Abril contra o vírus


O 25 de abril de 2020 marca de novo um encontro de Portugal e dos portugueses com a necessidade de salvaguardar a democracia.


Houve o 25 de abril de 1974, o dia fulgurante em que renascemos para a liberdade. Houve o 25 de abril de 1975, em que se realizaram as primeiras eleições livres e democráticas e foi escolhida a Assembleia Constituinte. Houve o 25 de abril de 1976, em que o povo português selou um compromisso forte com a democracia plural. Houve depois muitos abris simbólicos, mas o 25 de abril de 2020 marca de novo um encontro de Portugal e dos portugueses com a necessidade de salvaguardar a democracia.

A reação da sociedade portuguesa e das suas instituições à pandemia tem sido um exemplo marcante de participação e cidadania. O estado de emergência não suspendeu a democracia nem o Estado de direito. Os direitos individuais foram delimitados numa extensão definida pelas autoridades de saúde, para proteção coletiva, e tem sido feito um esforço gigantesco de mitigação quer dos impactos sanitários, quer dos impactos económicos e sociais do novo vírus.

Ao contrário do que aconteceu nas sociedades autoritárias e não democráticas, o combate à pandemia não recorreu à devassa da privacidade dos indivíduos nem à coação da sua liberdade de expressão. Não aconteceu em Portugal e não aconteceu, com a triste exceção da Hungria, em nenhum dos outros Estados europeus.

Não há melhor homenagem à revolução do 25 de Abril do que termos sido, enquanto povo, capazes de uma eficácia reconhecida internacionalmente e comparável aos melhores resultados no combate à ameaça pandémica, sem desrespeitar os valores democráticos.

Quando alguns analistas apontam o dedo a países fortemente fustigados, como a Itália ou Espanha, e referem como a sua capacidade de resposta foi menor do que a da China, para usar o exemplo mais impressivo, olvidam que nem Espanha nem Itália sequestraram a privacidade e a liberdade de expressão dos seus cidadãos e lutaram por salvar vidas ao mesmo tempo que lutaram por salvar a democracia. Assim foi também em Portugal.

Há uma escolha que vamos ser todos chamados a fazer: até onde estamos dispostos a ceder na privacidade e na liberdade para ganhar na proteção de riscos, designadamente de riscos de saúde? Um Estado autoritário e conhecedor dos movimentos dos seus cidadãos não é um Estado democrático. Estamos dispostos a deixar morrer a democracia para nos salvarmos ou estamos prontos para lutar pela salvação em democracia?

Ao longo da História, milhões de homens e mulheres lutaram e muitos pereceram para defender as suas convicções. Mesmo no risco pandémico, se visto numa abordagem global, tenho a forte convicção de que, não sendo a democracia um regime perfeito, é o menos imperfeito que conhecemos.

Se há um ano em que temos razões para comemorar o 25 de Abril, é este ano de 2020. Por estarmos no bom caminho para salvar a democracia e para nos mobilizarmos para continuar com rigor esse caminho.

Uma comemoração que não tem de ser feita na rua, muito menos em grandes ou pequenas manifestações tradicionais, mas uma comemoração coletiva, feita da soma das reflexões individuais e da sua transformação em vontade de agir. Vinte e cinco de Abril, sempre.

Eurodeputado