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Joana Mortágua 11/04/2018 09:46
Joana Mortágua
Cronista

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Colocação sem erros, exige-se!

Na sexta-feira passada, a maioria do parlamento exigiu justiçano concurso e menos arrogância ao governo

Não há escolas sem professores, isso é certo. Mas decidir como se colocam milhares de professores em centenas de agrupamentos espalhados por todo o país não é tarefa fácil. É um regime complexo, às vezes parece uma manta de retalhos, em alguns aspetos injusto ou ineficaz, mas com uma vantagem: regras previsíveis.

Os concursos de professores obedecem a momentos concretos. De quatro em quatro anos realiza-se um concurso geral, externo e interno, em que todos podem mudar de escola. É como um sistema de rios e barragens em que se abrem todas as comportas. Depois, durante os três anos seguintes, o sistema fica bloqueado. A partir daí há concursos anuais em que podem entrar novos professores no sistema, por vinculação ou contratação, mas os outros não se mexem.

Como está bom de ver, estes concursos plurianuais são dos aspetos mais importantes para o funcionamento da escola pública. Um pequeno erro – como aconteceu, e não tão pequeno assim, no tempo de Nuno Crato – pode virar do avesso milhares de vidas de professores, alunos e famílias de uns e de outros.

Os alunos, por um lado, beneficiam de um corpo docente estável. Os professores, por outro, não podem andar com a casa às costas de quatro em quatro anos. Apesar disso, muitos deles, fruto das circunstâncias e das regras existentes, acabaram por ficar vinculados a escolas ou quadros de zona pedagógica muito longe das suas casas e das suas famílias. É um risco assumido pelos professores que correm o país para acumular tempo de serviço e, com isso, tentar a aproximação a casa.

Porque fazem isto? Devido a uma regra previsível no regime de concursos: os docentes são ordenados por graduação profissional, uma ponderação entre tempo de serviço e a nota de fim de curso. É essa ordenação que determina se os docentes são colocados mais próximos ou mais distantes das suas preferências. Esta regra é unânime. Mesmo que no início de carreira seja mais desfavorável, ela introduz um critério de justiça inegável que seria difícil alcançar de outra forma.

No último concurso plurianual, realizado em 2017, houve centenas destes professores que, como sempre, contaram com esta regra para concorrer à mobilidade interna. Estão vinculados longe das suas casas, mas há anos que conseguem ser colocados perto da família porque são os mais graduados. Foram estes docentes que ficaram conhecidos como “os lesados do dia 25 de agosto”.

Foi nesse dia de verão que saíram as listas de colocação e estes docentes ficaram a saber que tinham sido colocados a centenas de quilómetros do que era habitual. Porquê? A explicação pode parecer um pormenor técnico, mas arrasou a vida destas pessoas: o governo decidiu colocar a concurso, neste primeiro momento, apenas os horários completos. Problema número um: fê-lo sem prever as consequências para estes professores. Problema ainda maior: fê-lo sem os avisar, para que pudessem ter essa nova regra em conta na altura das suas candidaturas.

Desde esse momento, estes docentes não pararam de lutar para reverter a alteração de regras sem aviso prévio. Muitos reconheceram a injustiça, incluindo o Presidente da República. Logo em agosto, fomos vários a avisar o governo de que ainda havia soluções possíveis sem colocar em causa o concurso, soluções administrativas.

Como quase todos os problemas, arrastá--lo só tornou a solução cada vez mais dolorosa e complexa. O que poderia ter sido resolvido de imediato com um ato administrativo acabou, por teimosia, no isolamento do governo no parlamento.

Na sexta-feira passada, a maioria do parlamento exigiu justiça no concurso e menos arrogância ao governo. Ao contrário do que propôs o ministério, que apenas sugeriu que os professores descontentes trocassem vagas entre si, tornou-se evidente que seria necessário repetir o concurso plurianual porque estava em causa a previsibilidade, a credibilidade e a estabilidade destes momentos tão importantes para a escola pública.

O parlamento fez a sua parte, agora cabe ao governo garantir que a repetição do concurso decorre sem problemas e que todos os professores são colocados como esperam ser, por graduação profissional, acautelando as situações daqueles que possam ser prejudicados. Nenhum sistema funciona em cima de injustiças. A realização do concurso não é um problema de uma minoria, mas uma garantia de todos.

 

Deputada do Bloco de Esquerda

 

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