Adolf Hitler foi, pelas piores razões, uma das personagens principais do século XX. Um tirano que perseguiu, torturou, invadiu, assassinou e, embebido em teorias paranoicas que o foram consumindo ao longo da vida, criou um mecanismo de morte em massa – a “solução final” – que ditou a morte de aproximadamente 6 milhões de judeus.
Aqui estão 10 momentos que foram cruciais para a vida de Hitler. Tendo todos sido traumáticos, misteriosos ou violentos – alguns reúnem as três características –, são o espelho da vida de um homem que ficará nas páginas negras da história.
Infância. Primeiro contacto com o nacionalismo radical
Os primeiros anos de Hitler são fundamentais para identificar algumas das sementes destrutivas que marcam o seu nefasto legado. Nasce em 1889 em Braunau am Inn, na região austríaca do ainda império Austro-Húngaro, mas a sua adolescência desenrola-se, maioritariamente, na principal cidade do norte do país, Linz, antes de se deslocar a Viena. Linz era uma cidade de maioria alemã onde o nacionalismo exacerbado, pregado principalmente por Georg von Schönerer, que defendia o pangermanismo e espaço comum e vital, era muito vincado. O seu percurso escolar não foi tranquilo, retraindo-se “psicologicamente, preferindo reencenar batalhas da Guerra dos Bóeres a estudar. Aos 16 anos, abandonou a escola sem quaisquer qualificações”, refere a BBC.
O interesse pelas artes. Rejeição e experiência cosmopolita
Como se tornou amplamente conhecido, Hitler era um apaixonado pelas artes. Tentou ingressar na Escola de Belas Artes de Viena, mas viu negada a sua entrada por duas ocasiões. É também na capital austríaca que o futuro líder nazi choca com uma realidade social totalmente diferente – cosmopolita e multiétnica – da que estivera habituado em Linz, o que contribuiu para o crescimento da semente ultranacionalista que já havia sido plantada no cérebro do jovem austríaco. Hitler vivia numa situação financeira delicada, dormia de abrigo em abrigo, e ia tentando sobreviver através de alguns trabalhos e da pintura.
Primeira Guerra Mundial. Uma experiência “primacial”
“A experiência primacial de Hitler parece ter sido a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial”, escreveu Henry Kissinger – judeu que fugiu do Terceiro Reich para os Estados Unidos e que seria um dos protagonistas das relações internacionais durante a Guerra Fria. “Ele nunca cessou de contar como teve conhecimento dela, acamado num hospital militar, parcialmente cego por gás mostarda”. E foi o facto de culpar os líderes alemães de não lutarem até ao fim, em conjunto com a culpabilização dos judeus pelo declínio germânico, que propulsionou Hitler a prosseguir as suas fantasiosas, e hediondas, cruzadas.
O putsch de Munique. Da cervejaria à prisão
O putsch de Munique, também conhecido como putsch da cervejaria, foi um dos episódios cruciais no processo de ascensão ao poder, mesmo que não tenha logrado os objetivos iniciais. O ano era 1923. Hitler era o líder do Partido Nacional Socialista alemão desde 1921. Mestre na arte da retórica, cativou os alemães à base de discursos eloquentes e inflamados. No dia 8 de novembro, Adolf Hitler e a sua guarda pretoriana do momento, as SA, irromperam numa cervejaria de Munique onde se encontravam reunidos vários nomes de topo da política bávara. O objetivo era derrubar o governo regional e, posteriormente, partir em busca da República de Weimar. No dia seguinte, os nazis marcharam sobre a capital da Baviera, mas foram neutralizados e Hitler foi detido.
A prisão e omanifesto. Landsberg e o Mein Kampf
Foi na prisão de Landsberg, após ter sido condenado por traição na sequência da tentativa falhada de golpe de estado contra a República de Weimar em Munique, que Hitler redigiu o documento que acabaria por definir a sua missão e, consequentemente, a história do século XX – o Mein Kampf (A Minha Luta). “A sua filosofia”, escreveu também Kissinger, “estendia-se do banal ao fantástico e consistia numa reembalagem popular da sabedoria direitista, radical e convencional”. “Com os instintos de um proscrito e um faro apurado para as fraquezas psicológicas, manobrava os adversários de inferioridade em inferioridade”. A estada de Hitler em Landsberg durou apenas 9 meses dos 5 anos previstos, e vários relatos apontam para o facto de ter recebido um tratamento preferencial.
Ressentimento. O impulsionador de Hitler para o poder
“Em 1930, a disposição de uma grande parte da nação alemã era de ressentimento”, escreveu Alan Bullock na sua obra Hitler: A Study in Tyranny. “Hitler, com um quase inesgotável fundo de ressentimento para explorar no seu próprio caractér, ofereceu [ao povo alemão] uma série de objetos a culpar pelos seus infortúnios”. A sua crescente popularidade colocou uma forte pressão sobre o Presidente Hindenburg para que o nomeasse chanceler, e a 30 de janeiro de 1933 Hindenburg cede e convida a Hitler a formar governo. “Depois, o Reichstag foi dissolvido e foram convocadas eleições gerais. Neste quadro, as tropas de choque nazis saíram agressivamente para as ruas (…) [e] o Partido Nazi ganhou as eleições com 43,9% dos votos”, escreve David Owen em Na Doença e No Poder.
A Noite das Facas Longas. Eliminar a oposição interna
Já cimentado no poder após a vitória nas eleições e “a proscrição dos deputados comunistas”, que permitiu “que uma lei que dava a Hitler poder ilimitado fosse aprovada pela necessária maioria de dois terços”, como relata Owens, Hitler levou a cabo uma purga às SA, alegando que o líder, o seu antigo companheiro de luta Ernst Röhm, estava a preparar um putsch. A operação foi conduzida pelas SS, à data uma força de segurança pessoal de elite. Entre as vítimas – que terão sido centenas – encontravam-se, segundo a Brittanica, figuras de relevo como “Kurt von Schleicher; Gregor Strasser, que até 1932 tinha sido o segundo no Partido Nazi a seguir a Hitler; o ex-separatista bávaro Gustav von Kahr; o crítico conservador Edgar Jung; e o professor católico Erich Klausener”.
Acordo de Munique. A carta branca de Chamberlain
30 de setembro de 1938 ficará marcado na história como o apaziguamento que deu carta branca as pretensões megalómanas e sanguinárias de Hitler. Neville Chamberlain e Édouard Daladier, primeiros-ministros britânico e francês, respetivamente, assinaram com Hitler e Mussolini um acordo que legitimou a anexação da região dos Sudetas por parte dos alemães. O debate em Inglaterra foi aceso. De um lado estavam os “falcões”, liderados por Churchill, que insistiam no rearmamento e no confronto. Do outro, as “pombas” como Chamberlain ou Lord Halifax. As “pombas” levaram a melhor e Chamberlain regressou a Londres com um semblante vitorioso, empunhando o acordo que, dizia ele, garantiria a “paz no nosso tempo”. Não poderia estar mais enganado.
Invasão da Polónia. O pontapé de saída da II Guerra Mundial
Nem um ano se passara desde o infame Acordo de Munique quando o exército alemão marchou sobre a Polónia. Dois dias depois, a 3 de setembro de 1939, britânicos e franceses declararam guerra à Alemanha, dando o pontapé de saída na Segunda Guerra Mundial. Após uma década de incompreensão – uma característica transversal a quase todos os grandes líderes da história – provou-se que Churchill estava, afinal, certo. A derrota dos polacos deu-se pouco mais de um mês depois, tendo sido também atacados no flanco leste pelos soviéticos, com quem os nazis haviam já celebrado um pacto de não-agressão. Estava dado o primeiro grande passo da campanha rumo à dominação total e ao Lebensraum pretendidos por Hitler.
O fim. Afogado pela paranóia e pelas derrotas, Hitler suicida-se
lll A paranoia foi desgastando Hitler durante a guerra e em 1944 foi dada uma forte machadada no estado de saúde do führer. Claus von Stauffenberg, a face principal de uma conspiração para assassinar Hitler, levou consigo uma mala com explosivos para uma reunião restrita no quartel Wolfsschanze (Toca do Lobo). O objetivo não foi cumprido, mas a explosão debilitou o líder nazi. “Os efeitos mais graves (…) foram psicológicos e a paranoia de Hitler tornou-se muito pior”, escreveu Owens na obra No Poder e Na Doença. Acabou por suicidar-se no seu bunker, que se situava sob a Antiga Chancelaria do Reich, num dia como hoje, há 80 anos.