Qual lhe parece ser o momento ou a decisão que torna a derrota da Alemanha na guerra um desfecho inevitável?
É a invasão da União Soviética, em Junho de 1941, com a Inglaterra ainda de pé e operacional e os Estados-Unidos numa neutralidade colaborante com os ingleses, que, em meu entender, marca a viragem na guerra que leva à derrota da Alemanha.
Hitler invade por razões ideológicas e geopolíticas: acredita que a Rússia é governada pelos judeus, quando Estaline, nos processos de 1938-39, já se tinha livrado dos judeus importantes do Bureau Político, dos Zinoviev, dos Kamenev e de outros, embora houvesse judeus comunistas na hierarquia dos campos de concentração. A Rússia era comunista há vinte anos, mas o povo russo era patriota e Estaline soube bem silenciar o comunismo e puxar pelo patriotismo do povo. E, no seu pragmatismo, foi ao ponto de ir buscar a tradição e a religião e usá-las na resistência contra os alemães.
Como se explica que Hitler se tenha mantido no poder mesmo numa altura em que era já claro que estava a arrastar a Alemanha para o abismo? É certo que houve o atentado falhado de Stauffenberg [20 de julho de 1944], mas de resto os alemães mantiveram-se-lhe leais até ao fim.
Hitler tinha sido eleito e tinha consolidado o seu poder através de uma política económico-social bem-sucedida. Os nacionais-socialistas tinham também desenvolvido acções de propaganda e feito a educação político-ideológica das novas gerações. O corpo de generais era crítico, mas com as vitórias de 1939-41 tinham passado a gostar de um chefe que lhes proporcionava conquistas e sucessos. É impressionante, como afirmou Estaline, que o Exército Vermelho tivesse entrado na Alemanha em Dezembro de 1944 e daí até ao fim não houvesse uma “revolta de trabalhadores” ou uma adesão aos Vermelhos dos trabalhadores alemães.
Também é espantoso que Mussolini e Hitler, os dois grandes aliados, tenham morrido com apenas dois dias de diferença. Acha que se trata de uma mera coincidência?
Ficaram os dois até ao fim. Em território invadido, rodeado pelo núcleo duro dos fiéis, Hitler não queria cair prisioneiro dos soviéticos, não queria ser humilhado, chegando mesmo a executar a sua cadela para também a poupar. Por isso escolheu o suicídio, com Eva Braun, com cautela e ritualidade e depois de um casamento pagão, nacional-socialista. Como os Goebbels, Joseph e Magda, que se suicidaram depois de terem morto os seus seis filhos, cinco meninas e um rapaz, também para não caírem nas mãos dos soviéticos. O suicídio foi a escolha de muitos alemães, perante a previsível vindicta russa.
Mussolini não se queria render aos partigiani comunistas, mas os alemães entregaram-no e foi capturado e fuzilado com alguns dos seus fiéis fascistas e com a sua última paixão, Clara Petacci. Foram pendurados pelos pés para exibição em praça pública, mais precisamente na Piazzale Loreto, em Milão.
Mas Hitler e Mussolini são casos diferentes, bem diferentes, embora a guerra, no seu estertor final, os tenha aproximado.
Não é irónico que um homem que falava tanto de espaço vital e que partiu à conquista de grande parte da Europa (e não só) acabe fechado num bunker quase como um animal acossado na sua toca?
São as ironias do destino. Hitler, um homem de grandes multidões, um orador de grandes comícios, não o vemos a visitar as cidades da Alemanha bombardeadas, vai desaparecendo gradualmente do público, perde visibilidade.
Certo que na sequência do 20 de Julho, ficou fisicamente debilitado.
Mas passa a ser um quase fantasma, vivendo ali, a 15 metros de profundidade, aparecendo muito fugazmente, por exemplo no 20 de Abril, como é visível na sua última fotografia célebre, com os adolescentes da Hitlerjugend, que ainda o admiram e estão dispostos a morrer por ele.
Recomenda algum livro que ajude a perceber melhor este período do final da Segunda Guerra Mundial?
Um livro muito interessante, com uma análise político-militar profunda destes temas é Die Zerstörung Europas: Beiträge zur Weltkriegsepoche 1914 bis 1945, de um historiador alemão, Andreas Hillgruber, um nacional-conservador anti-hitleriano. Li-o na edição italiana – La distruzione dell’Europa. La Germania e l’epoca delle guerre mondiali (1914-1945). Escrevi sobre o fim de Mussolini e de Hitler em Cinco Homens que abalaram a Europa: biografias cruzadas, de 2016, mas creio que o livro, que teve várias reedições, está esgotado.