A origem do desastre do Sistema Elétrico Português foi a concessão, a partir de 2005, de FIT – Feed In Tariffs a milhares de MW de potências intermitentes.
Recorde-se que as FIT são “mecanismos contratuais de base política” que conferem aos investidores em potencias intermitentes que delas beneficiam uma “reserva de mercado” com as seguintes vantagens decisivas:
1 – A respetiva eletricidade tem acesso garantido à Rede Pública, mesmo que o mercado dela não necessite nesse momento;
2 – O produtor tem sempre um preço de venda garantido, normalmente muito acima do preço do mercado livre que prevalecer nesse momento;
3 – Todos os encargos com os backups para evitar os “apagões” provocados pelas intermitências das eólicas e solares, são depois suportados pelos consumidores.
As FIT beneficiam ainda, neste momento, 6.000 MW de potências eólicas e cerca de 500 MW de potências solares, sendo que a sua vigência se irá ainda prolongar até 2034!
Esta “reserva de mercado” até 2034 vai afetar até essa data todo o Sistema Elétrico Português, tanto os consumidores, que têm que pagar os respetivos sobrecustos, como os investidores em novas produções elétricas, visto que as respetivas produções se terão que ajustar aos “ditames” das intermitências de eólicas e solares.
Este “ajustamento” às potências intermitentes protegidas por FIT, já recai sobre as novas potências, nomeadamente solares, que se têm instalado em Portugal nos últimos anos.
Por exemplo, num fim de semana com sol e vento, um produtor solar “em mercado” pode ser impedido de vender eletricidade à Rede Pública, mesmo que esteja disposto a descer o preço para 1 Euro/MWh … , porque a Rede já está “ocupada” por potências com FIT.
Se consultarmos o relatório da SU Eletricidade relativo a 2023, os preços médios pagos nesse ano aos produtores intermitentes com FIT foram os seguintes:
– Solares: 315,4 Euros/MWh
– Eólicas Offshore: 159,5 Euros/MWh;
– Eólicas em terra: 96,6 Euros/MWh.
O que sendo muito acima dos preços de mercado, originou um sobrecusto total para os consumidores de 1.837 milhões de euros em 2023.
Para além destes sobrecustos, os consumidores vão ter ainda de pagar no futuro uma Dívida Tarifária do Setor Elétrico, criada em 2008 pelo Governo Sócrates e que está ainda hoje perto dos 2.000 milhões de euros.
Perante esta “calamidade económica” o mais elementar bom senso aconselha que não se concedam mais FIT a mais potências intermitentes.
Só que, recentemente, foi anunciado pela Ministra do Ambiente e Energia o lançamento “para breve” dum leilão para instalar mais 2.000 MW de potências eólicas intermitentes no offshore, aparentemente protegidas por um mecanismo contratual designado por CfD – Contratos por Diferença, que na prática concede, a quem deles beneficia, uma “reserva de mercado” idêntica às FIT.
Ou seja, em vez de se promover a otimização do Sistema Elétrico, deixando caducar progressivamente as FIT já existentes, propõe-se um novo desastre no Sistema Elétrico.
A irracionalidade de conceder mais FIT/CfD a eólicas offshore é gritante!
Desde logo, porque existindo já hoje 6.000 MW de potências eólicas intermitentes com FIT, quando o vento sopra com intensidade há excesso de produção e os preços de mercado afundam, aproximando-se de zero.
Ou seja, o Governo prepara-se para obrigar os consumidores a pagar nas TAR – Tarifas de Acesso à Rede um preço caríssimo, fala-se agora em FIT/CfD de perto de 200 Euros/MWh, para produzir eletricidade às horas a que ela não é necessária!
Acresce que, de acordo com o que foi recentemente anunciado, esse leilão para mais potências eólicas offshore será feito em duas fases:
– primeiro, os candidatos concorrem a “zonas marítimas” bem definidas, e,
– na segunda fase irão fazer as propostas do preço das FIT/CfD que exigem para aí instalarem potências eólicas.
Não sendo jurista, fica desde logo a dúvida sobre eventuais “direitos adquiridos” por um concorrente que, na primeira fase, “ganhou” uma determinada área marítima, mas que depois não consegue obter a FIT/CfD que pretende para viabilizar o investimento…
Enfim, um potencial “novelo jurídico” que só agrava este novo desastre para o Sistema Elétrico Português.
Resta a esperança que o novo Governo que agora entra em funções tenha o bom senso de arrepiar caminho, e de não conceder mais nenhuma FIT/CfD a mais nenhuma potência intermitente.
A bem da competitividade da economia e do bem-estar das famílias, como uma Democracia de Qualidade exige.
Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do Manifesto por Uma Democracia de Qualidade