Sete de junho de 2025. Neste dia, Roma acorda com uma notícia triste, inesperada. No parque Villa Pamphili são descobertos dois corpos: uma mulher entre os 30 e os 40 anos e uma bebé, que não deveria ter mais do que seis meses de vida. O caso em si já é marcante, mas a forma como a mulher foi encontrada é ainda mais chocante: nua, envolta num saco preto.
A investigação da polícia conseguiu perceber mais tarde que se tratava de mãe e filha. Os testes da polícia forense concluíram ainda que a bebé foi estrangulada, tendo sido essa a causa da morte. Já em relação à mãe, que não apresentava qualquer sinal de violência, havia suspeitas de overdose ou envenenamento.
Chegou-se também à conclusão que a bebé viveu durante vários dias depois da morte da mãe. Isto porque o corpo da mãe estava em avançado estado de decomposição. Não havia documentos e, por isso, a polícia não tinha como saber quem eram as vítimas. Tinha apenas algumas pistas, como é o caso das tatuagens da mãe: uma rosa no pé direito, um desenho floral com uma estrela na cintura e uma prancha de surf com um crânio no braço direito.
Através das impressões digitais também não se chegou a lado nenhum. Não constavam – as da mãe – nas bases nacionais o que implicava, à partida, não haver cadastro. E que não eram cidadãs italianas.
As dúvidas intensificavam-se, as manchetes sensacionalistas dos jornais eram cada vez mais e os italianos queriam respostas. Era uma corrida contra o tempo para que a polícia conseguisse descobrir com a maior celeridade o que se tinha passado ali.
A ajuda do programa de TV
A polícia estava ainda a fazer a sua investigação quando, a 11 de junho, o programa de televisão Chi l’ha visto? – Quem viu? numa tradução em português – exibiu imagens das tatuagens da mulher, incentivando o público a manifestar-se, caso soubesse de alguma coisa que pudesse ajudar na investigação.
Entre as várias pessoas que o fizeram, uma delas dizia ter visto, algumas noites antes do crime, um casal a discutir num jardim no centro de Roma. A mulher segurava o bebé e o homem puxava-a de forma agressiva. A situação foi de tal forma que a polícia chegou a ir ao local. Este relato foi decisivo porque proporcionou uma pista importante: a polícia conseguiu identificar o suspeito através de imagens de câmaras de vigilância, acelerando o mandato de prisão europeu. Talvez tivessem ido à procura de uma vida melhor.
Além disso, o programa de televisão divulgou ainda uma fotografia do suspeito, identificado como Rexal Ford, a segurar a bebé nos braços dias antes do crime.
A polícia procurou por pessoas com esse nome e descobriu que Ford apanhou um avião de Roma para Skiathos, na Grécia, a 11 de junho. Mais tarde, o FBI – também chamado a esta investigação – percebeu que o seu nome verdadeiro era Francis Charles Kaufmann.
Foi preso, dois dias depois, a 13 de junho e depois extraditado para a Itália sob suspeita de matar a mulher e a criança, de acordo com o mandado de prisão, embora não tenha sido acusado de nenhuma das mortes.
Numa conferência de imprensa, o procurador da República de Roma, Francesco Lo Voi, agradeceu ao programa de televisão por ter fornecido «uma pista particularmente útil para a investigação» ao ajudar a identificar o suspeito.
Ainda assim, a identidade das vítimas permanecia desconhecida. Mas um repórter do programa forneceu mais informações importantes. Francesco Paolo Del Re, foi até uma zona onde Kaufmann tinha sido visto com sangue e interrogou os lojistas. Um deles ter-lhe-á dito que chamou a polícia na noite em que o homem foi encontrado com sangue e descreveu-o como agressivo e confirmou que estava na presença de uma mulher e um bebé. O lojista garantia ainda ter visto o homem a tirar uma foto dos três. Era mais um passo para a polícia conseguir descobrir quem era esta mulher e a sua filha.
A foto foi publicada no site do programa de televisão e agora era só aguardar por resultados. Cinco dias depois, a 18 de junho, uma mulher russa contactou o programa para dizer que conhecia a mãe da falecida. A mãe havia pedido à mulher, uma amiga, que procurasse notícias na internet após vários dias sem notícias da filha. Procurando pelo nome do homem com que a amiga sabia que a vítima tinha tido um relacionamento – o nome falso – conseguiu chegar ao site do programa de televisão.
A identidade da vítima foi então conseguida, com a apresentadora, Federica Sciarelli, a agradecer a confiança dos telespectadores. «Digo isto com um sorriso amargo, mas se os procuradores confiam no FBI, nós confiamos em vocês, telespectadores. Quero agradecer-vos porque são vocês que fazem o nosso programa».
Chegou-se então à conclusão: A jovem morta, identificada pela mãe, era Anastasia Trofimova, 29, e a menina era sua filha, Andromeda.
A partir daí, com a entreajuda entre o programa de televisão, a polícia e os familiares, a história começou a desenrolar-se. Francis Kaufmann é americano, tem 46 anos e era companheiro de Anastasia e pai de Andromeda.
A imprensa internacional revela que o casal conheceu-se em Malta, onde Kaufmann morou entre 2023 e 2024. Anastasia, natural de Omsk, na Sibéria, mudou-se para a ilha do Mediterrâneo em setembro de 2023 para fazer um curso de férias de inglês que lhe desse a oportunidade de conseguir um bom emprego na Europa ou nos Estados Unidos.
Conheceu então o americano – que segundo as autoridades usava vários nomes falsos – e mudou-se para a cidade maltesa de Marsascala, onde nasceu Andromeda, registada no dia 14 de junho de 2024. E o próprio pai da criança deslocou-se à embaixada americana em Malta para que a criança pudesse usar o seu apelido falso, Ford. Em março deste ano, mudaram-se para Roma.
Mas há algo que as autoridades estão a tentar investigar e que se pode perceber com alguma pesquisa na internet. ‘Ford’ dizia ser cineasta e procurava ajuda para a sua próxima produção. Anastacia tem exatamente o mesmo nome próprio e apelido que uma cineasta russo-canadiana. Talvez o americano tivesse ‘apostado’ na pessoa errada e as coisas «não iam bem», como chegou Anastasia a confirmar à mãe no último e-mail que lhe enviou.
Suspeita-se agora que uma possível tentativa de Anastasia em acabar com a relação terá resultado neste desfecho. Às autoridades, depois de ser apanhado, o americano disse: «A minha mulher deixou-me».
Kaufmann continua preso, alega inocência e as investigações continuam. Os mais recentes exames mostram lesões nas pernas de Anastasia que podem coincidir com o facto de ter sido arrastada pelo parque.
Este foi mais um caso da ajuda do programa italiano na descoberta de um crime, não tendo sido o primeiro.







