Honra-me Raquel Abecassis com o convite para escrever para o i um texto sobre o 25 de Abril. Começo por uma declaração de interesses : O 25 de Abril de 1974 foi, e continua a ser para mim, um dos dias mais felizes da minha vida. Nasci em 1949 portanto já tinha 24 anos no dia da Revolução. A minha família foi de resistentes à ditadura. Os meus avós materno e paterno foram várias vezes presos. O meu pai foi um dos cidadãos mais vezes preso como opositor da ditadura. Não foi, nem de longe, o preso político com mais anos de cadeia, nesse ranking os comunistas portugueses do PCP ocupam o podium. Mas deve ter sido dos que mais vezes foram presos, 12 vezes. A minha infância e juventude foram marcadas por esses exemplos e essas histórias. Eu pessoalmente nunca fui preso, é uma lacuna séria. Quando a Revolução chegou, e sabíamos que ia chegar só não sabíamos quando, foi uma imensa explosão de alegria. Ainda hoje me emociona a memória desses momentos inesquecíveis, as canções muito especialmente a Grândola, e os cravos vermelhos. Que continuam a ser hoje símbolo de Liberdade e Solidariedade.
A Revolução de Abril começa por ser uma revolta militar contra a falta de saída política para a Guerra Colonial, prolongava-se há 13 anos em três frentes, Angola, Moçambique, e Guiné. Portugal chegou a ter mais de 200.000 homens, a maioria milicianos, envolvidos nessas guerras. A Revolução é curiosamente quase exclusivamente obra dos militares profissionais que tinham passado pela Academia Militar. Os militares profissionais apesar de ainda jovens, nalguns casos já tinham passado em rotações sucessivas pelas três frentes de combate. É verdade que houve uma subida da consciência política dos militares profissionais que resultou do entrosamento com os milicianos. Muitos passados já pelas Universidades e com elevada consciência política democrática. Mas o golpe Revolucionário de 25 de Abril de 1974 começa por ser quase só um movimento um tanto corporativo que ganha consistência e vai ganhando também fortes convicções democráticas. É desse ponto de vista algo novo no Mundo da época. E que ganha a opinião pública, nomeadamente a da esquerda, para o respeito pelos militares e pelas Forças Armadas. Isto, não se esqueça, menos de um ano depois do golpe militar fascista de Pinhochet no Chile. Essa é uma grande vitoria do 25 de Abril que ainda hoje perdura como exemplo em todo o Mundo. Segundo ponto importante a Revolução armada num país em guerra foi feita praticamente sem efusão de sangue. Com excepção de cinco jovens assassinados pela PIDE entrincheirada na sua sede em Lisboa. O movimento militar despertou enquanto decorria e desde o início um imenso entusiasmo popular que o fez desde logo ganhar direito ao título de Revolução. Outro ponto importante é o que tem que ver com a guerra e a descolonização. Acabar com a a guerra era um dos objectivos centrais da Revolução. A guerra terminou e a descolonização fez-se nas colónias africanas. Não foi uma boa descolonização porque nunca houve boas descolonizações e a descolonização portuguesa foi muito tardia por responsabilidade da ditadura. Outro ponto essencial, os nossos militares revolucionários entregaram o poder ao povo e, apesar de alguns percalços de percurso, esse processo acabou por ser também exemplar. A derrota da ditadura portuguesa, a mais longa ditadura de direita na Europa, acabou por dar o exemplo para a transição democrática post franquista em Espanha, e para a queda da ditadura dos coronéis na Grécia. Inspirou também muitos movimentos progressistas no sentida da Liberdade, na América Latina e mais tarde mesmo em certos casos no Leste da Europa. A Revolução do 25 de Abril é, e foi desde o início, um grande sucesso de que nos podemos orgulhar. Portugal integrou-se e bem na Europa para a qual estava de costas voltadas e passou de um país em guerra (três guerras) para um País de Paz e Liberdade. Passámos das mais altas taxas de analfabetismo e mortalidade infantil de toda a Europa para os melhores valores europeus e mundiais. Por isso temos razões neste ano do cinquentenário da Revolução para cantar com alegria como sempre e de cravo vermelho ao peito a nossa Grândola.
Militante do PS