Parece insólito, mas a primeira questão foi mesmo sobre o envolvimento de Miguel Relvas na sua campanha. Quase todas as outras foram de adolescentes indignados com a falta de legitimidade política da solução de governação à esquerda encontrada por António Costa.
“Houve perguntas complicadas”, apontava um jornalista à saída da escola secundária de Alcabideche (Cascais), onde Rebelo de Sousa passou a hora de almoço de quinta-feira a dar uma aula sobre Democracia em Portugal. “Essa do Relvas foi fácil”, garantia o candidato presidencial, apesar do óbvio embaraço com uma pergunta à qual ainda não tinha respondido de forma tão clara.
Ao aluno do 12.º ano que lhe colocou a questão, Marcelo foi perentório ao dizer que Relvas “não tem ajudado”, mas não descartou a hipótese de isso vir a acontecer. “Tanto quanto eu sei ele está no Brasil. Mas se ele vier a ajudar, eu digo”.
A pergunta não foi, contudo, a única com rasteira. Foram vários os alunos que usaram a conversa com o professor para atacar as “ambições pessoais” que terão levado António Costa a uma solução “pouco ética” de formar Governo sem ser o líder da força política mais votada.
“Se numa democracia o povo é quem mais ordena, por que é que não se respeitou a vontade do povo?”, quis saber um jovem, reforçando a questão que minutos antes já tinha sido colocada por uma colega e que ainda haveria de ser repetida por outros estudantes.
“Vê-se que não está agradada”, começou por responder Marcelo à aluna, com o discurso que já tem feito para dentro do PSD. “Mas foi o que aconteceu. A política é feita de alegrias e tristezas. Vocês na vossa idade têm de se habituar a isso”, lançou o professor de Direito Constitucional, que haveria de citar as regras da Constituição para explicar aos jovens que é, afinal, legítimo o Governo do PS.
“O Governo não pode entrar em funções se não passar no Parlamento. Tem alguma lógica. É uma chatice às vezes. Agora, imagine que era ao contrário”, foi dizendo a um dos alunos do secundário desgostoso com a solução. “Tem de haver regras. É uma frustração, é um desgosto. Mas as regras da Constituição têm de ser aplicadas”.
O Presidente é um “fusível de segurança”
Perante uma plateia de tantos jovens apoiantes da PàF, o candidato viu-se obrigado a fazer o discurso que tanto tem irritado a direita, assegurando que não tem intenções de demitir o Governo de Costa ou de criar instabilidade política.
“Eu espero que não caia”, disse, quando confrontado por outro jovem com a possibilidade de uma crise entre os partidos que apoiam o Governo do PS.
“Pensamento positivo. E fazer tudo para que isso aconteça”, é a receita de Marcelo, que nem quer pensar na hipótese de dissolver a Assembleia por causa do Orçamento do Estado para 2016 não passar. O problema, explicou, são os tempos longos necessários para que haja eleições e para que se forme Governo. “São 70 dias [para o Presidente ouvir os conselheiros e convocar eleições] mais 30 dias [para o Executivo tomar posse]”, atira o candidato para chegar à conclusão de que “teríamos Governo na melhor das hipóteses no pino do Verão” e Orçamento só lá para o Outono.
“Isto é bom? Não é”, aponta o professor, que define o trabalho do Presidente como um “fusível de segurança” que só deve usar os seus poderes de demissão do primeiro-ministro e, “ainda mais”, de dissolução do Parlamento em caso de crises muito graves e caso haja a probabilidade forte de sair uma solução estável de novas eleições.
Quase no final da longa aula que ganhou animação quando se transformou num diálogo entre o professor Marcelo e os alunos, o candidato acabou por confessar que o tempo que aí está é um “período muito difícil para o Presidente da República” e que isso faz com que seja ainda mais importante fazer a escolha certa no dia 24 de janeiro.
“O Presidente pode estragar a estabilidade política e económica num instante”, alertou Marcelo, que considera que só essa estabilidade fará com que Portugal saia da crise.
Os tempos são complicados, mas Marcelo diz que já está habituado a dificuldades. “Eu só apanho situações complicadas”, desabafou.