As condições presidenciais e arte de malhar no foco errado


É ao todo democrático que António José Seguro se deve dirigir, apelar e mobilizar, porque estamos fartos de um Portugal parcial, dos nichos, dos instalados, da bolha da capital e dos egos.


O país político e mediático tem-se entretido alguma coisa a verberar sobre a convergência de condições para os exercícios políticos, como se isso interessasse alguma coisa para os portugueses que não têm respostas para os seus problemas, para os desiludidos com o sistema político e para a superação dos desafios com que o país está confrontado, uns vindos de trás, outros colocados no horizonte pelas dinâmicas do país, da Europa e do mundo. Houve um tempo em que havia quem determinava que a divergência ou a diferença acabasse na fogueira, outro tempo em que o desvio da linha determinava a aposição de lápis azul, a tortura ou a prisão por razões políticas. Em certo sentido, 50 anos depois de Abril, a coberto da liberdade de expressão, proliferam proto-Torquemadas e censores, sem pingo de autoridade, legitimidade ou noção do ridículo do seu desfasamento com o país, depois de terem tido todas as condições reunidas para fazer, para transformar e para legar uma sociedade melhor do que aquela que receberam o exercício político.

Portugal continua a ser um território com enorme potencial, com uma diáspora que se afirmou na resiliência, no trabalho e na competência nos locais onde se instalou, mas com confrangedores problemas de organização, de eficiência e de foco no essencial que fazem prevalecer a burocracia, os interesses instalados e as visões parciais sobre o bem comum.

Potencial não falta, falta que vá além das circunstâncias para aproveitar as condições disponibilizadas em benefício da população, do país e da vivência democrática. É assim que tem prevalecido a circunstância, o umbigo e a sobrevivência política, avolumando-se os problemas e as disfunções lesivas do compromisso individual com a vivência em comunidade, a participação política e a democracia.

Houve condições para estabilizar opções políticas que respondessem ao problema da pobreza, das desigualdades, da ineficiência dos serviços públicos focados na estrutura e não nos cidadãos, da desertificação do interior, da falta de coesão territorial, do suplício da falta de qualidade de vida nos quotidianos urbanos, apesar do esforço das autarquias, do sufoco burocrático e fiscal de quem quer ter iniciativa para desenvolver atividades económicas, dos bloqueios no acesso à saúde, à habitação e à proteção em fases críticas da vida, mas as prioridades foram outras, de nicho eleitoral, de circunstância política, de agenda desfasada do que estruturalmente o país precisava e de indiferença perante os sinais de degradação e de deslaço.

Havia condições, não foram concretizadas, preferiu-se um exercício político que nos conduziu à implosão eleitoral de um partido político, à consagração da direita no poder e à consolidação da extrema-direita populista alimentada pelos escândalos, descontentamento e verborreia parlamentar sem o correspondente ataque aos seus pilares eleitorais.

O laxismo da circunstância conveniente trouxe o país a este beco de desesperança que precisa de experiência, seriedade, proximidade e sentido de futuro. Não se trata de acertar contas com o passado, nem de reescrever ou preservar sem autocrítica o que foi feito, é mesmo de ensaiar algo diferente do que fomos e do que somos no exercício político vigente. É isso que os faz tremer, a falta de amarras, de compromisso com os instalados, de sintonia com os de sempre e de indiferença em relação ao que pode fazer com que o potencial dos portugueses e de Portugal seja cumprido. António José Seguro nunca será o candidato das condições passadas que nos trouxeram até aqui, é o futuro que o move. Um novo caminho, com as pessoas, junto às pessoas, no país, com sentido institucional e constitucional das funções presidenciais. E para esse futuro, conta a experiência e a coragem de ir à Expo92 de Sevilha afirmar a causa de Timor-Leste independente junto ao Pavilhão da Indonésia e ser detido pela Guardia Civil, o sentido de desprendimento para deixar o lugar de eurodeputado, quando era vice-presidente dos socialistas europeus e líder da delegação dos socialistas portugueses no Parlamento Europeu para vir servir no governo de Portugal ou a defesa do interesse nacional junto do governo alemão em 2014 para que a AutoEuropa tivesse um novo veículo na Fábrica de Palmela, entre muitos exemplos de foco nas pessoas, no território e no país. Mas conta também, a vida comum, como empresário, professor e cidadãos que nunca perdeu a ligação à realidade concreta nas suas múltiplas expressões.

É por tudo isto que o vigente destilar de ódio e o malhar gratuito de um protagonista deve deixar de ser tido em conta, de tão rasteiro, injustificado e irrelevante é para o que o país precisa: decência, qualificação das funções, exigência e sentido de urgência no resgate da confiança, da esperança e do compromisso dos cidadãos com os eleitos, o exercício político e a democracia. Ao invés do que se diz no Alentejo, desta vem quem o espalhou não tem condições para os ajuntar, porque, por vocação, por ação e por falta de noção, se transformou em parte do problema e responsável por fenómenos que contribuíram para deslaçar o ambiente político, social e económico. Não perceber a persistência no dano quando emerge esperança num tempo novo é penoso e já deu alforge a que a esquerda se desmultiplique em candidaturas, potenciais conjeturas e afins, tudo a pensar nos umbigos, nos cálculos das tribos partidárias e em nichos que nunca estiveram disponíveis para o todo. É ao todo democrático que António José Seguro se deve dirigir, apelar e mobilizar, porque estamos fartos de um Portugal parcial, dos nichos, dos instalados, da bolha da capital e dos egos. Foco em Portugal e nos Portugueses, no território e na diáspora.

NOTAS FINAIS

LAMBE DE RUTTE. Já vimos de quase tudo nos últimos anos, mas a concentração de lambe-botismo do Secretário-Geral da NATO, Mark Rutte, com o paizinho Donald Trump atingiu, mesmo que sendo estratégica para a manutenção dos EUA dentro da organização, níveis de degradação nunca vistos. É um espécime forte com os fracos, pela matriz frugal, e mansinho com os fortes.

DESCULPA JORGE. Longe vão os tempos em que a responsabilidade política era parte integrante do exercício de funções públicas, como o fez Jorge Coelho quando se demitiu de ministro pela queda da Ponte de Entre-os-Rios, apesar de não ter nenhuma responsabilidade direta no trágico acidente. Depois desse tempo, a responsabilidade política entrou paulatinamente numa espiral de degradação e de alapados aos lugares como acontece com a atual Ministra da Saúde, Ana Paula Martins, sempre a sacudir responsabilidades para terceiros.

UM NOVO TEMPO COM CARNEIRO. A singularidade da eleição de um novo líder do PS sem oposição, sem alternativa, como sucedeu durante anos na sua juventude partidária, não pode ser uma expressão de calculismos perante a dimensão da empreitada. É um quase tudo ou mais nada. Felicidades e acerto, José Luís Carneiro.

As condições presidenciais e arte de malhar no foco errado


É ao todo democrático que António José Seguro se deve dirigir, apelar e mobilizar, porque estamos fartos de um Portugal parcial, dos nichos, dos instalados, da bolha da capital e dos egos.


O país político e mediático tem-se entretido alguma coisa a verberar sobre a convergência de condições para os exercícios políticos, como se isso interessasse alguma coisa para os portugueses que não têm respostas para os seus problemas, para os desiludidos com o sistema político e para a superação dos desafios com que o país está confrontado, uns vindos de trás, outros colocados no horizonte pelas dinâmicas do país, da Europa e do mundo. Houve um tempo em que havia quem determinava que a divergência ou a diferença acabasse na fogueira, outro tempo em que o desvio da linha determinava a aposição de lápis azul, a tortura ou a prisão por razões políticas. Em certo sentido, 50 anos depois de Abril, a coberto da liberdade de expressão, proliferam proto-Torquemadas e censores, sem pingo de autoridade, legitimidade ou noção do ridículo do seu desfasamento com o país, depois de terem tido todas as condições reunidas para fazer, para transformar e para legar uma sociedade melhor do que aquela que receberam o exercício político.

Portugal continua a ser um território com enorme potencial, com uma diáspora que se afirmou na resiliência, no trabalho e na competência nos locais onde se instalou, mas com confrangedores problemas de organização, de eficiência e de foco no essencial que fazem prevalecer a burocracia, os interesses instalados e as visões parciais sobre o bem comum.

Potencial não falta, falta que vá além das circunstâncias para aproveitar as condições disponibilizadas em benefício da população, do país e da vivência democrática. É assim que tem prevalecido a circunstância, o umbigo e a sobrevivência política, avolumando-se os problemas e as disfunções lesivas do compromisso individual com a vivência em comunidade, a participação política e a democracia.

Houve condições para estabilizar opções políticas que respondessem ao problema da pobreza, das desigualdades, da ineficiência dos serviços públicos focados na estrutura e não nos cidadãos, da desertificação do interior, da falta de coesão territorial, do suplício da falta de qualidade de vida nos quotidianos urbanos, apesar do esforço das autarquias, do sufoco burocrático e fiscal de quem quer ter iniciativa para desenvolver atividades económicas, dos bloqueios no acesso à saúde, à habitação e à proteção em fases críticas da vida, mas as prioridades foram outras, de nicho eleitoral, de circunstância política, de agenda desfasada do que estruturalmente o país precisava e de indiferença perante os sinais de degradação e de deslaço.

Havia condições, não foram concretizadas, preferiu-se um exercício político que nos conduziu à implosão eleitoral de um partido político, à consagração da direita no poder e à consolidação da extrema-direita populista alimentada pelos escândalos, descontentamento e verborreia parlamentar sem o correspondente ataque aos seus pilares eleitorais.

O laxismo da circunstância conveniente trouxe o país a este beco de desesperança que precisa de experiência, seriedade, proximidade e sentido de futuro. Não se trata de acertar contas com o passado, nem de reescrever ou preservar sem autocrítica o que foi feito, é mesmo de ensaiar algo diferente do que fomos e do que somos no exercício político vigente. É isso que os faz tremer, a falta de amarras, de compromisso com os instalados, de sintonia com os de sempre e de indiferença em relação ao que pode fazer com que o potencial dos portugueses e de Portugal seja cumprido. António José Seguro nunca será o candidato das condições passadas que nos trouxeram até aqui, é o futuro que o move. Um novo caminho, com as pessoas, junto às pessoas, no país, com sentido institucional e constitucional das funções presidenciais. E para esse futuro, conta a experiência e a coragem de ir à Expo92 de Sevilha afirmar a causa de Timor-Leste independente junto ao Pavilhão da Indonésia e ser detido pela Guardia Civil, o sentido de desprendimento para deixar o lugar de eurodeputado, quando era vice-presidente dos socialistas europeus e líder da delegação dos socialistas portugueses no Parlamento Europeu para vir servir no governo de Portugal ou a defesa do interesse nacional junto do governo alemão em 2014 para que a AutoEuropa tivesse um novo veículo na Fábrica de Palmela, entre muitos exemplos de foco nas pessoas, no território e no país. Mas conta também, a vida comum, como empresário, professor e cidadãos que nunca perdeu a ligação à realidade concreta nas suas múltiplas expressões.

É por tudo isto que o vigente destilar de ódio e o malhar gratuito de um protagonista deve deixar de ser tido em conta, de tão rasteiro, injustificado e irrelevante é para o que o país precisa: decência, qualificação das funções, exigência e sentido de urgência no resgate da confiança, da esperança e do compromisso dos cidadãos com os eleitos, o exercício político e a democracia. Ao invés do que se diz no Alentejo, desta vem quem o espalhou não tem condições para os ajuntar, porque, por vocação, por ação e por falta de noção, se transformou em parte do problema e responsável por fenómenos que contribuíram para deslaçar o ambiente político, social e económico. Não perceber a persistência no dano quando emerge esperança num tempo novo é penoso e já deu alforge a que a esquerda se desmultiplique em candidaturas, potenciais conjeturas e afins, tudo a pensar nos umbigos, nos cálculos das tribos partidárias e em nichos que nunca estiveram disponíveis para o todo. É ao todo democrático que António José Seguro se deve dirigir, apelar e mobilizar, porque estamos fartos de um Portugal parcial, dos nichos, dos instalados, da bolha da capital e dos egos. Foco em Portugal e nos Portugueses, no território e na diáspora.

NOTAS FINAIS

LAMBE DE RUTTE. Já vimos de quase tudo nos últimos anos, mas a concentração de lambe-botismo do Secretário-Geral da NATO, Mark Rutte, com o paizinho Donald Trump atingiu, mesmo que sendo estratégica para a manutenção dos EUA dentro da organização, níveis de degradação nunca vistos. É um espécime forte com os fracos, pela matriz frugal, e mansinho com os fortes.

DESCULPA JORGE. Longe vão os tempos em que a responsabilidade política era parte integrante do exercício de funções públicas, como o fez Jorge Coelho quando se demitiu de ministro pela queda da Ponte de Entre-os-Rios, apesar de não ter nenhuma responsabilidade direta no trágico acidente. Depois desse tempo, a responsabilidade política entrou paulatinamente numa espiral de degradação e de alapados aos lugares como acontece com a atual Ministra da Saúde, Ana Paula Martins, sempre a sacudir responsabilidades para terceiros.

UM NOVO TEMPO COM CARNEIRO. A singularidade da eleição de um novo líder do PS sem oposição, sem alternativa, como sucedeu durante anos na sua juventude partidária, não pode ser uma expressão de calculismos perante a dimensão da empreitada. É um quase tudo ou mais nada. Felicidades e acerto, José Luís Carneiro.