O fenómeno das redes sociais trouxe ao mundo uma capacidade de conexão jamais vista. Indivíduos dos quatro cantos do mundo têm agora a possibilidade de permanecer em contacto instantâneo, descartando a morosidade das vias de comunicação tradicionais. Segundo dados da Statista, 5,24 mil milhões de pessoas utilizam as redes sociais. Assim, não parece difícil concluir que o mundo nunca esteve menos isolado, com cerca de dois terços da sua população a frequentar as chamadas praças públicas globais. Mas será mesmo assim? De acordo com vários estudos, não.
O isolamento está em crescimento, algo que nos coloca perante um paradoxo evidente. Estamos mais conectados que nunca, mas, ao mesmo tempo mais sós. E será que foi sempre assim desde a criação destas ferramentas que permitem a conectividade online? Como chegámos a este ponto, e quais são as ramificações deste isolamento, principalmente nos mais jovens?
Facebook, uma revolução
“O meu objetivo nunca foi apenas criar uma empresa”, disse Mark Zuckerberg em 2011. “Muitas pessoas interpretam isso de forma errada, como se eu não me preocupasse com as receitas ou com os lucros ou com qualquer uma dessas coisas. Mas o que não ser apenas uma empresa significa para mim é não ser apenas isso – construir algo que realmente faça uma grande mudança no mundo”. Sete anos antes, Zuckerberg tinha lançado o Facebook. Não tendo sido a primeira rede social, foi a que lançou a revolução tecnológica para outro patamar.
Criada com o intuito de servir como uma rede de comunicação entre os alunos da Universidade de Harvard, onde Zuckerberg estudou por dois anos Ciências Informáticas antes de abandonar o curso, o Facebook lidera hoje o ranking das maiores redes sociais do mundo, contando com um número de utilizadores equivalente a aproximadamente 38% da população mundial.
“A missão do Facebook é dar às pessoas o poder de construir comunidades e aproximar o mundo. Como empresa, exploramos a forma como as pessoas se podem juntar todos os dias e retribuir às suas comunidades em grande escala. Fornecemos à nossa comunidade várias ferramentas que podem ser aproveitadas para melhorar o impacto social”, é a mensagem que pode ser lida no website oficial da Meta, empresa que detém o Facebook. Mais uma vez, é sublinhado o objetivo de “aproximar o mundo”.
Uma sondagem conduzida pela Gallup em parceria com a Meta, publicada em 2023, mostra que “mais de sete em cada 10 adultos inquiridos em 142 países em 2022 afirmaram sentir-se “muito” ou “razoavelmente” ligados às pessoas. De facto, em quase todos os países (138 de 142), pelo menos metade da população afirmou sentir-se da mesma forma”. Também na faixa etária compreendida entre os 13 e os 17 anos, segundo uma sondagem de 2022 elaborada pelo Pew Research Centre, o sentimento generalizado parece ser positivo: “Oito em cada dez adolescentes afirmam que o que veem nas redes sociais os faz sentir mais ligados ao que se passa na vida dos seus amigos, enquanto 71% afirmam que isso os faz sentir que têm um lugar onde podem mostrar o seu lado criativo”. Assim, pode dizer-se com alguma segurança que o objetivo principal foi atingido.
O reverso da medalha
“Um estudo realizado com jovens entre os 19 e os 32 anos revelou uma forte associação linear entre o aumento da utilização dos meios de comunicação social e o aumento da perceção de isolamento social”, pode ler-se numa análise levada a cabo pelo Regis College.
Abby Bowler, num artigo científico intitulado “Isolation Among Generation Z in the United States” (Isolamento da Geração Z nos Estados Unidos, numa tradução livre para português), publicado em abril de 2020 no Ballard Brief, apresenta a relação positiva entre a utilização das redes sociais e a sensação de isolamento – o paradoxo mencionado no início – na Geração Z (geração de pessoas nascidas entre o final da década de 1990 e início da década de 2010). “A Geração Z é a geração mais solitária que o mundo já viu, com taxas de isolamento mais elevadas do que os millennials [nascidos entre 1981 d 1996] e os membros da Geração X [nascidos entre 1965 e 1981]”, diz a investigadora americana.
“Fatores como a utilização dos meios de comunicação social contribuem para sentimentos de solidão que são agravados pela vulnerabilidade e pela exclusão dos pares frequentemente vividas durante a adolescência”, escreve Bowler, o que impactará de forma negativa “a saúde física e mental dos adolescentes”. A autora menciona ainda efeitos concretos, como a “diminuição da eficiência do sono, um sistema imunitário enfraquecido e depressão” e propensão para “participar em comportamentos de risco, como o abuso de substâncias” e chegou à conclusão de que “os adolescentes que utilizam muito as redes sociais são mais suscetíveis de se sentirem sozinhos do que aqueles que utilizam menos as redes sociais”.
Do outro lado do Atlântico, no Reino Unido, os resultados revelam-se semelhantes. Um inquérito do Department for Culture, Media and Sport (DCMS), uma ramificação do executivo britânico, citado num artigo publicado pela ProfileTree intitulado “Social Media Isolation Statistics: Is Social Media Making Us Lonely?” (Estatísticas sobre o isolamento nas redes sociais: As redes sociais estão a tornar-nos solitários?, em português), revela que “os jovens (16-24) são mais propensos à solidão (10% frequentemente/sempre solitários) em comparação com os grupos etários mais velhos (3-9% frequentemente/sempre solitários) [ONS – Community Life Survey]”.
O artigo da ProfileTree três causas principais desta sensação de isolamento entre os jovens: o “culto da Persona online cuidadosamente apresentada” – onde “ esta fachada de perfeição cria um padrão irrealista de comparação, levando os outros a sentirem-se inadequados e a acharem que a sua própria vida é insuficiente” -, o “Lado Negro das Interações Sociais: Cyberbullying e exclusão” – que deixam “as vítimas com um sentimento de ostracismo, isolamento e uma diminuição significativa da autoestima” – e a substituição das “interações no mundo real”, uma vez que “a dependência excessiva da comunicação online pode levar a um declínio da interação cara a cara e da capacidade de construir relações significativas no mundo real”.
Ainda assim, e segundo a análise do Regis College anteriormente mencionada, vários estudos “revelaram que a relação entre as redes sociais e o isolamento social é complexa” e que “o isolamento social não pode ser inteiramente atribuído à utilização das redes sociais”. Independentemente desta conclusão, os dados anteriores mostram que, de facto, uma ferramenta que começou por servir para aumentar a conectividade e mitigar o isolamento acaba por ter o reverso da sua medalha, principalmente nas gerações mais jovens que são “filhas” deste novo mundo tecnológico.