A Europa vai à Casa Branca


Há qualquer coisa de profundamente irónico na visita de Giorgia Meloni a Trump, acontecida hoje. Meloni, nada na Garbatella, um bairro popular de Roma, foi a Washington negociar a extorsão promovida por Trump: “Europeus! Comprem mais gás natural e mais armas aos Estados Unidos e baixaremos as taxas alfandegárias”


Trump, empresário da construção civil, fez a sua carreira em duas geografias em que o modelo económico siciliano pontificava: Nova Iorque e Atlantic City. A inversão de papéis não escapa a ninguém.

Considerado este contexto, a escolha de Meloni como negociadora dos interesses da União Europeia junto de Trump parece avisada mas não resulta de nenhuma das soluções possíveis à luz dos Tratados que regulam a União Europeia: não é Presidente da Comissão, não é Alta Representante para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, não é Comissária Europeia, não é Presidente do Conselho Europeu, não é Presidente do Parlamento Europeu ou Eurodeputada, também não é Chefe de Estado ou de Governo do Estado que ocupa a presidência rotativa do Conselho Europeu e também não é a líder de um dos Estados que tradicionalmente pretende falar em nome dos 27 (papel a actualmente assumido por Macron e efectivamente exercido no passado por Merkel). Quem é Giorgia? Nas palavras da própria, num comício em 2019: “Io sono Giorgia, sono uma donna, sono una madre, sono italiana, sono cristiana! No me lo toglierebbe!” Meloni capturou uma parte importante do voto dos italianos com uma contra-reforma identitária, combatendo o politicamente correcto, os excessos das políticas de género, as derivas neo-culturais que põem em causa a tessitura histórico-cultural italiana. La Meloni está muito longe dos excessos da extrema direita europeia à la Orbán ou de Marine Le Pen, mesmo na versão liofilizada do Rassemblement National. A praxis política do seu governo tem contribuído, e muito, para uma redução da atractividade e dos votos na Lega de Salvini.

Uma das prioridades do Governo Meloni coincide com a de todos os governos italianos desde a invasão de Roma pelos bárbaros: recuperar um papel central na política internacional. A presidência italiana do G7 em 2024 foi um primeiro ensaio bem sucedido. A negociação da pasta do  Comissário italiano também correu bem e, não obstante as dificuldades resultantes da não integração do partido de Meloni (Fratelli d’Italia) em nenhum dos três grandes grupos políticos (PPE, Socialistas e Liberais), Giorgia tem conseguido uma presença positiva nos Conselhos Europeus.

A visita a Washington não foi desejada pela liderança do triunvirato de Bruxelas (Comissão-Conselho-Parlamento) mas não foi obstaculizada. Trump tem dado provas de simpatia por Meloni e tem desdenhado os líderes das instituições europeias, procurando quebrar a unidade dos 27 e torpedear a competência da Comissão Europeia em matéria de comércio externo (desde logo ignorando as propostas de abolição das tarifas sobre o comércio de mercadorias).

A melhor prova de que as diligências de Giorgia podem dar resultados está na entrevista “preventiva” concedida esta semana por von der Leyen ao Die Zeit e prontamente editada, compactada e traduzida para inglês pelo seu gabinete e ontem disponibilizada online de forma gratuita. Ursula, sempre formatada, não resistiu a um momento de Euroforia (caracterização certeira feita pelos entrevistadores) e declarou, com economia na verdade, a supremacia cultural europeia: “We have no bros and no oligarchs”. Ursula, tu non sei Giorgia.

A Europa vai à Casa Branca


Há qualquer coisa de profundamente irónico na visita de Giorgia Meloni a Trump, acontecida hoje. Meloni, nada na Garbatella, um bairro popular de Roma, foi a Washington negociar a extorsão promovida por Trump: “Europeus! Comprem mais gás natural e mais armas aos Estados Unidos e baixaremos as taxas alfandegárias”


Trump, empresário da construção civil, fez a sua carreira em duas geografias em que o modelo económico siciliano pontificava: Nova Iorque e Atlantic City. A inversão de papéis não escapa a ninguém.

Considerado este contexto, a escolha de Meloni como negociadora dos interesses da União Europeia junto de Trump parece avisada mas não resulta de nenhuma das soluções possíveis à luz dos Tratados que regulam a União Europeia: não é Presidente da Comissão, não é Alta Representante para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, não é Comissária Europeia, não é Presidente do Conselho Europeu, não é Presidente do Parlamento Europeu ou Eurodeputada, também não é Chefe de Estado ou de Governo do Estado que ocupa a presidência rotativa do Conselho Europeu e também não é a líder de um dos Estados que tradicionalmente pretende falar em nome dos 27 (papel a actualmente assumido por Macron e efectivamente exercido no passado por Merkel). Quem é Giorgia? Nas palavras da própria, num comício em 2019: “Io sono Giorgia, sono uma donna, sono una madre, sono italiana, sono cristiana! No me lo toglierebbe!” Meloni capturou uma parte importante do voto dos italianos com uma contra-reforma identitária, combatendo o politicamente correcto, os excessos das políticas de género, as derivas neo-culturais que põem em causa a tessitura histórico-cultural italiana. La Meloni está muito longe dos excessos da extrema direita europeia à la Orbán ou de Marine Le Pen, mesmo na versão liofilizada do Rassemblement National. A praxis política do seu governo tem contribuído, e muito, para uma redução da atractividade e dos votos na Lega de Salvini.

Uma das prioridades do Governo Meloni coincide com a de todos os governos italianos desde a invasão de Roma pelos bárbaros: recuperar um papel central na política internacional. A presidência italiana do G7 em 2024 foi um primeiro ensaio bem sucedido. A negociação da pasta do  Comissário italiano também correu bem e, não obstante as dificuldades resultantes da não integração do partido de Meloni (Fratelli d’Italia) em nenhum dos três grandes grupos políticos (PPE, Socialistas e Liberais), Giorgia tem conseguido uma presença positiva nos Conselhos Europeus.

A visita a Washington não foi desejada pela liderança do triunvirato de Bruxelas (Comissão-Conselho-Parlamento) mas não foi obstaculizada. Trump tem dado provas de simpatia por Meloni e tem desdenhado os líderes das instituições europeias, procurando quebrar a unidade dos 27 e torpedear a competência da Comissão Europeia em matéria de comércio externo (desde logo ignorando as propostas de abolição das tarifas sobre o comércio de mercadorias).

A melhor prova de que as diligências de Giorgia podem dar resultados está na entrevista “preventiva” concedida esta semana por von der Leyen ao Die Zeit e prontamente editada, compactada e traduzida para inglês pelo seu gabinete e ontem disponibilizada online de forma gratuita. Ursula, sempre formatada, não resistiu a um momento de Euroforia (caracterização certeira feita pelos entrevistadores) e declarou, com economia na verdade, a supremacia cultural europeia: “We have no bros and no oligarchs”. Ursula, tu non sei Giorgia.