
Todo processo de evolução tecnológica passa pelas fases de investigação fundamental, investigação aplicada, desenvolvimento, demonstração e disseminação, havendo muitas recorrências entre estas fases.
Existe um erro comum na política de apoio à inovação tecnológica, que se apelida na gíria da inovação, “Picking the winners”, ou “Technology push”, e que consiste em governos ou instituições de apoio à inovação, pretenderem adivinhar quais as tecnologias que se irão impor ao mercado, e decidirem apoiá-las de forma intensiva numa fase ainda muito verde da respetiva curva de aprendizagem. Esses erros conduzem na grande maioria das vezes a elefantes brancos e enorme desperdício de recursos públicos.
A prática mais correta e adequada, é a que se designa por “market pull”, isto é, designar-se um resultado como objetivo, e mantendo neutralidade tecnológica, deixar que as várias tecnologias que possam atingi-lo, compitam entre si para atingir aquele resultado, com o menor custo possível e o melhor desempenho técnico e ambiental. Vem isto a propósito de um concurso que corre que se estará a preparar para 10 GW de eólica “offshore” na costa portuguesa. A energia que esse investimento irá produzir pode-se estimar em cerca de 30 TWh, sujeita à intermitência própria das fontes renováveis. Por razões que desenvolvo noutro artigo, existe uma barreira à injeção de elevados volumes de energia intermitente no mercado ibérico, limitados pela reduzida capacidade de interligação entre Espanha e França.
Sendo assim, o que parece mais adequado, seria um concurso para a entrega no sistema elétrico nacional daquele volume de energia, limpa, segura e despachável 24x7 horas da semana, remetendo para candidatos a responsabilidade de gerir a intermitência através de medidas de armazenagem competitivas e eficazes. Assim se conseguiria a neutralidade tecnológica, e o level playing field entre as várias tecnologias, aliviando o gestor do sistema do quebra-cabeças de gerir fontes intermitentes que podem causar grande stress e risco de rutura ao abastecimento, com os concomitantes elevados custos para os consumidores.
Todo processo de evolução tecnológica passa pelas fases de investigação fundamental, investigação aplicada, desenvolvimento, demonstração e disseminação, havendo muitas recorrências entre estas fases. E existe a inovação disruptiva, diferente da incremental, esta mais na fase de maturidade dos processos, a primeira muitas vezes associada a processos de casualidade ou de investigação por mera curiosidade. Não existe modo de antever a forma de como as tecnologias vão evoluir, sem tentar e errar, tentar outra vez e errar outra vez, até ir progredindo na curva de aprendizagem, sem que se saiba antemão, qual será o processo e as técnicas vencedoras no fim destes processos. O processo da inovação é suficientemente complexo, para não possibilitar adivinhar, com anos de antecedência, quem se irá impor no mercado.
É inegável o sucesso dos processos competitivos lançados para fazer avançar o solar fotovoltaico em Portugal, que se encontrava muito atrasado no “mi” energético nacional face ao seu potencial. Mas parece-me que seria de ponderar seriamente o formato dos novos concursos nas linhas do que escrevi em cima. Uma democracia de qualidade, assente numa eleição dos representantes em círculos uninominais, permitiria ter deputados mais críticos e informados sobre este e outros processos, auxiliando os responsáveis governamentais a encontrar as melhores soluções para os processos que irão condicionar o nosso futuro nas próximas décadas.
Engenheiro, Consultor, ex- secretário de Estado da Ciência e Inovação, ex-diretor das Novas Tecnologias de Energia da Comissão Europeia, Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade