Joey Alexander. O jazz estava à sua espera

Joey Alexander. O jazz estava à sua espera


Promovemos um jogo do adivinha com o leitor: que idade terá o protagonista deste perfil? Oiça primeiro o disco “My Favorite Things” e tente acertar. Nasceu na Indonésia e talvez tenha vindo ao mundo para o mudar.


Por favor, estimado leitor, siga os seguintes passos: abra a sua conta do Spotify, vá ao YouTube – uma qualquer plataforma de consumo musical – e escreva Joey Alexander. De seguida estenda-se na poltrona com uma bebida, sente-se na esplanada de que mais gosta, faça a sua corrida matinal, ligue o cabo auxiliar ao auto-rádio e conduza até ao trabalho – o intuito não é influenciar a forma como gosta, ou pode, apreciar música.

Tudo isto para dizer que faça o que fizer só não pode googlar o nome deste artista antes de ouvir o seu disco de estreia “My Favorite Things”, editado pela Motéma. Percorra os nove temas, deleite-se com este jazz livre, piano acima, piano abaixo, onde se encontram algumas versões daqueles que consideramos reis neste estilo – Coltrane e Monk, sobretudo –, e depois diga de sua justiça, escreva, ainda que mentalmente, a sua crítica.

Já está? Vamos a isso então. Apostamos consigo – o teor da aposta decide o leitor, claro – que jamais dirá estar a ouvir um miúdo de 11 anos nascido em Bali, Indonésia. O vaivém de génios do piano que nos traz um sobredotado da técnica a cada par de anos tende a descaracterizar a questão, quase a levar-nos a dizer, repletos de arrogância, “olha, lá vem mais um miúdo que não sabe quem é o presidente dos Estados Unidos mas que parece o Bill Evans”.

Não querendo enquadrar-nos nesse género de pessoas, teremos a coragem de dizer que Joey Alexander é um caso distinto. A sensibilidade supera a rapidez, o virtuosismo faz-nos ignorar a técnica. Oiça-se a primeira faixa do disco, uma versão de “Giant Steps”, de John Coltrane, com 10 minutos e 15 segundos, e aguarde-se alguém capaz de dizer o oposto. Fale agora ou cale-se para sempre.

Nascido Josiah Alexander Sila, Joey começou a tocar piano aos seis anos, quando, às tantas, reproduziu uma música de Thelonious Monk de ouvido. O pai, pianista amador, não teve outro remédio senão perceber que o filho teria diante de si um futuro entre teclas que jamais este teria conseguido. Vai daí muda-se para Jacarta, a capital do país, onde, já com oito anos, o filho tocou na gala Jazz Foundation of America, para alguém que viria a tornar-se um dos seus padrinhos – sim, que até os génios precisam de alguém que diga “acredito em ti”.

Falamos do lendário Herbie Hancock, e, como Joey garantiu este mês ao “The New York Times”, esse foi o dia em que decidiu dedicar a sua infância ao jazz.

Seguiu-se uma participação no primeiro Master-Jam Fest, uma competição na Ucrânia para músicos de todas as idades, onde viria a sagrar-se vencedor. A mudança para os EUA impunha-se e a família viria a embarcar para Nova Iorque, desta vez apadrinhado por Wynton Marsalis, trompetista e director artístico do Jazz at Lincoln Center – que se deixou encantar com os vídeos do pequeno Joey no YouTube.

Foi aí, na Organization’s 2014 Gala, que Joey, embalado por um solo de “Round Midnight” de Thelonious Monk – que também pode encontrar no seu disco – provocou uma vénia generalizada da plateia, onde estava, inclusive, Bill Clinton.

As críticas brotaram a todo o gás, os perfis na comunicação social saíam aos pontapés, o mundo assistia e Joey, no seu canto, continuava a tocar. De tal modo que actualmente tem o seu trio, presente no disco e em muitos concertos, onde conta com o baterista Sammy Miller e o contrabaixista Russell Hall.

A par deste há ainda em “My Favorite Things” uma colaboração que inúmeros músicos experientes de jazz devem perseguir há anos, provavelmente sem êxito, para poderem dizer aos filhos que tocaram com o senhor Larry Grenadier. Joey já fez check na sua lista de coisas a fazer antes de morrer, mais ainda quando o contrabaixista disse ao “The New YorkTimes” que este não é o habitual pianista prodígio: “O que encontro tipicamente nestes miúdos prodígios é que vêm dessa acumulação de conhecimento muito clínica, própria da Europa ocidental. O que encontrei no Joey é uma forma muito mais intuitiva de tocar, que é mesmo bonita de ver”, disse Grenadier, não fomos nós, para que não se pense que estamos por aqui a influenciar opiniões.

Caro leitor, esperemos que respondido ao nosso pedido à risca; esperamos, aliás, que ainda esteja a ouvir o disco enquanto lê este artigo e descobre a história de um miúdo que mal se vê por detrás do piano, de óculos de massa e cabelo negro, a quem todos só pedem que não pare de tocar.

Num artigo da “BuzzFeed”, uma série de fotografias regista vários momentos de Joey em Nova Iorque. Uma delas a sorrir, de gorro na cabeça, a degustar um pacote de batatas fritas, como qualquer criança. Se ele quiser encher um piano de gordura no momento seguinte… estamos de ouvidos colados.