Crise. A poucos passos de eleições

Crise. A poucos passos de eleições


Na semana em que Cavaco voltou a uma iniciativa partidária para desancar o Governo e o PS e apoiar a liderança de Montenegro e o PSD como alternativa, Passos Coelho reuniu-se à mesma mesa com um grupo de apoiantes de sempre. Eleições antecipadas dentro de menos de um ano foi o menu político em cima…


O pretexto terá sido o aniversário de Jorge Paulo Roque da Cunha, secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) e já um ‘histórico’ social-democrata, que celebrou 63 anos no início de maio. Mas o almoço que juntou sociais-democratas apoiantes de sempre de Pedro Passos Coelho, como o ex-eurodeputado Carlos Coelho e o advogado e ex-deputado Luís Nobre, na  cervejaria Tico Tico, em Alvalade, Lisboa, no passado dia 15, rapidamente se tornou palco de discussão política. No rescaldo de semanas muito conturbadas para a maioria socialista, com a comissão parlamentar de inquérito (CPI) à TAP no menu, o cenário em cima da mesa foi o de legislativas antecipadas ainda antes das eleições europeias – sendo que estas, agora, já estão confirmadas para entre 6 e 9 de junho de 2024.

A velha guarda passista que se sentou à mesa com o próprio ex-primeiro-ministro e ex-líder do PSD, Pedro Passos Coelho, está convencida de que o Presidente da República quer derrubar o Governo o mais cedo possível, não perdoando ao primeiro-ministro António Costa a decisão de não aceitar a demissão de João Galamba e o facto de ter segurado o ministro das Infraestruturas numa afronta de clara manifestação de força perante o chefe de Estado, após os sucessivos pronunciamentos de Marcelo sobre uma hipotética dissolução do Parlamento.

Na base desta tese está a convicção de que, se a legislatura chegar ao fim, em 2026 António Costa terá mais hipóteses de voltar a ser reeleito primeiro-ministro. Essa hipótese é, aliás, alimentada pelo facto de o líder socialista ter já admitido a possibilidade de se recandidatar a secretário-geral do PS em 2025 e concorrer às próximas legislativas.

Mais: no cenário em que os passistas equacionam e a avaliar pelas sondagens, a aguardar por daqui a três anos, o Chega já estará a morder os calcanhares aos sociais-democratas, o que inviabiliza uma solução à direita que agrade a Marcelo.

Tendo isso em perspetiva, acreditam, portanto, que a única solução para o PSD apear Costa e o PS do poder é antecipar as legislativas para antes das europeias.

Aliás, esta semana, no Parlamento, António Costa falou na ‘pressa’ da direita em provocar uma crise para chegar ao poder, antes que os portugueses comecem a sentir no bolso os bons resultados da economia conseguidos pelo Governo PS.

 

Cavaco dá novo fôlego

Ainda que a velha guarda passista conjecture uma interrupção da legislatura mais cedo do que se imagina, o Presidente da República não parece querer deitar tudo a perder e já deu sinais de que não pretende lançar a ‘bomba atómica’ enquanto os fundos europeus estão a ser executados. Além de que a dissolução da Assembleia da República significaria o fim da CPI à TAP, que ainda poderá reservar muitas surpresas no rumo da governação socialista.

Isso não quer dizer, contudo, que neste jogo de xadrez entre Costa e Marcelo, o PSD não se vá posicionando no tabuleiro. O primeiro sinal foi dado no início do mês quando o líder social-democrata se deixou fotografar ao lado do presidente da Iniciativa Liberal, num almoço, indiciando que há uma linha aberta de diálogo entre os dois partidos.

Também foi notório o vigor com que Luís Montenegro foi à Madeira esta semana, por ocasião das jornadas parlamentares do partido, dizer que o tempo do PS está a chegar ao fim, com as hostes sociais-democratas acalentadas pela intervenção arrasadora de Cavaco Silva no passado sábado. «Já tiveram o vosso tempo e a vossa oportunidade e desperdiçaram-na, está a chegar a nossa vez», afirmou o líder social-democrata, num discurso em que acusou o primeiro-ministro  de estar desfasado da «vida real» dos portugueses, aconselhando António Costa a «tomar um banho de realidade».

No encerramento do encontro nacional de autarcas do PSD, também o antigo Presidente da República Cavaco Silva classificou a governação socialista como «desastrosa» e defendeu que o primeiro-ministro «perdeu a autoridade», convidando Costa a ponderar demitir-se num «rebate de consciência», declarações que atiçaram socialistas do Largo do Rato a São Bento.

Numa primeira reação, o chefe do Executivo disse não ter ficado «beliscado» com o discurso do ex-chefe de Estado, mas acusou Cavaco Silva de ter despido o fato institucional «para vestir a t-shirt de militante partidário e fazer um discurso inflamado para animar as suas hostes partidárias» e, assim, «alimentar o frenesim» de «uma crise política artificial».

No entender de Costa, a direita está a tentar abrir uma crise política, «de forma a não dar tempo que os portugueses sintam os benefícios da recuperação económica».

Essa também foi a estratégia adotada pelo primeiro-ministro durante o debate sobre política geral desta quarta-feira. A puxar pelos dados económicos para abafar as tentativas da oposição em explorar ao máximo o caso Galamba, Costa quis dar garantias de que o «o ciclo económico em Portugal está a inverter-se» e que são esses bons resultados da economia que explicam o «frenesim» da direita.

Na lógica do líder do Executivo, quanto melhores são os resultados da economia portuguesa, «maior é a ânsia do líder do PSD» em querer criar uma crise política que, a seu ver, é «absolutamente indesejada pelos portugueses e contrária aos interesses nacionais».

Certo é que, enquanto Costa não conseguir estancar a hemorragia de ‘casos e casinhos’ no seio da governação, nem os números vão impedir que os sociais-democratas aproveitem a onda para inverter o ciclo político.

Entretanto, Marcelo volta a marcar a agenda política, com a marcação para o final de julho de uma reunião do Conselho de Estado de balança sobre a situação política nacional, que será coincidente com a chamada a Belém de representantes de todos os partidos com assento parlamentar.

 

Amaro ainda não renunciou

Carlos Coelho continua a aguardar pela efetivação da renúncia de Álvaro Amaro para regressar ao cargo de deputado no Parlamento Europeu. O Nascer do SOL apurou que o eurodeputado social-democrata ainda não renunciou ao mandato como tinha anunciado no final de abril, depois de ter sido condenado pelo Tribunal da Guarda pelo crime de prevaricação. Carlos Coelho, o nome que se segue na lista de candidatos do PSD ao PE, disse ao Nascer do SOL que desconhece as razões pelas quais o seu companheiro de partido ainda não efetivou a anunciada renúncia. O Nascer do SOL tentou contactar Álvaro Amaro, mas em vão.