Geopolítica dos dados
Na União Europeia, o modelo de acesso aos dados com caráter pessoal incorpora uma maior garantia da proteção, da privacidade e da vontade dos indivíduos.
As condições de acesso aos dados, a sua qualidade, o seu volume e a capacidade de os usar para gerar soluções e serviços, valorizar produtos e otimizar cadeias de produção e de distribuição com base em inteligência artificial serão cada vez mais determinantes na capacidade competitiva das empresas, dos territórios, das nações e das parcerias supranacionais.
O resultado desta mudança de “combustível” propulsor da aceleração das economias e da transformação das sociedades tem uma base científica e tecnológica, mas é muito mais que um processo tecnocrático. A geopolítica e a geoeconomia dos dados tomam agora, cada vez mais, o papel antes desempenhado pela geopolítica e pela geoeconomia das matérias-primas fundamentais para a criação de riqueza em cada ciclo do desenvolvimento humano.
A tensão recente entre os Estados Unidos da América e a China em torno da quinta geração (5G) da internet e do controlo dos dados nela gerados e transmitidos, com impactos colaterais em todo o mundo tecnológico e político, é apenas a face mais visível desta mudança de paradigmas na competição global, em que a retórica das fronteiras, das barreiras ou da territorialização dos operadores tem cada vez menos importância.
Os dados são um recurso de textura diferente dos seus antepassados. São o alimento da máquina mas, ao mesmo tempo, embebem-se nela e, através dos mecanismos de atribuição de significado, transformam-na, participam na mutação permanente das perceções, influenciam escolhas e determinam os caminhos. Nalgumas potências globais, o acesso aos dados é controlado pelo regime político e livre para as empresas e as instituições por ele validadas e nas condições que estabelece. Noutras, esse acesso é definido pelas interações do mercado e o acesso é contratualizado caso a caso, em troca de benefícios tangíveis ou intangíveis para quem os cede.
Na União Europeia, o modelo de acesso aos dados com caráter pessoal, inspirado pelos valores da parceria e pelas suas normas jurídicas, incorpora uma maior garantia da proteção, da privacidade e da vontade dos indivíduos. Para muitos, a carência de dados que daí pode decorrer será um fator de não competitividade para quem precisa de aceder a grandes quantidades de informação para gerar respostas competitivas. Para outros, o ambiente de maior proteção e respeito pelos direitos dos cidadãos será, pelo contrário, um selo de qualidade e um fator de atratividade da UE na nova geopolítica dos dados.
Para poder recuperar e ser resiliente no processo de transição digital, a União Europeia tem de ser profundamente exigente na aplicação de padrões éticos baseados no princípio de que nela se desenvolverá uma inteligência artificial centrada nas pessoas, feita por elas e para elas, resultando os dados necessários de um contrato transparente de troca de serviços em que os cidadãos, por opção e com garantias, cedem dados para obterem melhores respostas nas áreas que são fundamentais para a sua qualidade de vida.
Essa forma de fazer diferente, imposta como regra e como prática a quem quiser desenvolver as novas tecnologias na UE, é a melhor estratégia de afirmação geopolítica e de resposta e precaução contra chantagens, controlos ou tentativas de submissão, venham elas de onde vierem.
Eurodeputado