A declaração de amor de Marcelo a Portugal

A declaração de amor de Marcelo a Portugal


O discurso de tomada de posse de Marcelo foi também uma declaração de amor a Portugal e um apelo aos portugueses para ganharem auto-estima e orgulho pelo país.


"Portugal é a razão solene de ser do compromisso solene que acabo de assumir". Foi com esta frase que Rebelo de Sousa deu o pontapé de saída para o discurso que proferiu na Assembleia da República, minutos depois de ter feito o juramento solene sobre a Constituição da República.

"Aqui nasci, aqui aprendi com meus pais a falar a língua que nos une e une a centenas de milhões por todo o mundo. Aqui eduquei os meus filhos e espero ver crescer os meus netos", disse o Presidente, que tem os netos a viver no Brasil e que não se esqueceu de dar uma palavra especial à Diáspora portuguesa e à Lusofonia.

Com o mesmo afeto com que temperou a campanha presidencial, Marcelo elencou o que faz português e o que faz amar o país. "Amor à terra, saudade, doçura no falar, comunhão no vibrar, generosidade na inclusão, crença em milagres de Ourique, heroísmo nos instantes decisivos".

Para o Presidente Portugal é "feito de memória, de lealdade, afeto, fidelidade a um destino comum", a identidade nacional "feita de solo e de sangue". E Marcelo Rebelo de Sousa quer que esse destino seja grande, "na capacidade de saber conjugar futuro com passado, sem medo de enfrentar o presente".

Sabendo das "feridas destes tão longos anos de sacrifícios", Marcelo acha que os portugueses têm de dar a volta e o momento para o fazer é agora. "Temos de sair do clima de crise, em que quase sempre vivemos desde o começo do século, afirmando o nosso amor-próprio, as nossas sabedoria, resistência, experiência, noção do fundamental".

A receita, acha o novo Presidente, pode ter sido já dada por Miguel Torga há 30 anos. Marcelo recorreu às palavras do poeta para explicar aos portugueses como e porquê devem aprender a gostar mais de si próprios.

"O difícil para cada português não é sê-lo; é compreender-se. Nunca soubemos olhar-nos a frio no espelho da vida. A paixão tolda-nos a vista. Daí a espécie de obscura inocência com que atuamos na História. A poder e a valer, nem sempre temos consciência do que podemos e valemos. Hipertrofiamos provincianamente as capacidades alheias e minimizamos maceradamente as nossas, sem nos lembrarmos sequer que uma criatura só não presta quando deixou de ser inquieta. E nós somos a própria inquietação encarnada. Foi ela que nos fez transpor todos os limites espaciais e conhecer todas as longitudes humanas. Não somos um povo morto, sem sequer esgotado. Temos ainda um grande papel a desempenhar no seio das nações, como a mais ecuménica de todas. O mundo não precisa hoje da nossa insuficiente técnica, nem da nossa precária indústria, nem das nossas escassas matérias-primas. Necessita da nossa cultura e da nossa vocação para o abraçar cordialmente, como se ele fosse o património natural de todos os homens".

A longa citação é de Torga e Marcelo leu-a na íntegra, corrigindo apenas a parte em que o escritor fala da fraca técnica e da atrasada indústria, porque hoje "se multiplicam, na ciência, na técnica, na criação de riqueza, tantos exemplos da inventiva portuguesa, entre nós ou nos confins do universo".

Mas, correção temporal à parte, Marcelo quer ver os portugueses a ser "grandes no futuro" como foram "grandes no passado".

"Nunca perdendo a fé em Portugal e na nossa secular capacidade para vencer as crises. Nunca descrendo da Democracia. Nunca deixando morrer a esperança. Nunca esquecendo que o que nos une é muito mais importante e duradouro do que aquilo que nos divide. Persistindo quando a tentação seja desistir. Convertendo incompreensões em ânimo redobrado". É assim que o Presidente quer o povo português a olhar para a frente a puxar pelas suas maiores qualidades.

E uma das maiores qualidades portuguesas, acredita Marcelo, é "a indomável inquietação criadora que preside à nossa vocação ecuménica, abraçando o mundo todo".

Nesse espírito de ecumenismo, Marcelo inovou deste dia de tomada de posse que pela primeira vez inclui uma celebração religiosa ecuménica celebrada na Mesquita de Lisboa.