Ainda não há paz no reino do senhor, leia-se na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), mas em cima da mesa já estão algumas ideias para se cortar nos custos do palco-altar do Parque Tejo, bem como no palco do Parque Eduardo VII, mas, tudo indica, a Câmara Municipal de Lisboa (CML), a Igreja e a construtora Mota-Engil só tomarão as medidas definitivas na próxima semana. Também se sabe que Carlos Moedas, presidente da CML, não pensa perder tempo com o representante do Governo, José Sá Fernandes, e que a autarquia e o Executivo só deverão reunir-se para discutir questões mais abrangentes, como são os problemas da mobilidade, pois a Polícia Municipal terá de trabalhar em conjunto com a PSP.
O que se sabe é que o palco-altar – que não é o maior custo da JMJ – deverá perder a capela «do Santíssimo», até porque não se quer gastar mais dinheiro para a adaptar depois do evento que decorrerá de 1 a 6 de agosto.
Já o palco do Parque Eduardo VII deverá dar mais dores de cabeça aos intervenientes, até porque vai ser muito difícil conseguir satisfazer o Presidente da República, que pediu apenas um «palcozinho de 200 mil euros». Se o mesmo só fosse usado na cerimónia de abertura, presidida pelo cardeal-patriarca de Lisboa, em que é previsto estarem 200 mil pessoas, o custo poderia «ser esse ou até mais baixo, à semelhança do que será montado na Alameda de Lisboa». O problema é que a Câmara de Lisboa, desde o início desta gestão, quer aproveitar as boas vindas ao Papa e a cerimónia da Via-Sacra para dar uma imagem grandiosa da cidade ao mundo, já que são esperadas entre 500 a 700 mil pessoas nas duas cerimónias em que estará presente o Papa Francisco. Na ocasião, está pensado fazer-se uma grande demonstração da cultura portuguesa, com fadistas, guitarristas e demais artistas, e um palco menor não permitirá realizar o projetado.
Mas as questões relacionadas com os custos não são só estéticas, pois é preciso obedecer a uma série de requisitos de segurança, atendendo a que o Papa estará presente, e em caso de necessidade de evacuação nada poderá correr mal.
Se o palco que será escolhido para o Parque Eduardo VII, que até poderá ser desviado para a Bela Vista ou mesmo desaparecer, concentrando toda a JMJ no Parque Tejo, já o local onde o Papa fará a missa de encerramento levanta dúvidas a elementos ligados à organização. «É impressionante como se quebraram segredos de Estado, pois o palco-altar já foi revelado ao mundo inteiro, sabendo eventuais terroristas onde estará sempre o Papa. Isto é inaceitável», diz fonte ligada ao processo.
Refira-se que a ideia dos dois palcos foi uma sugestão da Igreja, pois em quase todas as cidades onde se realizaram a JMJ havia dois palcos, até para se precaver de algum problema, como foi o caso do Rio de Janeiro, onde foi necessário passar para o plano B, devido a um temporal.
Custos eram conhecidos de todos
Quando o custo do palco-altar foi revelado, muitos tentaram sacudir a água do capote, mas, na verdade, todos sabiam, ou pelo menos podiam ter feito contas.
O episódio levantado por Marcelo Rebelo de Sousa de que não sabia dos custos e que foi contrariado pelo Patriarcado de Lisboa, e levou o bispo responsável pela JMJ a dar razão ao Presidente daRepública, contrariando o seu chefe hierárquico, não cola com a realidade, pois os engenheiros e arquitetos voluntários, ligados à Igreja, foram avisados de que o custo por metro quadrado seria quase de 700 euros. Basta fazer as contas ao palco propriamente dito, que terá cinco mil metros quadrados, e juntar os restantes acessos para se chegar aos tais quatro milhões de euros sem IVA.
O próprio D. Américo Aguiar confirmou na conferência de imprensa que deu na semana passada que a Lisboa Ocidental SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana tinha o contributo dos engenheiros e arquitetos católicos. «Talvez ninguém tenha feito as contas, é possível, mas esse número foi avançado a todos os presentes», confessa fonte da organização.
Guerra entre CML e Governo
Já se sabe que o mal-estar entre a Câmara de Lisboa e o Governo surgiu, publicamente, quando José Sá Fernandes, representante do Executivo de António Costa, criticou o custo do palco-altar, dizendo que tinha havido duas propostas muito mais baratas, mas que a equipa de Carlos Moedas optou pela mais dispendiosa.
Também já se sabe que, para a CML, José Sá Fernandes «fala do que não sabe» e que os dois projetos não serviam o propósito, desde logo a segurança e bem estar do Papa, além da necessidade de ter duas mil pessoas no palco. Há ainda o facto de os organizadores garantirem que o palco-altar poderá ser usado no futuro, e não vai ser desmontado no dia 7 de agosto. Mas o que irrita a CML e outras entidades envolvidas no projeto é o facto de oGoverno ir pagar mais de seis milhões pelo aluguer do sistema de luz, som e imagem e SáFernandes não dizer se pode gastar menos no aluguer desse equipamento.
Se isso são questões financeiras, há outras matérias que preocupam os organizadores. O Governo ficou de tratar do problema de mobilidade e até agora não se conhece nenhum programa. Para se ter uma ideia, todos os aeroportos nacionais vão estar ‘afetos’ à JMJ, mas não conseguirão dar conta do recado, sendo, por isso, necessário recorrer a aeroportos espanhóis. E daí, e dos portugueses, irão partir centenas ou milhares de autocarros que levarão os peregrinos até aos locais do evento. Sabe-se que a Câmara de Loures deverá disponibilizar um terreno para receber esses meios de transporte, e que está prevista também uma zona de parqueamento em Vila Franca de Xira. Mas, ao certo, não se sabe nada de como se irão ‘controlar’ os cerca de um milhão de peregrinos.
«Numa semana vamos ter entre um milhão e um milhão e meio de peregrinos, não seria natural que o Grupo de Projeto de Sá Fernandes já tivesse feito alguma coisa?», questiona fonte ligada ao processo. Para se ter uma ideia da complexidade da operação, todos os elementos da PSP e da GNR estão proibidos de tirar férias entre 24 e 7 de agosto. E para se perceber como tudo está atrasado, diga-se que só na semana que agora termina é que um elemento da PSP foi a Madrid falar com os seus colegas espanhóis, para receber destes os planos de preparação e execução e a forma como organizaram toda a segurança na altura da JMJ na capital espanhola.
Quem parecia antecipar problemas foi D. Américo Aguiar em entrevista ao Nascer do SOL nas edições de 30 de dezembro e 7 de janeiro: «Peço que deem o benefício da dúvida de aceitarem a Jornada Mundial da Juventude como uma coisa positiva e boa para os jovens portugueses e para a juventude do mundo inteiro e para Portugal em geral.
Não façamos raciocínios de pensar e antecipar todas as maldades, todas as dificuldades e os problemas que vêm e que deixam de vir. E ai Jesus e ai meu Deus. Temos consciência do desafio que temos pela frente. É um desígnio nacional. Vamos acolher a juventude do mundo inteiro, independentemente de serem ou não católicos».