Apagões em barda


O Governo PSD/CDS atira-se a alegadas novas falhas do SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal) como se a solução não tivesse nascido num Governo seu.


Sobressalto atrás de sobressalto, fica muito pouco de aprendizagem e de mobilização para a construção de soluções sustentáveis por parte dos decisores, dos cidadãos e da sociedade em geral. A comoção e as preocupações pífias e inconsequentes traduzem-se em muito pouco para a necessidade de agir em resposta às ocorrências, aos riscos, aos desafios e aos problemas estruturais que nos condicionam em tempo de normalidade e sublinham a nossa enorme fragilidade individual e comunitária em contexto de emergência. Com decisores de turno, sem visão, vocação pedagógica e sentido de compromisso com o interesse geral, além dos afagos da gestão quotidiana, da preservação das circunstâncias pessoais e do cálculo eleitoral, a relevância da vontade política, da agenda e da ação circunscreve-se ao que é corrente. Não será por de estranhar que, por facilitismo de execução dos recursos e de alimento das necessidades e das perceções da população, mesmo que quando intermediados por estruturas do Estado e da sociedade, se torre dinheiro do Plano de Recuperação e Resiliência em despesas correntes ao invés de o fazer na construção de respostas a problemas estruturais e a desafios relacionados com a capacidade de fazer frente a riscos e desafios. E a sociedade está cheia deles, que podem acontecer e que é preciso ter redundância em pilares críticos da sociedade, noção dos comportamentos cívicos adequados e capacidade de ativação de respostas das autoridades. Tudo o que não aconteceu no episódio do apagão elétrico da passada semana, com o país a entrar em modo de “barata tonta”, do gasóleo transportado por motoristas de ministros para uma maternidade aos recorrentes açambarcamentos de bens de duvidosa necessidade, passando pela ausência de comunicação e falência de funcionamento de infraestruturas críticas e estratégicas. O problema não é serem públicas e privadas por via de privatizações passadas, é não serem relevantes para os joguinhos partidários da pequena política e dos governos de turnos. É não darem votos, até serem tema. É tipo infraestruturas de abastecimento de água ou de esgotos. Não estão à vista, estão enterradas, não existem, mesmo quando proliferam as fugas de água potável.

Mas, o país está cheio de apagões.

O APAGÃO PRESIDENCIAL

O prolixo presidencial perdeu o pio, fala sobre o apagão dias após a ocorrência, ignora os irregulares funcionamentos das instituições, os deslaços sociais graves e a absoluta falta de vergonha do governo em gestão na utilização de recursos e instrumentos públicos em registo eleitoral, quando temos no plano local autarcas a serem perseguidos por publicações nas redes sociais, até nas contas pessoais. Marcelo apagou-se!

O APAGÃO DE TEMAS RELEVANTES

Com o mundo num impensável estado de incerteza, falta de regras e de pulverização, não há no debate eleitoral tempo para falar da União Europeia, da evidente necessidade de reforço da defesa europeia de forma autónoma aos dislates dos residentes na Casa Branca ou da ineficiência das organizações internacionais para lidar com os egos, os nacionalismos, os radicalismos e as implosões da ordem multilateral internacional.

O APAGÃO DO CRITÉRIO

Na política, na justiça, nas instituições e no jornalismo, houve um tempo em que existiam regras, racional e critério para as opções que eram tomadas e o caminho que se impunha, muito do que vemos parece coisa do passado, cada vez mais a toque da vontade de um ser humano só ou de determinados interesses particulares. Nada é explicado, percebe-se o sentido e o objetivo, pela falta de critério.

O APAGÃO DA MEMÓRIA

A falta de memória é um instrumento e uma oportunidade. O Governo PSD/CDS atira-se a alegadas novas falhas do SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal) como se a solução não tivesse nascido num Governo seu, também em gestão, liderado por Santana Lopes, com assinaturas de Daniel Sanches e Bagão Félix e, depois de peripécias, não tivesse sido validado por António Costa como ministro da administração interna. A centralidade da Sociedade Lusa de Negócios (SLN, que controlava o capital do BPN e esteve na criação do SIRESP, com uma porta giratória entre privado e público de Daniel Sanches, qual Olívia costureira a Olívia patroa) serve para fazer ligação ao alegado atestado de moralidade de Cavaco Silva a Luís Montenegro sobre as embrulhadas em torna da ex-suspensa-futura empresa familiar. Não defendo que os políticos tenham que ser oriundos de um sacerdócio de serviço público, podem e devem ter experiência de gestão privada. Defendo que o escrutínio tem de ser feito sem que se confunda com pura quadrilhice mediática, política ou cívica. Em condições normais, haveria uma entidade que fiscalizaria as declarações únicas de interesses, património e rendimentos, assegurando a observância da legalidade e as potenciais situações de incompatibilidade. Tem de haver transparência, mas onde está ela em situações do privado com impactos gerais, nas investigações e processos judiciais sem critério para justificar avanços ou arquivamentos e outras anormalidades da vida portuguesa?

Os apagões não são bons. Resultem de negligência, de incapacidade para gerar resiliência individual, comunitária ou nacional, de interesses instalados ou da vertigem da gestão do quotidiano em modo de sobrevivência corrente. Pode não dar votos, mas era bom que a sociedade portuguesa não estivesse pejada deles. São em barda, pode dar para ir vivendo, mas algum dia corre mal. Alguém decide por nós, vamos por caminhos que não queremos e pagamos faturas muito pesadas para tanto desleixo e falta de antecipação. A 18 de maio, não deixe de votar! Deu muito trabalho conquistar esse direito, para ser desperdiçado.

NOTAS FINAIS

O ALGODÃO ELEITORAL DA DIREITA. Um dos principais critérios de definição dos vencedores e dos vencidos do 18 de maio é a constatação do resultado do Chega. Depois do regabofe na bancada e do uso pelo governo de todos os meios para o fim da mitigação eleitoral, até o anúncio da expulsão de imigrantes período eleitoral de um governo de gestão, se Ventura se aguenta sem perdas, significa que a perda de credibilidade de Montenegro não permitiu a capitalização do vale tudo frente ao vale tudo da extrema-direita.

DEMÊNCIA NA CASA BRANCA. É duro sentir a degradação de uma ligação pessoal de sempre aos Estados Unidos da América, onde já estive em diversos momentos e em contactos com a sua diversidade. É do domínio da demência colocar uma imagem na conta oficial da Casa Branca de Trump em modo de Papa. Provavelmente alguns dos seus apaniguados acreditarão que é mesmo o sucessor do Papa Francisco, enquanto verbaliza dúvidas sobre se tem de cumprir a Constituição, essa coisa de advogados. Que degradação, que já contribuiu para eleição de soluções de esquerda na Austrália e no Canadá.

Apagões em barda


O Governo PSD/CDS atira-se a alegadas novas falhas do SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal) como se a solução não tivesse nascido num Governo seu.


Sobressalto atrás de sobressalto, fica muito pouco de aprendizagem e de mobilização para a construção de soluções sustentáveis por parte dos decisores, dos cidadãos e da sociedade em geral. A comoção e as preocupações pífias e inconsequentes traduzem-se em muito pouco para a necessidade de agir em resposta às ocorrências, aos riscos, aos desafios e aos problemas estruturais que nos condicionam em tempo de normalidade e sublinham a nossa enorme fragilidade individual e comunitária em contexto de emergência. Com decisores de turno, sem visão, vocação pedagógica e sentido de compromisso com o interesse geral, além dos afagos da gestão quotidiana, da preservação das circunstâncias pessoais e do cálculo eleitoral, a relevância da vontade política, da agenda e da ação circunscreve-se ao que é corrente. Não será por de estranhar que, por facilitismo de execução dos recursos e de alimento das necessidades e das perceções da população, mesmo que quando intermediados por estruturas do Estado e da sociedade, se torre dinheiro do Plano de Recuperação e Resiliência em despesas correntes ao invés de o fazer na construção de respostas a problemas estruturais e a desafios relacionados com a capacidade de fazer frente a riscos e desafios. E a sociedade está cheia deles, que podem acontecer e que é preciso ter redundância em pilares críticos da sociedade, noção dos comportamentos cívicos adequados e capacidade de ativação de respostas das autoridades. Tudo o que não aconteceu no episódio do apagão elétrico da passada semana, com o país a entrar em modo de “barata tonta”, do gasóleo transportado por motoristas de ministros para uma maternidade aos recorrentes açambarcamentos de bens de duvidosa necessidade, passando pela ausência de comunicação e falência de funcionamento de infraestruturas críticas e estratégicas. O problema não é serem públicas e privadas por via de privatizações passadas, é não serem relevantes para os joguinhos partidários da pequena política e dos governos de turnos. É não darem votos, até serem tema. É tipo infraestruturas de abastecimento de água ou de esgotos. Não estão à vista, estão enterradas, não existem, mesmo quando proliferam as fugas de água potável.

Mas, o país está cheio de apagões.

O APAGÃO PRESIDENCIAL

O prolixo presidencial perdeu o pio, fala sobre o apagão dias após a ocorrência, ignora os irregulares funcionamentos das instituições, os deslaços sociais graves e a absoluta falta de vergonha do governo em gestão na utilização de recursos e instrumentos públicos em registo eleitoral, quando temos no plano local autarcas a serem perseguidos por publicações nas redes sociais, até nas contas pessoais. Marcelo apagou-se!

O APAGÃO DE TEMAS RELEVANTES

Com o mundo num impensável estado de incerteza, falta de regras e de pulverização, não há no debate eleitoral tempo para falar da União Europeia, da evidente necessidade de reforço da defesa europeia de forma autónoma aos dislates dos residentes na Casa Branca ou da ineficiência das organizações internacionais para lidar com os egos, os nacionalismos, os radicalismos e as implosões da ordem multilateral internacional.

O APAGÃO DO CRITÉRIO

Na política, na justiça, nas instituições e no jornalismo, houve um tempo em que existiam regras, racional e critério para as opções que eram tomadas e o caminho que se impunha, muito do que vemos parece coisa do passado, cada vez mais a toque da vontade de um ser humano só ou de determinados interesses particulares. Nada é explicado, percebe-se o sentido e o objetivo, pela falta de critério.

O APAGÃO DA MEMÓRIA

A falta de memória é um instrumento e uma oportunidade. O Governo PSD/CDS atira-se a alegadas novas falhas do SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal) como se a solução não tivesse nascido num Governo seu, também em gestão, liderado por Santana Lopes, com assinaturas de Daniel Sanches e Bagão Félix e, depois de peripécias, não tivesse sido validado por António Costa como ministro da administração interna. A centralidade da Sociedade Lusa de Negócios (SLN, que controlava o capital do BPN e esteve na criação do SIRESP, com uma porta giratória entre privado e público de Daniel Sanches, qual Olívia costureira a Olívia patroa) serve para fazer ligação ao alegado atestado de moralidade de Cavaco Silva a Luís Montenegro sobre as embrulhadas em torna da ex-suspensa-futura empresa familiar. Não defendo que os políticos tenham que ser oriundos de um sacerdócio de serviço público, podem e devem ter experiência de gestão privada. Defendo que o escrutínio tem de ser feito sem que se confunda com pura quadrilhice mediática, política ou cívica. Em condições normais, haveria uma entidade que fiscalizaria as declarações únicas de interesses, património e rendimentos, assegurando a observância da legalidade e as potenciais situações de incompatibilidade. Tem de haver transparência, mas onde está ela em situações do privado com impactos gerais, nas investigações e processos judiciais sem critério para justificar avanços ou arquivamentos e outras anormalidades da vida portuguesa?

Os apagões não são bons. Resultem de negligência, de incapacidade para gerar resiliência individual, comunitária ou nacional, de interesses instalados ou da vertigem da gestão do quotidiano em modo de sobrevivência corrente. Pode não dar votos, mas era bom que a sociedade portuguesa não estivesse pejada deles. São em barda, pode dar para ir vivendo, mas algum dia corre mal. Alguém decide por nós, vamos por caminhos que não queremos e pagamos faturas muito pesadas para tanto desleixo e falta de antecipação. A 18 de maio, não deixe de votar! Deu muito trabalho conquistar esse direito, para ser desperdiçado.

NOTAS FINAIS

O ALGODÃO ELEITORAL DA DIREITA. Um dos principais critérios de definição dos vencedores e dos vencidos do 18 de maio é a constatação do resultado do Chega. Depois do regabofe na bancada e do uso pelo governo de todos os meios para o fim da mitigação eleitoral, até o anúncio da expulsão de imigrantes período eleitoral de um governo de gestão, se Ventura se aguenta sem perdas, significa que a perda de credibilidade de Montenegro não permitiu a capitalização do vale tudo frente ao vale tudo da extrema-direita.

DEMÊNCIA NA CASA BRANCA. É duro sentir a degradação de uma ligação pessoal de sempre aos Estados Unidos da América, onde já estive em diversos momentos e em contactos com a sua diversidade. É do domínio da demência colocar uma imagem na conta oficial da Casa Branca de Trump em modo de Papa. Provavelmente alguns dos seus apaniguados acreditarão que é mesmo o sucessor do Papa Francisco, enquanto verbaliza dúvidas sobre se tem de cumprir a Constituição, essa coisa de advogados. Que degradação, que já contribuiu para eleição de soluções de esquerda na Austrália e no Canadá.