Nunca fui de idolatrar jogadores de futebol embora seja apaixonado pelo desporto rei. Lembro-me na escola, que tinha colegas com os cadernos completamente encadernados com imagens dos seus craques de eleição e que faziam tudo por um autógrafo de algum deles. Penso que o único desportista que segui ao ponto de ser o meu ídolo de infância dava pelo nome de Ayrton Senna da Silva. O piloto de Fórmula 1 era o que me enchia as medidas e com quem mais eu me identificava. Todos os outros, tinha logicamente as minhas preferências e aqueles que dentro do meu clube mais me faziam vibrar, mas sempre coloquei o emblema acima de qualquer artista. Na verdade podemos e devemos apreciar as características, os atributos a forma como se dedicam e se empenham, as vitórias e os feitos que conquistam, as alegrias que nos dão. Tudo isso é certo e faz sentido. Mas há que distinguir bem o que representam dentro de campo, de um carro ou de um pavilhão ou de um ringue, com aquilo que são como pessoas fora deles e que desconhecemos quase na totalidade para além de meia dúzia de intrigas e cochichos que aparecem nos meios de comunicação ou nas redes sociais.
Esta semana, numa praia aqui perto assisti a um ex-jogador de futebol de quem muito gostava ter atitudes que não me pareceram dignas da admiração que tinha por ele. Por um lado deixa-me triste cultivarmos uma imagem de certas pessoas que depois não encontra eco naquilo que é mais importante, na vida real fora do jogo. Por outro, só vem comprovar o que escrevi no primeiro parágrafo, que certos tipos quando despem a capa do seu lado profissional não encontram reflexo do que demonstram nos seus comportamentos porque na verdade são bem diferentes do que imaginamos. O jogador em causa queria fazer as coisas à maneira dele, não cumprindo com as regras do estabelecimento e quando foi chamado à atenção reagiu como uma criança mimada e foi para as redes sociais dar conta disso mesmo, com algumas afirmações falsas à mistura. Deu-se inclusive ao trabalho de durante dois dias continuar com a mesma postura só porque não foi tratado de forma especial como possivelmente é costume, não faço ideia.
É também uma boa forma de percebermos que o dinheiro, a fama ou a glória não compram educação, formas de estar ou maneiras de ser. Ficam ali envaidecidos ou iludidos por uma aparente superioridade quando deveriam ser os primeiros a dar o exemplo. Não sei se é por estarem mal habituados ou simplesmente porque a sua índole não permite mais, se foi só um mau dia (ou dois neste caso) ou se é regra. O que eu sei é que estrelas como esta são seguidas por milhares, às vezes milhões de crianças, que imitam os seus passes e truques, que querem ser como eles e que vão à loucura quando os veem. O que deviam fazer com este privilégio, era saber estar, perceber que muitas vezes são duplamente escrutinados e que têm o seu comportamento mais exposto, dando o exemplo, respeitando e transpondo essa magia para a vida real. Só que alguns não o fazem porque não são assim e não há nada a fazer. A uns metros deste estava o ator e comediante português Salvador Martinha, sempre simpático e diligente com quem o abordava, super discreto e tranquilo mas com uma atitude que dava gosto só de olhar.
Este é o perigo de idolatrarmos certas estrelas sem as conhecermos, sem vermos como se movimentam no dia a dia e como tratam os outros. A um grande corredor ou jogador nem sempre corresponde um grande homem ou mulher, que é muito mais importante. Esse é também um principio que devemos passar aos mais novos a coerência das nossas atitudes, a igualdade com que tratamos tudo e todos, o respeito pelas regras, pelos sítios que frequentamos e pelas pessoas com quem nos cruzamos. Sejam elas quem forem. Há definitivamente quem não o consiga entender por muito que lhes possamos fazer um desenho. Às vezes é só uma má fase, outras é tempo livre a mais mas algumas há, em que não vale a pena nos pormos com rodeios, é “só” má educação e sensibilidade igual à de uma bota da tropa. Sejam um exemplo, cultivem esse exemplo.