Na política, a desonestidade intelectual compensa
Os socialistas sempre demonstraram uma notável propensão para a amnésia ou a memória seletiva, quando se trata dos seus próprios erros.
O Partido Socialista deve estar mesmo muito desesperado para, no encerramento das suas Jornadas Parlamentares, ter ido rapar ao fundo do tacho o último argumento quando todos os outros falham: a austeridade de Pedro Passos Coelho.
“Fiz o exercício de ir recuperar o plano de emergência social do PSD [de 2011 e 2015]”, disse Ana Catarina Mendes, uma das mais enérgicas propagandistas do PS. “A única novidade é que se altera o apoio das cantinas sociais, para se dar um vale alimentar. Isto não é solidariedade, é assistencialismo e uma forma como não podemos olhar para a sociedade”.
Também Eurico Brilhante Dias, outro obsequioso servidor do poder socialista, recordou esses tempos difíceis.
“Pedro Passos Coelho indicou a emigração como solução para os mais jovens. A perda de oportunidades representa sempre perda de qualidade de vida”, lamentou.
Os socialistas sempre demonstraram uma notável propensão para a amnésia ou a memória seletiva, quando se trata dos seus próprios erros. Sobre os motivos que levaram às decisões difíceis de 2011-2015, sobre a irresponsabilidade criminosa que levou o país à beira da bancarrota, nem uma palavra. Mais: quando algumas medidas impopulares introduzidas por Passos e companhia dão jeito, ninguém lhes toca, mesmo sendo o contexto atual completamente diferente.
Há ainda outro aspeto que não se pode negar. Vítor Gaspar é muitas vezes atacado por isso, mas o facto é que teve a frontalidade e honestidade de anunciar um “enorme aumento de impostos”. Outro governo qualquer teria embrulhado as notícias desagradáveis de forma cuidadosa, apresentando as mesmas medidas como uma benesse fantástica para os contribuintes. Por outras palavras:_não teria coragem para falar verdade.
Ana Catarina Mendes fez “o exercício de ir recuperar o plano social do PSD”. Esqueceu-se, por exemplo, de dizer que esse plano foi lançado em tempo de vacas magras. Brilhante Dias lamentou “a perda de oportunidades nesses anos”. Ambos ilustres “aparelhistas” especializados numa área muito específica da política – a do frete ao Governo –, ocupam hoje altos cargos na hierarquia socialista. Uma é ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, o outro é líder da bancada parlamentar e secretário nacional do PS. Em Portugal, a desonestidade intelectual tem as suas compensações.