Não consta que Mugello tenha sido terra por onde marinheiros portugueses tenham deixado sua marca, talvez Génova ou quem sabe Nápoles os tenham acolhido, mas ali tão terra adentro do continente não os vislumbraremos certamente, por mais que viajemos ao passado.
Talvez por isso tenha sido necessário que em vez de naus e caravelas tenha sido um mais pequeno e muito mais sofisticado meio de transporte a levar aos nativos daquela terra a destreza e a arte suficientes para lhes captar a admiração e um lugar na memória onde se lhes fixe um nome.
Não foi pois nem Gama nem Cabral.
Foi Oliveira e a coisa já vem desde o dia em que por ali descobriu o caminho mais rápido desde o semáforo sem luzes até à bandeira de xadrez.
Mas porque falamos nisto?
Porque antes das novas gentes e terras trazidas ao conhecimento, muito penaram os bravos e intrépidos lusitanos que à água se lançavam com base e fé em deus e na sua ciência.
Dias havia de mar tão revolto que nem as lapas se agarrariam à rocha se por ali uma houvesse.
Já noutras jornadas a calmaria era tanta mas tanta mesmo, que o ar parado parecia roubado a uma fotografia.
E o que faziam os nossos navegadores de então?
Navegavam.
Descobriam.
Ao mundo ofereciam novos mundos.
Pois é.
Traz-nos a lembrança de uma época na Mahindra e seus pódios quase inalcançáveis e no entanto … trazidos.
Ou na Leopard de tão poucas marés onde Miguel começou a desbravar caminho acima e Dany começou a perder-se escadaria abaixo.
Tempos de dias de pouco ou vento nenhum.
E mais tarde, já com ventos e brisas a enfunar o velame, já foi bom de ver o nosso menino piloto marinheiro de águas bravas a bater-se bem na frente, devolvendo a Ajo a confiança nele depositada, dando-lhe nova e triunfal entrada no restrito universo dos ganhadores de GPs.
Ontem em Mugello, foi dura a batalha para muitos, foi de milésimos nos vencedores, foi de quedas para quem procurou espaço onde não havia, foi de sangue e suor sem lágrimas, com o seu sorriso de menino e um dedo partido, assim foi o dia para este que a todos nós encanta.
Como encanta a Guy.
A Hervé.
E a quem naquele mundo estuda milésimas e consistências.
Em breve chegará o momento em que a geografia da luta pelo pedaço de asfalto na curva se desenrolará bem mais à frente no pelotão.
Eles estão atentos.
Trabalhando em lugar de se lastimarem, apostando num caminho que trará frutos em terra de tão profícuas árvores.
E nós?
Quereremos estar por perto, quem sabe até escutando o hino com uma lágrima a transbordar face abaixo.
E, se bem o queremos, talvez seja altura de melhor o merecermos.
Olhemos ao tempo dos dias de vento nenhum, quando o mar chão fazia atracar nenhures a esperança de novos destinos, quando as sextas-feiras e os sábados eram apenas a véspera de corridas feitas de trás para o meio e quando os outros já lá iam faz tempo.
Ensaiemos um pequeníssimo ato de contrição, recordemos o quão longe andaríamos nesse tempo, em que acreditar era quimera guardada bem fundo.
Que poucos, mas que poucos seriam aqueles que nesse tempo de chuvas e frios sabiam guardadas outras Primaveras.
E aqui meus senhores, eis-nos guardada a redenção, pedindo-nos em troca e apenas que saibamos permanecer na luta.
Não se trata de distribuir um amém abúlico.
Trata-se antes sim de estar onde o Falcão de nós precisa.
Em todas as curvas, todas as rectas.
E em todos os momentos.
Porque o caminho … isso sempre soube ele escolher.
Vai Falcão, voa, que por aqui voaremos ao teu lado.