O nível de compromisso do PCP com um governo do PS para os próximos quatro anos era ontem o último grande obstáculo a ultrapassar nas negociações entre socialistas e comunistas. E o ponto central de um encontro marcado para ontem à noite, que terá contado já com a presença dos líderes dos dois partidos.
Para o PCP o acordo a subscrever com os socialistas não deve ter mais do que orientações políticas para o futuro – o partido liderado por Jerónimo de Sousa quer manter a sua margem de manobra, nomeadamente quanto a medidas-bandeira que não serão contempladas num governo PS.
Ontem mesmo o PCP deu mais um sinal de que não pretende deixar cair as suas bandeiras de sempre. A meio da tarde, os comunistas emitiram um comunicado anunciando para hoje um conjunto de iniciativas por todo o país, de “contacto com os trabalhadores e as populações”. Para defender o quê? “O aumento do salário mínimo para 600 euros em 2016” – uma proposta recusada pelos socialistas. Ou “condições indispensáveis ao desenvolvimento do país” como a “recuperação do controlo público de sectores estratégicos ou a renegociação da dívida” – outra questão da qual o PS não quer ouvir falar. No mesmo documento, os comunistas referem que “há uma maioria de deputados que constituem condição bastante para a formação de um governo de iniciativa do PS, para a apresentação do seu programa, para a sua entrada em funções e para a adopção de uma política que assegure uma solução duradoura”. É neste quadro, acrescenta o documento, que o PCP “está a trabalhar e a intervir, e a discutir com o PS”. Os comunistas voltam a garantir que o partido “não faltará com a sua intervenção na hora de garantir todas as medidas favoráveis ao povo português”.
Esta será a fórmula preferida pelos comunistas: deixar o apoio futuro ao governo socialista condicionado à continuação de políticas, sem balizas temporais muito concretas. Já o PS quer uma formulação mais definida. Mas, a esta altura, até mesmo no PCP se admite que há pouco espaço para rejeitar agora um entendimento. “Um desenlace negativo, independentemente das razões, teria o efeito de um balde de água gelada sobre as expectativas do povo de esquerda”, diz ao i fonte do partido.
Se o PCP se tem empenhado em sublinhar que o que está em causa é um governo do PSviabilizado à esquerda, no BE todas as hipóteses parecem estar ainda em aberto quanto à configuração política do acordo. Ontem, a líder dos bloquistas, Catarina Martins, desdramatizou o arrastar das negociações: “Nenhum dia é um dia desperdiçado. Em cada dia estamos a debater soluções concretas para a vida das pessoas”.
Ontem, o “Jornal de Negócios“ avançou várias das medidas já acordadas pelos três partidos (ver caixa ao lado), com destaque para o aumento das pensões até aos 600 euros, já em 2016 e a redução da TSU dos trabalhadores com salários até 600 euros.
As medidas do acordo à esquerda
- Reposição de regrasde actualização das pensões, o que conduzirá a um aumento de 0,3% nas pensões até aos 628 euros, já no próximo ano.
- Eliminação de metade da sobretaxa do IRS em 2016 e da outra metade em 2017.
- Fim do corte dos salários na função pública, com a devolução ao ritmo de 25% a cada trimestre do próximo ano.
- Aumento do salário mínimo nacional (o valor ainda está por definir, sendo esta uma das medidas que ainda estão em aberto).
- Redução da TSU (taxa social única) suportada pelos trabalhadores (actualmente é de 11%) para salários até aos 600 euros.
- IVAda restauração volta a abaixar para os 13%.
- Alterações nas condições de acessoà tarifa social da electricidade, o que permitirá abranger um maior número de beneficiários.