupont


A polémica em torno das sanções a aplicar pela União Europeia demonstra bem a fuga à realidade em que Portugal vive, com todos os órgãos de soberania a entoar a mesma música celestial. Neste âmbito há que louvar o perfeito entendimento entre Marcelo e António Costa, que mais parecem Dupond e Dupont. Na verdade, o primeiro–ministro insiste todos os dias que as sanções não fazem qualquer sentido e o Presidente acrescenta mesmo mais: que as sanções não fazem qualquer sentido.

A narrativa sobre as sanções parece, assim, uma viagem na irrealidade quotidiana em que o país vai caindo suavemente das nuvens. Primeiro, disseram-nos que as instituições europeias não iam levantar qualquer processo a Portugal. Depois, quando o processo foi aberto, disseram-nos que o processo iria ser encerrado sem qualquer sanção. Depois vieram dizer que iria haver uma sanção, mas que seria apenas de zero. Depois dizem-nos que a sanção não vai ser zero, mas que será apenas simbólica. Quando se começa a falar que a sanção simbólica é, afinal, o corte de 16 fundos estruturais, o governo ameaça processar a Comissão Europeia, usando a estratégia do devedor relapso que, quando entra em incumprimento, ameaça processar o seu credor.

Será esta uma estratégia absurda e inconsequente? Não, o governo continua a ter não só um Presidente complacente, como uma maioria parlamentar que o apoiará nesta estratégia. O Bloco de Esquerda considera a ameaça de sanções uma “declaração de guerra a Portugal”, tendo proposto como resposta bélica o referendo ao Tratado Orçamental. E o PCP, que há muito defende a saída do euro, é capaz de ser ainda mais radical na resposta. O país vai assim unir-se num grito de guerra “contra as sanções, marchar, marchar”. Não parece é que o resultado venha a ser muito diferente da versão original “contra os bretões marchar, marchar”, desencadeada pelo ultimato inglês.

Quando se aceitam tratados que impõem certas regras, tem de se estar preparado ou para as cumprir, ou para sofrer as consequências do seu incumprimento. É pena que os nossos governantes não assumam a realidade em que o país se encontra.