D. Duarte não precisa do protocolo
Está em recolha de assinaturas uma petição que visa incluir o senhor D. Duarte no Protocolo do Estado.
À partida, essa iniciativa não se apresentava recheada de problemas políticos ou institucionais, uma vez que D. Duarte é conhecido como herdeiro da coroa. Acontece que há muito para além da ingenuidade com que um punhado de personalidades do passado se reveste sobre as opções do presente.
D. Duarte precisa de se ver incluído no protocolo do Estado? A nossa resposta é: não!
Portugal é uma república, não vive com problemas profundos de identidade, não se revelam fissuras graves na sociedade sobre o caminho do regime, não se indicam circunstâncias que possam levar à revisão do protocolo só por esta razão. Portugal tem um parlamento onde a questão se não coloca, havendo poucos, muito poucos parlamentares que se atenham na simpatia absoluta pela monarquia, mesmo que constitucional. Ou seja, uma iniciativa destas corre o risco de ser amplamente chumbada, poderá nem sequer ter qualquer consequência após uma discussão mínima em plenário.
Mas o protocolo do Estado deve acomodar uma norma que permita aos mais altos representantes do Estado conferirem a D. Duarte, por tudo o que representa, uma dignidade única em circunstâncias especiais? A nossa opinião vai no sentido positivo.
Talvez por isso fosse preferível uma revisão da lei do protocolo que autorizasse, não uma passagem administrativa a D. Duarte, mas uma concessão extraordinária ao Presidente da República, ao primeiro-ministro e ao presidente da Assembleia da República de uma deferência especial, aberta a D. Duarte ou ao secretário-geral da ONU, hoje português, perante cada caso em concreto. Esta norma colocá-los-ia na posição adequada, e não após a lista infindável de titulares que o regime elege.
D. Duarte é visita assídua das comunidades locais. Nessas suas deslocações encontra o seu lugar de prestígio e de respeito pelo que fomos e somos enquanto nação. Só não se verifica em momentos nacionais relevantes, como são as visitas oficiais de chefes de Estado em que a monarquia é constitucionalmente consagrada.
Mas esta iniciativa demonstra o quão mal faz a “corte” a D. Duarte, a seu filho D. Afonso Maria e a toda a sua família. Esta petição sofre de falta de juízo.
Seria muito importante, para quem acha que a monarquia constitucional seria a melhor forma de conceder ao país um regime mais estável, que se encontrasse uma linha de afirmação nacional, uma agenda política de intervenção, uma proximidade dos portugueses. Por estes dias, os que se revelam na pose de monárquicos de estação não se sentam para avaliar como as casas reais europeias gerem a sua proximidade do povo. Sim, porque, em Portugal, o povo não se revela nos jantares de conjurados, nas listas para a causa real, nas mixórdias das reais associações.
Se o povo não entender a mensagem, se não se vir representado no que a família real quer ser e honrar, não vai questionar, por um segundo, esta república em que vivemos. E há, ainda, o outro lado: a república será sempre melhor quanto o forem os monárquicos que dela discordam.
É por isso que estamos numa paz próxima do podre. Também os monárquicos preferem viver do passado, sem pensar no futuro. Para isso já bastam os republicanos que se assumem sem questionamento.
Gostávamos mesmo de ver um país mobilizado. Mas, para tanto, D. Duarte e D. Afonso terão de fazer limpeza nas companhias que os rodeiam. Estarão disponíveis?
Deputado do PS