
Proprietários de restaurantes queixam-se de clientes que efetuam reservas e depois não aparecem. “Parece que vieram de Marte e não se apercebem que estamos a trabalhar com metade da lotação”, confessa Gigi da Quinta do Lago.
Os empresários do setor da restauração já levam meses de serem apanhados desprevenidos por novas medidas do Governo contra a covid-19. Mas as adaptações em tempo recorde às novas restrições e regras de contenção da pandemia não são o único problema com que se deparam. Um outro grande motivo de queixa são os próprios clientes, revela ao i João Lourenço, proprietário do Paixa, um dos mais conhecidos restaurantes de Vale do Lobo, no Algarve.
“Há grupos que marcam mesas em vários restaurantes e depois à última da hora decidem a que restaurante querem ir. Depois ligam para os outros, quando ligam, a dizer que surgiu um imprevisto”, conta.
A situação não é de agora, garante o empresário: “Acontece todos os anos”. Com a agravante de que agora, com a pandemia, nos estabelecimentos de restauração, além da limitação horária, a disposição das mesas deve respeitar uma distância de pelo menos um metro e meio, o que faz reduzir a lotação máxima dos espaços. Ora o que acontece é que quando os clientes não aparecem, as mesas, que já são poucas, acabam por ficar desocupadas e isso representa um prejuízo acrescido para os estabelecimentos. “É uma questão de respeito e de bom senso das pessoas, que infelizmente em grande parte dos casos não existe, porque nós confiamos nas pessoas e depois elas não aparecem”, critica João Lourenço.
Bernardo Reino, vulgo Gigi e dono do restaurante na Quinta do Lago a que empresta o mesmo nome, também descreve a mesma situação. “Marcam e não aparecem. Parece que vieram de Marte e não se apercebem que os restaurantes estão a trabalhar com metade da lotação”.
Além da “falta de civismo” dos clientes, o empresário alerta ainda para outro aspeto. “Desconfio que há também centrais de reservas, do tipo Trivago, que ligam e depois tentam vender a reserva dessas mesas com uma taxa. Se venderem ótimo, se não venderem são mais essas mesas que ficam desocupadas”, relata e acrescenta que essas empresas normalmente “reservam com nomes como José da Silva, o que cheira a truques da invasão de agosto”.
Apesar das dificuldades que todos os contornos desta questão colocam, Bernardo Reino diz que continua a ter clientes “fidelíssimos” e que esses “são bem comportados” e, por isso, sente-se de certa forma “blindado” destes riscos.
Em declarações ao i, o presidente da Associação Nacional de Restaurantes PRO.VAR confirma que o problema de os clientes faltarem às marcações “é uma situação recorrente e que não acontece só no Algarve”, mas reconhece que naquela região “como é um mercado muito mais sazonal, os clientes são mais circulantes e, portanto, não há uma fidelização tão grande aos espaços e aí o risco de isto acontecer de facto é maior”.
Segundo Daniel Serra, o que muitos empresários do setor começaram a fazer foi alterar o sistema de reservas. “Alguns guardam as mesas e dão alguns minutos de segurança até o cliente chegar. Há outros que só aceitam reservas por ordem de chegada consoante o número de pessoas que já lá estão”, detalha.
Reservas com depósito caução Para prevenir situações em que as mesas ficam por ocupar, alguns restaurantes têm optado por pedir o número de cartão de crédito ao cliente no momento da reserva para garantir uma caução no caso de o cliente não aparecer.
De acordo com o responsável da PRO.VAR, “há um valor mínimo que é cobrado caso o cliente não apareça e que difere de restaurante para restaurante, conforme o que está combinado com o cliente”. É o caso do restaurante 100 Maneiras, no Bairro Alto, em Lisboa, do chef jugoslavo Ljubomir Stanisic. Neste restaurante galardoado com a distinção de uma estrela Michelin, a reserva implica deixar os dados do cartão de crédito como forma de garantia. Caso a pessoa não compareça e não avise da desistência até 24 horas antes da hora reservada, o estabelecimento cobra-se de uma caução.
Embora este sistema de caução esteja muito vulgarizada no estrangeiro, em Portugal, para já esta modalidade de reserva ainda não é legislada no setor da restauração, estando apenas disponível para os hotéis e alojamentos locais.
Por exemplo, há muito tempo que as reservas individuais em restaurantes de luxo na Ásia envolvem a solicitação de um depósito no momento da marcação, como acontece no Longtail, com uma estrela Michelin, em Taipé, no Taiwan. Contudo, nos Estado Unidos geralmente este género de pré-pagamento só é exigido em reservas de grupos, é o caso do L’Atelier de Joel Robuchon em Nova Iorque, EUA. Mas é uma prática que tem vindo a mudar em todo o mundo à medida que mais restaurantes começam a aceitar pré-pagamentos para reservas individuais. Por exemplo, estabelecimentos como o dinamarquês NOMA com duas estrelas Michelin e o Sushi Saito também com duas estrelas, em Hong Kong, aceitam o pagamento integral no momento da reserva, enquanto o ULTRAVIOLET de Paul Pairet em Xangai com três estrelas Michelin aceita um depósito de 50%. Já Dominique Bouchet, com duas estrelas Michelin, em Tóquio, anota as informações do cartão de crédito no momento da reserva e cobra-se apenas pelos não comparecimentos.
*Texto editado por Vítor Rainho