Portugal e a Bomba-Relógio Demográfica.


A diminuição da natalidade é uma bomba-relógio para a segurança social portuguesa. E os efeitos desta crise demográfica não se vão fazer sentir só nas próximas décadas, mas também a curto prazo já.


É inevitável não criar preocupação a leitura dos números que o INE apresentou sobre a natalidade em Portugal. Em 2023, a queda acentuada de nascimentos trouxe à tona um problema estrutural que a nível nacional não temos conseguido inverter. Os dados deste estudo recente estimam menos 430 nascimentos que no ano anterior, sendo que o INE indica que a redução destes números poderá ser ainda maior. Estes números, vistos isoladamente, podem parecer marginais até mas representam mais um sinal preocupante de como estamos numa trajetória perigosamente descendente no país.

Se formos rigorosos nestes números, e tivermos a capacidade de sair do óbvio e filtrar conclusões, podemos verificar que o problema se agrava quando dividimos estes números por nascimentos entre filhos de mães portuguesas e mães estrangeiras.

É importante verificar nestes números vindos a público dizem-nos que nos últimos 12 anos já assistimos a uma diminuição de mais de 20 mil nascimentos referentes às mães residentes em Portugal. Paralelamente, ao mesmo tempo, o nascimento de filhos de mães estrangeiras representava, em 2018, 10% do total de nascimentos ao passo que agora, nos números de 2023, já são 22%. Estes números demonstram que o declínio da natalidade nas mães portuguesas é ainda mais acentuado e que os nascimentos estão cada vez mais dependentes da imigração. Pelos números, isto é factual. O impacto é direto na sustentabilidade de setores chave, como sempre chamado a palco nesta altura, a nossa Segurança Social.

A queda na natalidade está também associada ao aumento da pobreza. Dados recentes revelam que a taxa de pobreza aumentou em Portugal, pela primeira vez em sete anos, de 16,4% para 17%. Já a taxa de risco de pobreza entre crianças e jovens é especialmente preocupante, e isto representa uma realidade dura e crua: as famílias mais vulneráveis estão a optar por não ter filhos. E quem pode culpar estas famílias que tomam esta decisão de vida? Com os baixos salários, os elevados custos para suportar habitação e uma sensação generalizada na nossa sociedade de insegurança económica, a decisão de constituir família torna-se um peso insustentável.

Além destes factos, em Portugal, os dados do INE apresentam que mais de um em cada quatro inquilinos gasta pelo menos 40% do seu rendimento com os custos da habitação, energia e serviços básicos, enquanto a média da União Europeia é apenas um quinto. Esta diferença, isoladamente, já é um obstáculo significativo, mas acrescentando a isto o aumento de cerca de 105% no preço das casas nos últimos anos, enquanto os salários cresceram apenas 35% em igual período, estamos a construir um cenário em que a natalidade está cada vez mais fora do alcance da maioria das famílias.

A diminuição da natalidade é uma bomba-relógio para a segurança social portuguesa. E os efeitos desta crise demográfica não se vão fazer sentir só nas próximas décadas, mas também a curto prazo já. As pensões que dependem dos trabalhadores ativos para serem sustentadas vão estar em risco ou fortemente ameaçadas. Atualmente, saibamos, a taxa de substituição (a proporção do rendimento que um pensionista recebe em relação ao seu último salário) já está abaixo dos 80%, e há previsões que apontam para uma redução para 50% nas próximas décadas.

Isto significa que os pensionistas podem ver os seus rendimentos reduzidos em metade. Será que estamos prontos para este cenário e temos sustentabilidade e estratégia para compensar de alguma forma esta quebra?

O Banco de Portugal e a Comissão Europeia já alertaram que a sustentabilidade da Segurança Social está em risco. Estas instituições, que têm um poder de análise inquestionável, já alertaram que se não houver uma resposta clara a estes desafios podemos entrar num caminho sem retorno. Mas, curiosamente, ou não, este tema raramente está no centro dos debates políticos ou corre nas arruadas políticas ou fala aos microfones dos comícios partidários. Falamos de orçamentos, de políticas fiscais, de subsídios, mas esquecemos de abordar uma das questões mais centrais para o futuro do país: a falta de uma política de natalidade robusta e consistente.

Temos, sem vergonha, de aprender e implementar algumas medidas que tenham sido bem-sucedidas noutros países. A França é frequentemente citada como um exemplo positivo nesta matéria. O país liderado por Macron tem presentemente políticas generosas de apoio às famílias, creches subsidiadas e incentivos fiscais para quem tem mais filhos. Se isto foi suficiente não sabemos, mas estas políticas e debate sobre o tema no território francês conseguiu inverter a tendência de queda na natalidade. Isto é um facto que ninguém pode negar. E este não é um caso isolado. Nos Países nórdicos, como na Suécia e na Noruega, investiram os governos de forma consistente em políticas públicas consideradas de apoio à conciliação entre vida pessoal e profissional, permitindo que as famílias possam ter filhos sem comprometer a sua qualidade de vida. Mais tempo, menos corte nos salários, mais igualdade de género e tempo de regresso adaptado à nova vida das famílias com crianças, para além dos apoios de acesso à educação, saúde e cultura para estas famílias.

Já Portugal, por outro lado que não o destes países que podemos referenciar, parece estar preso num ciclo de promessas não cumpridas. A promessa de creches gratuitas, incluída no Plano de Erradicação da Pobreza, continua por concretizar. E, mais do que nunca, este é o momento para enfrentar este desafio de forma direta e assertiva. Tem de existir um sinal político para que o público acredite que algo vai mudar e que as famílias podem ter uma resposta.

É evidente, os números assim o demonstram, que Portugal precisa de uma estratégia sólida para enfrentar a sua crise demográfica. Não podemos continuar a adiar este tema e o seu debate político enquanto o relógio continua a contar. Se queremos garantir a sustentabilidade da segurança social, a qualidade de vida das famílias e o crescimento económico, é urgente que os responsáveis políticos coloquem a natalidade no centro da agenda.

Afinal, como já dizia um velho ditado, “se plantarmos hoje, colheremos amanhã”. Que políticas de natalidade estamos a plantar?

Portugal e a Bomba-Relógio Demográfica.


A diminuição da natalidade é uma bomba-relógio para a segurança social portuguesa. E os efeitos desta crise demográfica não se vão fazer sentir só nas próximas décadas, mas também a curto prazo já.


É inevitável não criar preocupação a leitura dos números que o INE apresentou sobre a natalidade em Portugal. Em 2023, a queda acentuada de nascimentos trouxe à tona um problema estrutural que a nível nacional não temos conseguido inverter. Os dados deste estudo recente estimam menos 430 nascimentos que no ano anterior, sendo que o INE indica que a redução destes números poderá ser ainda maior. Estes números, vistos isoladamente, podem parecer marginais até mas representam mais um sinal preocupante de como estamos numa trajetória perigosamente descendente no país.

Se formos rigorosos nestes números, e tivermos a capacidade de sair do óbvio e filtrar conclusões, podemos verificar que o problema se agrava quando dividimos estes números por nascimentos entre filhos de mães portuguesas e mães estrangeiras.

É importante verificar nestes números vindos a público dizem-nos que nos últimos 12 anos já assistimos a uma diminuição de mais de 20 mil nascimentos referentes às mães residentes em Portugal. Paralelamente, ao mesmo tempo, o nascimento de filhos de mães estrangeiras representava, em 2018, 10% do total de nascimentos ao passo que agora, nos números de 2023, já são 22%. Estes números demonstram que o declínio da natalidade nas mães portuguesas é ainda mais acentuado e que os nascimentos estão cada vez mais dependentes da imigração. Pelos números, isto é factual. O impacto é direto na sustentabilidade de setores chave, como sempre chamado a palco nesta altura, a nossa Segurança Social.

A queda na natalidade está também associada ao aumento da pobreza. Dados recentes revelam que a taxa de pobreza aumentou em Portugal, pela primeira vez em sete anos, de 16,4% para 17%. Já a taxa de risco de pobreza entre crianças e jovens é especialmente preocupante, e isto representa uma realidade dura e crua: as famílias mais vulneráveis estão a optar por não ter filhos. E quem pode culpar estas famílias que tomam esta decisão de vida? Com os baixos salários, os elevados custos para suportar habitação e uma sensação generalizada na nossa sociedade de insegurança económica, a decisão de constituir família torna-se um peso insustentável.

Além destes factos, em Portugal, os dados do INE apresentam que mais de um em cada quatro inquilinos gasta pelo menos 40% do seu rendimento com os custos da habitação, energia e serviços básicos, enquanto a média da União Europeia é apenas um quinto. Esta diferença, isoladamente, já é um obstáculo significativo, mas acrescentando a isto o aumento de cerca de 105% no preço das casas nos últimos anos, enquanto os salários cresceram apenas 35% em igual período, estamos a construir um cenário em que a natalidade está cada vez mais fora do alcance da maioria das famílias.

A diminuição da natalidade é uma bomba-relógio para a segurança social portuguesa. E os efeitos desta crise demográfica não se vão fazer sentir só nas próximas décadas, mas também a curto prazo já. As pensões que dependem dos trabalhadores ativos para serem sustentadas vão estar em risco ou fortemente ameaçadas. Atualmente, saibamos, a taxa de substituição (a proporção do rendimento que um pensionista recebe em relação ao seu último salário) já está abaixo dos 80%, e há previsões que apontam para uma redução para 50% nas próximas décadas.

Isto significa que os pensionistas podem ver os seus rendimentos reduzidos em metade. Será que estamos prontos para este cenário e temos sustentabilidade e estratégia para compensar de alguma forma esta quebra?

O Banco de Portugal e a Comissão Europeia já alertaram que a sustentabilidade da Segurança Social está em risco. Estas instituições, que têm um poder de análise inquestionável, já alertaram que se não houver uma resposta clara a estes desafios podemos entrar num caminho sem retorno. Mas, curiosamente, ou não, este tema raramente está no centro dos debates políticos ou corre nas arruadas políticas ou fala aos microfones dos comícios partidários. Falamos de orçamentos, de políticas fiscais, de subsídios, mas esquecemos de abordar uma das questões mais centrais para o futuro do país: a falta de uma política de natalidade robusta e consistente.

Temos, sem vergonha, de aprender e implementar algumas medidas que tenham sido bem-sucedidas noutros países. A França é frequentemente citada como um exemplo positivo nesta matéria. O país liderado por Macron tem presentemente políticas generosas de apoio às famílias, creches subsidiadas e incentivos fiscais para quem tem mais filhos. Se isto foi suficiente não sabemos, mas estas políticas e debate sobre o tema no território francês conseguiu inverter a tendência de queda na natalidade. Isto é um facto que ninguém pode negar. E este não é um caso isolado. Nos Países nórdicos, como na Suécia e na Noruega, investiram os governos de forma consistente em políticas públicas consideradas de apoio à conciliação entre vida pessoal e profissional, permitindo que as famílias possam ter filhos sem comprometer a sua qualidade de vida. Mais tempo, menos corte nos salários, mais igualdade de género e tempo de regresso adaptado à nova vida das famílias com crianças, para além dos apoios de acesso à educação, saúde e cultura para estas famílias.

Já Portugal, por outro lado que não o destes países que podemos referenciar, parece estar preso num ciclo de promessas não cumpridas. A promessa de creches gratuitas, incluída no Plano de Erradicação da Pobreza, continua por concretizar. E, mais do que nunca, este é o momento para enfrentar este desafio de forma direta e assertiva. Tem de existir um sinal político para que o público acredite que algo vai mudar e que as famílias podem ter uma resposta.

É evidente, os números assim o demonstram, que Portugal precisa de uma estratégia sólida para enfrentar a sua crise demográfica. Não podemos continuar a adiar este tema e o seu debate político enquanto o relógio continua a contar. Se queremos garantir a sustentabilidade da segurança social, a qualidade de vida das famílias e o crescimento económico, é urgente que os responsáveis políticos coloquem a natalidade no centro da agenda.

Afinal, como já dizia um velho ditado, “se plantarmos hoje, colheremos amanhã”. Que políticas de natalidade estamos a plantar?