As entrevistas previstas atrasam porque surge um problema técnico no palco da MEO Arena, onde irão tocar dali a menos de duas horas, no âmbito do Super Bock Super Rock. “E ainda temos muito para fazer”, comentam, depois de tudo aparentemente resolvido. Talvez por isso, os dois irmãos, Guy e Howard Lawrence, os cérebros por detrás dos Disclosure, dividem-se para as entrevistas agendadas. Ao i calhou Guy, o mais velho, com quem falámos sobre o sucesso e as exigências de um mercado cada vez mais veloz.
Acabaram de lançar o EP “Moog For Love”. Mais uma vez as vossas referências musicais são referência do passado, que não são comuns em jovens de vinte anos, como é o vosso caso. Tem a ver com o vosso passado musical, já que os vossos pais são ambos músicos?
Definitivamente. O Howard tem uma alma velha, sem dúvida. Eu nem tanto. Mas o nosso passado musical, com os nossos pais, não foi ligado à dance music. O nosso pai é guitarrista e cantor e gosta de música rock, como os Led Zeppelin, The Who, Genesis… E a minha mãe é teclista e também cantora e gosta de pop, motown e soul. Portanto, dance music e eletrónica não fizeram parte da nossa vida familiar, ao crescermos. Tivemos de descobrir esses estilos por nossa conta. E o que aconteceu foi que, na altura em que comecei a sair à noite, o dub step estava em altas, e o house também, tal como o garage. Mas acho que todos podem encontrar referências do passado, só têm de as procurar.
Mas é muito diferente quando se cresce com essas referências. É isso que permite que, independentemente de recorrerem a várias colaborações e reunirem muitas influências, se sinta reconheça sempre que é um trabalho dos Disclosure?
Há pessoas que crescem com as coisas e tornam-se grande puristas e não querem fazer nada que possa mudar aqueles ritmos de que gostam. Só querem soar ao que se soava antes. Mas nós amamos house e garage mas não somos preciosistas em relação a nada por isso sempre quisemos misturar os ritmos, trazer a pop e o rock com que crescemos. Essa colisão entre a dance music e a pop é a razão porque escrevemos músicas como “Hatch” e “Omen”, que reúnem todas essas influências. E o outro fator é que nós não crescemos a fazer deejaying. Acho que quando se cresce a fazer de DJ e se quer fazer música para incluir nos sets, geralmente fica-se muito agarrado ao tipo de música que se gosta de passar e todas as músicas vão soar ao mesmo para que se adequem aos sets. Para nós é muito diferente: eu toco bateria e guitarra, o Howard toca piano. Sempre sentimos que podemos fazer o que quisermos, não temos regras para obedecer, não há um som a queiramos soar. Sabemos que gostamos de um certo feeling jazzy e de old school drum machines. Gostamos dessas coisas e por isso gostamos de as usar, mas não nos sentimos obrigados a nada.
O facto de terem crescido com um universo musical tão alargado dá-vos mais confiança para se aventurarem em diferentes ritmos e colaborações?
Sim. Totalmente. A diferença entre o primeiro álbum, “Settle”, e o segundo, “Caracal”, é muita, em termos de tempo. No segundo álbum tivemos a sensação de que, como já tínhamos feito um álbum de house, queríamos tentar uma outra variedade de ritmos e também de pessoas. Mas mantendo o som coeso para que as pessoas o reconheçam como nosso. Por isso temos os sintetizadores típicos, mas depois deixámos que as vozes fossem mudando as identidades das faixas. Fizemos as faixas simples e depois os cantores convidados deram-lhes outra imagem. Queremos fazer algo diferente em cada álbum, mas sem nunca perder a nossa identidade. Até porque também não queremos alienar os nossos fãs. Pelo menos não excessivamente! Mas também tenho de ser honesto e se fizermos algo realmente louco e inovador, e perdermos fãs por isso, ganharemos outros que antes não gostavam do que fazíamos e que passam a gostar. Lembro-me que, no verão passado, quando lançámos uma canção chamada “Bang That”, que depois foi incluída no álbum “Caracal”, as pessoas não gostaram muito e agora quando a tocamos nos espetáculos é o ponto alto. Acho que há sempre alguma coisa para cada pessoa, e não há que ter medo de experimentar algo novo. Todos os cantores e bandas que admiramos estão sempre em mutação. Como o Prince, que lançou tantos álbuns e todos eram diferentes. Ou o Di Angelo, que apesar de só ter lançado três álbuns, são todos muito diferentes uns dos outros. Respeito muito os músicos que não se repetem.
Uma das críticas que, por vezes, se lê ao vosso trabalho é que, sobretudo com o segundo álbum, “Caracal”, optaram por um caminho muito comercial. Isso é algo que vos preocupa? Seguirem um caminho muito comercial ou, pelo contrário, fazerem opções mais de nicho, são escolhas conscientes no vosso projeto?
A verdade é que, com a crítica, nunca se pode ganhar. Sobretudo depois de um primeiro álbum [”Settle”] tão bem sucedido como o nosso. Fizéssemos o que fizéssemos a seguir iam sempre odiar. E ainda assim, apesar de o nosso segundo álbum ser muito mais pop, foi um grande sucesso também, pelo menos junto do público. Por isso não quero saber. E para quem nos critica por nos termos tornado muito comerciais, agora lançámos este EP que não tem vozes, é só house music e temas cheios de soul. Agora sim podem dizer que é excessivamente de nicho. Mas é como disse: não podemos ganhar. Por isso o importante é que eu e o Howard gostemos do que estamos a fazer.
Mas porque decidiram lançar agora um EP em vez de um novo álbum?
Porque queríamos lançar algo novo para o verão. Pareceu-nos um pouco estranho andarmos em digressão e não ter nada de novo para mostrar no verão. E como já tínhamos algumas canções feitas, pensámos: “Porque não lançá-las agora, para o verão?” Além do mais tencionamos, depois desta tournée, fazer uma longa pausa. Não temos férias há seis anos e era bom vermos os amigos e a família. Por último, acho que este EP foi uma boa forma de mostrar às pessoas que disseram que o segundo álbum era demasiado popular, porque agora apresentámos umas faixas de house clássico dos Disclosure. Mas lançaremos um terceiro álbum, seguramente, só ainda não sei quando.
E já estão a receber pedidos para colaborações, que é algo que marcou profundamente o vosso segundo álbum, “Caracal”, onde contaram com The Weeknd, Sam Smith, Gregory Porter, Lion Babe, Kwabs, Lorde e Miguel, entre outros?
[risos] Isso não sei… Ainda não começámos a pensar no próximo trabalho. A verdade é que “Caracal” saiu apenas há oito meses, ainda é recente. E agora saiu este EP. Mas o mundo hoje em dia é tão rápido… A capacidade de concentração das pessoas hoje em dia é muito curta. Ainda assim, não sentimos essa pressão de lançar já mais um álbum. A única pressão que sentimos é aquela que colocamos a nós próprios.