E, de súbito, como quem enxota uma mosca, virei costas e fechei a televisão


Onde está a verdade e como é que, sobre a sua evidente ausência, é possível dissertar tanto e tão despudoradamente num sentido ou noutro, como se todos os espectadores fossem néscios?


Gradualmente, comecei a sentir que me desinteressava das notícias que sempre tomei por importantes, que me agitavam os dias, por vezes provocavam insónias e, com mais ou menos entusiasmo, construíam os temas principais das conversas com amigos e conhecidos.

Nunca fui adepto de redes sociais e sempre me mantive ligado à rádio, especialmente  de manhã, aos jornais com a primeira bica e antes do almoço e, já pelas oito da noite, à televisão.

Não terá sido, pois, por estar defraudado com a manipulação da verdade e pura invencionice, que oiço dizer se desenvolvem nas ditas redes sociais, que me começou a agoniar o “noticiário”.

Sei que muitos de tais temas são importantes e que de muitos deles pode depender o meu futuro e, principalmente, o futuro dos meus filhos e dos meus netos.

Mas, confesso, depois do inicial stress causado por mais uma sessão diária da encenação macabra em que se traduz, afinal, a cobertura noticiosa sobre a chamada “guerra dos doze dias”, senti que não aguentava mais.

Lendo e ouvindo os mirabolantes discursos dos senhores da guerra, ouvindo, depois, os comentadores mais engajados e fanáticos, concluí que quase tudo o que dizem se parece com o registo automático de uma máquina que debita mensagens pré-preparadas pela IA para, conforme o caso, a todos nos convencerem do que aconteceu ou não aconteceu.

Claro está, que isto que agora me sucede pode não passar de um efeito da idade que, também ela, vai gradualmente corroendo o que ainda sou.

Outros, que passaram já por esta mesma sensação, querem convencer-me de que assim é: que é da idade.

 Mas será só dela, insisto?

Continuo convicto que é o evidente grau de puerícia dos discursos e dos comentários que, sobre a guerra, a política de defesa e as alianças políticas e militares, ora se dizem, ora se desdizem, que me provocou esta minha súbita alergia a gastar com o “noticiário” o tempo que ainda me resta, e que espero seja longo.

É, realmente, precisa grande estultícia para que um qualquer comentador possa palpitar, como se de ciência feita se tratasse, que as bombas americanas terão ou não destruído, atrasado ou inviabilizado o programa atómico militar do Irão.

Quando uma afirmação sobre tais factos é feita por um general americano, um agente da Mossad, fardado ou à civil, israelita ou português ou, do outro lado, ouvimos um sisudo religioso iraniano contrariar tal versão, todos sabemos, de antemão, qual o efeito propagandístico pretendido por cada um deles: isso é normal e logo compreensível.

Mas que credibilidade terão, ainda, as senhoras e os senhores comentadores que vemos e ouvimos, diariamente, na televisão, para afirmarem, com um ar de aparente neutralidade – umas vezes que sim e outras que não –, que tal programa atómico abortou, ou que ele segue quase intacto já dentro de momentos?

Depois desse imenso e macabro teatro de marionetas, que gira, a cada hora, da tragédia para a comédia, da épica para a farsa ou mesmo para o mais negro cinema de terror, como podem – insisto eu em perguntar – tais comentadores encartados tentar, ainda, convencer-nos de uma coisa agora e, logo a seguir, do seu contrário?

Como podem os comentadores, que estão do lado dos cavaleiros do apocalipse, asseverar que tudo foi destruído, tudo deixou de existir, para, imediatamente, dizerem que é necessário um acordo diplomático sobre que destino dar, afinal, ao que já não existe.

Pelo contrário, como podem outros, no lado oposto da guerra, dizer que não, que, no essencial, quase todo o programa e instalações nucleares se mantiveram intactos depois do referido bombardeamento e que, por isso, não se importam de voltar às negociações?

O mesmo se passa quando dissertam sobre o chamado “direito de defesa preventivo” – eufemismo que significa, na realidade, uma ofensiva de um Estado contra outro – que uns dizem assistir a Israel, mas não assistir à Rússia e outros dizem assistir a este país, mas não àquele.

Onde está a verdade e como é que, sobre a sua evidente ausência, é possível dissertar tanto e tão despudoradamente num sentido ou noutro, como se todos os espectadores fossem néscios?

Olhemos, porém, para outra situação, que nos é mais próxima.

Por maiores juras de fidelidade e obediência que muitos dos governantes europeus tenham expressado em Haia ao seu guru norte-americano – num exercício que faz lembrar a tese da chamada “soberania limitada” de outros tempos e de outras inspirações –, alguém de bom senso acreditará mesmo que o previsto gasto de 5% do orçamento anual de cada país europeu em defesa será alcançado em dez anos?

Para além da anuência política que, num curtíssimo relatório final da reunião da NATO, terá ficado expressa, que tratado – com valor legal, nacional e internacional – terá vinculado os participantes em tal cerimónia de exaltação e de louvor ao dourado deus da guerra a realizarem, como dizem que vão fazer, gastos de tal montante?

E, daqui a cinco e dez anos, onde estará já a maioria dos que disseram, com um ar sério, que assim vai acontecer?

E será que o reverenciado, irrequieto e dourado deus da guerra e da paz acredita, ele também, nesse compromisso?

Ou será que pretendeu apenas exibir, lá na sua terra, aos adoradores do bezerro de ouro, a sua semelhança com um deus vivo, omnipotente e omnipresente?

Numa outra perspetiva, ainda: como é possível convencerem-nos de que é viável cumprir algumas de tais metas orçamentais com a defesa, sem, imediatamente, tocar no “tesouro” que, todos os dias, todas as semanas, todos os meses, todos os anos os portugueses e os estrangeiros que cá trabalham fazem crescer, para, solidariamente, proverem o país de serviços públicos essenciais à realização diária do “bem comum”?

Falo, claro, dos gastos com a saúde, a educação, a habitação e a segurança social.

Falo, enfim, dos gastos necessários para proporcionar uma vida digna para todos.

Será que, afinal, havia e há, realmente, dinheiro – como dizem, agora, sobrar, se for para a guerra – para, nos próximos dez anos, melhorar substancialmente os serviços públicos e garantir aos mais necessitados, de hoje e de amanhã, melhores meios de vida e um futuro mais risonho para os seus filhos?

E se havia – e, pelos vistos, dizem-nos que há –, porque nos afirmaram sempre, até agora, que não, que não havia dinheiro para melhorar tais políticas e serviços públicos, porquê?

E, que nos dizem e esclarecem, hoje, sobre tais factos, sobre tais contradições e sobre tais perguntas os noticiários, as entrevistas e os comentários dos meios de comunicação tradicionais?

Pois…! Mais vale ouvir música.

E, de súbito, como quem enxota uma mosca, virei costas e fechei a televisão


Onde está a verdade e como é que, sobre a sua evidente ausência, é possível dissertar tanto e tão despudoradamente num sentido ou noutro, como se todos os espectadores fossem néscios?


Gradualmente, comecei a sentir que me desinteressava das notícias que sempre tomei por importantes, que me agitavam os dias, por vezes provocavam insónias e, com mais ou menos entusiasmo, construíam os temas principais das conversas com amigos e conhecidos.

Nunca fui adepto de redes sociais e sempre me mantive ligado à rádio, especialmente  de manhã, aos jornais com a primeira bica e antes do almoço e, já pelas oito da noite, à televisão.

Não terá sido, pois, por estar defraudado com a manipulação da verdade e pura invencionice, que oiço dizer se desenvolvem nas ditas redes sociais, que me começou a agoniar o “noticiário”.

Sei que muitos de tais temas são importantes e que de muitos deles pode depender o meu futuro e, principalmente, o futuro dos meus filhos e dos meus netos.

Mas, confesso, depois do inicial stress causado por mais uma sessão diária da encenação macabra em que se traduz, afinal, a cobertura noticiosa sobre a chamada “guerra dos doze dias”, senti que não aguentava mais.

Lendo e ouvindo os mirabolantes discursos dos senhores da guerra, ouvindo, depois, os comentadores mais engajados e fanáticos, concluí que quase tudo o que dizem se parece com o registo automático de uma máquina que debita mensagens pré-preparadas pela IA para, conforme o caso, a todos nos convencerem do que aconteceu ou não aconteceu.

Claro está, que isto que agora me sucede pode não passar de um efeito da idade que, também ela, vai gradualmente corroendo o que ainda sou.

Outros, que passaram já por esta mesma sensação, querem convencer-me de que assim é: que é da idade.

 Mas será só dela, insisto?

Continuo convicto que é o evidente grau de puerícia dos discursos e dos comentários que, sobre a guerra, a política de defesa e as alianças políticas e militares, ora se dizem, ora se desdizem, que me provocou esta minha súbita alergia a gastar com o “noticiário” o tempo que ainda me resta, e que espero seja longo.

É, realmente, precisa grande estultícia para que um qualquer comentador possa palpitar, como se de ciência feita se tratasse, que as bombas americanas terão ou não destruído, atrasado ou inviabilizado o programa atómico militar do Irão.

Quando uma afirmação sobre tais factos é feita por um general americano, um agente da Mossad, fardado ou à civil, israelita ou português ou, do outro lado, ouvimos um sisudo religioso iraniano contrariar tal versão, todos sabemos, de antemão, qual o efeito propagandístico pretendido por cada um deles: isso é normal e logo compreensível.

Mas que credibilidade terão, ainda, as senhoras e os senhores comentadores que vemos e ouvimos, diariamente, na televisão, para afirmarem, com um ar de aparente neutralidade – umas vezes que sim e outras que não –, que tal programa atómico abortou, ou que ele segue quase intacto já dentro de momentos?

Depois desse imenso e macabro teatro de marionetas, que gira, a cada hora, da tragédia para a comédia, da épica para a farsa ou mesmo para o mais negro cinema de terror, como podem – insisto eu em perguntar – tais comentadores encartados tentar, ainda, convencer-nos de uma coisa agora e, logo a seguir, do seu contrário?

Como podem os comentadores, que estão do lado dos cavaleiros do apocalipse, asseverar que tudo foi destruído, tudo deixou de existir, para, imediatamente, dizerem que é necessário um acordo diplomático sobre que destino dar, afinal, ao que já não existe.

Pelo contrário, como podem outros, no lado oposto da guerra, dizer que não, que, no essencial, quase todo o programa e instalações nucleares se mantiveram intactos depois do referido bombardeamento e que, por isso, não se importam de voltar às negociações?

O mesmo se passa quando dissertam sobre o chamado “direito de defesa preventivo” – eufemismo que significa, na realidade, uma ofensiva de um Estado contra outro – que uns dizem assistir a Israel, mas não assistir à Rússia e outros dizem assistir a este país, mas não àquele.

Onde está a verdade e como é que, sobre a sua evidente ausência, é possível dissertar tanto e tão despudoradamente num sentido ou noutro, como se todos os espectadores fossem néscios?

Olhemos, porém, para outra situação, que nos é mais próxima.

Por maiores juras de fidelidade e obediência que muitos dos governantes europeus tenham expressado em Haia ao seu guru norte-americano – num exercício que faz lembrar a tese da chamada “soberania limitada” de outros tempos e de outras inspirações –, alguém de bom senso acreditará mesmo que o previsto gasto de 5% do orçamento anual de cada país europeu em defesa será alcançado em dez anos?

Para além da anuência política que, num curtíssimo relatório final da reunião da NATO, terá ficado expressa, que tratado – com valor legal, nacional e internacional – terá vinculado os participantes em tal cerimónia de exaltação e de louvor ao dourado deus da guerra a realizarem, como dizem que vão fazer, gastos de tal montante?

E, daqui a cinco e dez anos, onde estará já a maioria dos que disseram, com um ar sério, que assim vai acontecer?

E será que o reverenciado, irrequieto e dourado deus da guerra e da paz acredita, ele também, nesse compromisso?

Ou será que pretendeu apenas exibir, lá na sua terra, aos adoradores do bezerro de ouro, a sua semelhança com um deus vivo, omnipotente e omnipresente?

Numa outra perspetiva, ainda: como é possível convencerem-nos de que é viável cumprir algumas de tais metas orçamentais com a defesa, sem, imediatamente, tocar no “tesouro” que, todos os dias, todas as semanas, todos os meses, todos os anos os portugueses e os estrangeiros que cá trabalham fazem crescer, para, solidariamente, proverem o país de serviços públicos essenciais à realização diária do “bem comum”?

Falo, claro, dos gastos com a saúde, a educação, a habitação e a segurança social.

Falo, enfim, dos gastos necessários para proporcionar uma vida digna para todos.

Será que, afinal, havia e há, realmente, dinheiro – como dizem, agora, sobrar, se for para a guerra – para, nos próximos dez anos, melhorar substancialmente os serviços públicos e garantir aos mais necessitados, de hoje e de amanhã, melhores meios de vida e um futuro mais risonho para os seus filhos?

E se havia – e, pelos vistos, dizem-nos que há –, porque nos afirmaram sempre, até agora, que não, que não havia dinheiro para melhorar tais políticas e serviços públicos, porquê?

E, que nos dizem e esclarecem, hoje, sobre tais factos, sobre tais contradições e sobre tais perguntas os noticiários, as entrevistas e os comentários dos meios de comunicação tradicionais?

Pois…! Mais vale ouvir música.