Montenegro soma pontos


A sua afirmação passa por falar pouco, no momento certo, não hesitando em usar a sebenta de António Costa. 


Nota prévia: Nos últimos dias, descobriu-se mais uma burla financeira baseada no sistema da pirâmide em que uns angariam dinheiro fresco para pagar a si próprios e aos que estão no topo. Desta vez, o esquema não tinha a aparência do grupo do magnata judeu americano Madoff, nem a pinderiquice da nossa Dona Branca, mas o princípio era o mesmo. A coisa chamava-se OmegaPro, apresentando-se com glamour, festas e grandes nomes do futebol que nada terão a ver com a burla que atingiu 3 milhões de pessoas desejosas de ganhar milhares sentadas no sofá. Há, porém, um facto ineludível. Estas grandes referências mundiais do desporto e do espetáculo sabem que arrastam multidões. São pessoas que têm milhões e que são aconselhadas por financeiros profissionais. É, portanto, lamentável que desprezem a sua responsabilidade social ao apoiarem jogadas financeiras que prometem lucros até 300%, em 16 meses, ainda por cima em operações baseadas em criptomoedas. Não se imagina, por exemplo, Ronaldo a associar a imagem a habilidades desse género. Uma coisa é publicitar um champô, um carro, um chocolate ou, no limite, um banco como fizeram intelectuais da nossa praça ao escreverem para o funesto BPP, no Expresso, sobre a relação com o dinheiro. Outra, é aliciar para investimentos financeiros altamente duvidosos. Era interessante saber se alguma das vedetas da bola contratadas colocou um tostão naquele produto ou perdeu umas horas de sono com o caso OmegaPro, cujos autores andam algures a gozar a fortuna acumulada à conta de pacóvios gulosos.

1. Apesar da instabilidade agravada no caso da Saúde, onde já nada disfarça a degradação, Luís Montenegro marca pontos na política. Descontando o anúncio um tanto demagógico de futuras novas faculdades de medicina, vê-se a sua eficácia com a forma como o primeiro-ministro tem atendido as reivindicações das grandes corporações profissionais do nosso gigantesco Estado. A rentrée do Pontal foi outro exemplo. Montenegro nem sequer inovou. Pessoa de poucas falas quotidianas, pegou na sebenta de António Costa e aplicou a receita. Sacou de um prémio aos pensionistas menos abonados que vai de 100 a 200 euros, a pagar em outubro, prometendo que fará o mesmo no ano que vem, se tal for possível. Escusado será dizer que a medida é altamente apreciada, deixando entaladas as oposições ao dificultar-lhes ainda mais a rejeição do próximo Orçamento do Estado do qual nem sequer falou. Brilhante! Psicologicamente, um bónus tem um efeito que os mais necessitados recordarão, tipo raspadinha premiada. Contestar uma medida destas é suicidário politicamente. O facto, porém, é que ela se dirige às centenas de milhares que pouco descontaram, ganharam pouco, não trabalharam ou não fizeram um percurso contributivo normal. Há certamente muitas situações justas nesta ajuda, mas também é preciso ver que há uma franja gigantesca da população que acumula benesses e apoios sociais cada vez maiores, enquanto a classe média e média alta (o que significa 3 mil euros brutos entre nós) é cada vez mais flagelada pelos impostos e aumento do custo de vida. É nesse grupo que estão os “paganini” cá do sítio. Sobre eles recaem todas as obrigações e penalizações, apesar de serem quem gera a pouca riqueza que temos. Em Portugal, desde o cavaquismo que não há uma política dirigida à classe média, que lhe permita progredir, melhorar e ter perspetivas de uma vida futura mais confortável. Não admira que, uma vez formados, os filhos dessa gente emigrem em massa para não mais voltar. E também não surpreende que os mais dinâmicos da nossa sociedade façam dinheiro aos montes em negócios rápidos ou coloquem tudo o que ganham em custos de empresas. Luís Montenegro sabe isso melhor do que ninguém. Mas também sabe a quem deve agradar para se consolidar. Na política, as mudanças de fundo, em regra, não dão votos, enquanto as fogachadas rendem logo. A opção de fazer um governo minoritário obriga a abdicar de grandes reformas e impõe medidas pontuais de tipo bónus. Esta rentrée foi simbólica nesse aspeto. Evidenciou que é prioritário agradar aos principais núcleos eleitorais como a função publica, as corporações e os pensionistas dos escalões mais baixos. Até porque estamos a entrar num ciclo em que teremos rapidamente (em finais de 2025 e início de 2026) eleições autárquicas (cada vez mais determinantes em termos nacionais) e presidenciais. Também há que estar sempre preparado para legislativas antecipadas, a menos que Montenegro consiga construir uma imagem de força que iniba as oposições de o derrubar. Os anúncios do Pontal foram um passo da estratégia de consolidação de curto prazo. Pensar à distância em Portugal é praticamente impossível. Os nossos principais dirigentes não têm uma dimensão política patriótica e visionária do futuro. Nem sequer para as obras públicas, quanto mais para as reformas do Estado na Saúde, na Justiça, na Educação e na Defesa, para citar apenas quatro exemplos.

2. Ainda no Pontal, Montenegro anunciou um miraculoso passe de 20 euros mensais que dará para quase todos os comboios. A medida não é nova. Já existia no tempo do PS por 49 euros e foi um rotundo fracasso. É um passo para a inevitabilidade de tornar praticamente gratuitos os transportes públicos e as deslocações entre cidades, seguindo o modelo ecológico de muitos países europeus. Terá de se medir o impacto com o passar do tempo. Mas uma coisa é provável. Para já, com o estado em que o PS deixou a ferrovia, com os atrasos sistemáticos, com a falta de qualidade e de higiene das composições e com os sucessivos recordes de greves, é duvidoso que haja milhares de utentes a precipitarem-se aos encontrões para as bilheteiras para aproveitar os saldos desta benfeitoria. A CP nunca é solução para nada em Portugal. Para ajudar a mobilidade, era melhor começar por extingui-la.

3. Depois de ter levado quatro anos a ser instalada em Coimbra, a Entidade para a Transparência começou a trabalhar e logo perverteu uma das razões da sua criação, o que não deixa de ser tipicamente português. Até há pouco, quando um jornalista pretendia tomar conhecimento dos rendimentos e património de políticos, solicitava esses elementos, que eram logo entregues, desde que eles tivessem sido comunicados. Agora já não é assim. A entidade tem o topete de querer saber qual o propósito dos jornalistas. Exigências desta natureza remetem para aquele tipo de ditaduras socialistas onde tudo está consagrado em termos de liberdade, mas nas quais a burocracia e os poderes estabelecidos alimentam a opacidade. Esses tiques existiam também na sociedade portuguesa até ao 25 de Abril. Nos últimos anos, já nem se chamava censura. Marcelo Caetano acabou com ela. Chamou-lhe exame prévio. Deixou escola, pelos vistos.

4. Os recentes Jogos Olímpicos bateram recordes mundiais de audiência televisiva. A RTP esteve bem ao transmitir 200 horas, em geral comentadas com competência (a notável sapiência do comentador de atletismo não o dispensa de um curso de dicção e de acompanhamento das imagens). Mas adiante. O grande triunfo mediático chamou-se Eurosport. Multiplicando a oferta de canais durante os jogos, esta gigantesca cadeia permitiu que se acompanhassem modalidades que não têm exposição, mas que são espetaculares. Isto, para além de ir aos momentos cruciais de outras que são âncoras tradicionais dos jogos, como os desportos aquáticos e a ginástica. A Eurosport há muito que percebeu que há mais mundo no desporto para além do futebol. Mostrou-o como nunca nos jogos de Paris. Um esforço gigantesco e meritório. Medalha de Ouro!

Montenegro soma pontos


A sua afirmação passa por falar pouco, no momento certo, não hesitando em usar a sebenta de António Costa. 


Nota prévia: Nos últimos dias, descobriu-se mais uma burla financeira baseada no sistema da pirâmide em que uns angariam dinheiro fresco para pagar a si próprios e aos que estão no topo. Desta vez, o esquema não tinha a aparência do grupo do magnata judeu americano Madoff, nem a pinderiquice da nossa Dona Branca, mas o princípio era o mesmo. A coisa chamava-se OmegaPro, apresentando-se com glamour, festas e grandes nomes do futebol que nada terão a ver com a burla que atingiu 3 milhões de pessoas desejosas de ganhar milhares sentadas no sofá. Há, porém, um facto ineludível. Estas grandes referências mundiais do desporto e do espetáculo sabem que arrastam multidões. São pessoas que têm milhões e que são aconselhadas por financeiros profissionais. É, portanto, lamentável que desprezem a sua responsabilidade social ao apoiarem jogadas financeiras que prometem lucros até 300%, em 16 meses, ainda por cima em operações baseadas em criptomoedas. Não se imagina, por exemplo, Ronaldo a associar a imagem a habilidades desse género. Uma coisa é publicitar um champô, um carro, um chocolate ou, no limite, um banco como fizeram intelectuais da nossa praça ao escreverem para o funesto BPP, no Expresso, sobre a relação com o dinheiro. Outra, é aliciar para investimentos financeiros altamente duvidosos. Era interessante saber se alguma das vedetas da bola contratadas colocou um tostão naquele produto ou perdeu umas horas de sono com o caso OmegaPro, cujos autores andam algures a gozar a fortuna acumulada à conta de pacóvios gulosos.

1. Apesar da instabilidade agravada no caso da Saúde, onde já nada disfarça a degradação, Luís Montenegro marca pontos na política. Descontando o anúncio um tanto demagógico de futuras novas faculdades de medicina, vê-se a sua eficácia com a forma como o primeiro-ministro tem atendido as reivindicações das grandes corporações profissionais do nosso gigantesco Estado. A rentrée do Pontal foi outro exemplo. Montenegro nem sequer inovou. Pessoa de poucas falas quotidianas, pegou na sebenta de António Costa e aplicou a receita. Sacou de um prémio aos pensionistas menos abonados que vai de 100 a 200 euros, a pagar em outubro, prometendo que fará o mesmo no ano que vem, se tal for possível. Escusado será dizer que a medida é altamente apreciada, deixando entaladas as oposições ao dificultar-lhes ainda mais a rejeição do próximo Orçamento do Estado do qual nem sequer falou. Brilhante! Psicologicamente, um bónus tem um efeito que os mais necessitados recordarão, tipo raspadinha premiada. Contestar uma medida destas é suicidário politicamente. O facto, porém, é que ela se dirige às centenas de milhares que pouco descontaram, ganharam pouco, não trabalharam ou não fizeram um percurso contributivo normal. Há certamente muitas situações justas nesta ajuda, mas também é preciso ver que há uma franja gigantesca da população que acumula benesses e apoios sociais cada vez maiores, enquanto a classe média e média alta (o que significa 3 mil euros brutos entre nós) é cada vez mais flagelada pelos impostos e aumento do custo de vida. É nesse grupo que estão os “paganini” cá do sítio. Sobre eles recaem todas as obrigações e penalizações, apesar de serem quem gera a pouca riqueza que temos. Em Portugal, desde o cavaquismo que não há uma política dirigida à classe média, que lhe permita progredir, melhorar e ter perspetivas de uma vida futura mais confortável. Não admira que, uma vez formados, os filhos dessa gente emigrem em massa para não mais voltar. E também não surpreende que os mais dinâmicos da nossa sociedade façam dinheiro aos montes em negócios rápidos ou coloquem tudo o que ganham em custos de empresas. Luís Montenegro sabe isso melhor do que ninguém. Mas também sabe a quem deve agradar para se consolidar. Na política, as mudanças de fundo, em regra, não dão votos, enquanto as fogachadas rendem logo. A opção de fazer um governo minoritário obriga a abdicar de grandes reformas e impõe medidas pontuais de tipo bónus. Esta rentrée foi simbólica nesse aspeto. Evidenciou que é prioritário agradar aos principais núcleos eleitorais como a função publica, as corporações e os pensionistas dos escalões mais baixos. Até porque estamos a entrar num ciclo em que teremos rapidamente (em finais de 2025 e início de 2026) eleições autárquicas (cada vez mais determinantes em termos nacionais) e presidenciais. Também há que estar sempre preparado para legislativas antecipadas, a menos que Montenegro consiga construir uma imagem de força que iniba as oposições de o derrubar. Os anúncios do Pontal foram um passo da estratégia de consolidação de curto prazo. Pensar à distância em Portugal é praticamente impossível. Os nossos principais dirigentes não têm uma dimensão política patriótica e visionária do futuro. Nem sequer para as obras públicas, quanto mais para as reformas do Estado na Saúde, na Justiça, na Educação e na Defesa, para citar apenas quatro exemplos.

2. Ainda no Pontal, Montenegro anunciou um miraculoso passe de 20 euros mensais que dará para quase todos os comboios. A medida não é nova. Já existia no tempo do PS por 49 euros e foi um rotundo fracasso. É um passo para a inevitabilidade de tornar praticamente gratuitos os transportes públicos e as deslocações entre cidades, seguindo o modelo ecológico de muitos países europeus. Terá de se medir o impacto com o passar do tempo. Mas uma coisa é provável. Para já, com o estado em que o PS deixou a ferrovia, com os atrasos sistemáticos, com a falta de qualidade e de higiene das composições e com os sucessivos recordes de greves, é duvidoso que haja milhares de utentes a precipitarem-se aos encontrões para as bilheteiras para aproveitar os saldos desta benfeitoria. A CP nunca é solução para nada em Portugal. Para ajudar a mobilidade, era melhor começar por extingui-la.

3. Depois de ter levado quatro anos a ser instalada em Coimbra, a Entidade para a Transparência começou a trabalhar e logo perverteu uma das razões da sua criação, o que não deixa de ser tipicamente português. Até há pouco, quando um jornalista pretendia tomar conhecimento dos rendimentos e património de políticos, solicitava esses elementos, que eram logo entregues, desde que eles tivessem sido comunicados. Agora já não é assim. A entidade tem o topete de querer saber qual o propósito dos jornalistas. Exigências desta natureza remetem para aquele tipo de ditaduras socialistas onde tudo está consagrado em termos de liberdade, mas nas quais a burocracia e os poderes estabelecidos alimentam a opacidade. Esses tiques existiam também na sociedade portuguesa até ao 25 de Abril. Nos últimos anos, já nem se chamava censura. Marcelo Caetano acabou com ela. Chamou-lhe exame prévio. Deixou escola, pelos vistos.

4. Os recentes Jogos Olímpicos bateram recordes mundiais de audiência televisiva. A RTP esteve bem ao transmitir 200 horas, em geral comentadas com competência (a notável sapiência do comentador de atletismo não o dispensa de um curso de dicção e de acompanhamento das imagens). Mas adiante. O grande triunfo mediático chamou-se Eurosport. Multiplicando a oferta de canais durante os jogos, esta gigantesca cadeia permitiu que se acompanhassem modalidades que não têm exposição, mas que são espetaculares. Isto, para além de ir aos momentos cruciais de outras que são âncoras tradicionais dos jogos, como os desportos aquáticos e a ginástica. A Eurosport há muito que percebeu que há mais mundo no desporto para além do futebol. Mostrou-o como nunca nos jogos de Paris. Um esforço gigantesco e meritório. Medalha de Ouro!