Vivemos uma nova corrida espacial com a chegada do Japão à Lua?

Vivemos uma nova corrida espacial com a chegada do Japão à Lua?


Com alguns percalços e incerteza pelo meio, o módulo SLIM acabou por alunar quatro meses depois de a missão descolar de Tanegashima. O Japão junta-se assim ao clube restrito das potências que já pousaram no satélite natural da Terra. A corrida ao espaço está a aquecer e a ganhar novos protagonistas


No passado dia 19, o Japão entrou para a elite espacial ao fazer pousar uma sonda na Lua. Ainda que com alguns contratempos pelo meio, os nipónicos tornam-se o quinto país a chegar ao satélite natural da Terra, depois dos Estados Unidos, da Índia, da China e da já extinta União Soviética.

O projeto – que não contou com tripulação humana no vaivém espacial – faz parte de um processo que tem como objetivo voltar a colocar o Homem na Lua, mais de cinco décadas depois de Neil Amstrong e Buzz Aldrin terem cravado a bandeira norte-americana em solo lunar, em 1969. A missão vem na sequência da chegada à Lua por parte da Índia e num momento em que a NASA anunciou o adiamento das missões Artemis, previstas para novembro deste ano, para os próximos dois anos. 

O SLIM

Smart Lander for Investigating Moon (SLIM) foi o nome escolhido para a sonda japonesa, desenhada ao pormenor para realizar aterragens de elevada precisão em solo lunar. O aparelho, leve e de pequena dimensão, servirá também para a realização de estudos em ambientes com baixa intensidade gravitacional, fundamentais para estudar de forma mais aprofundada o restante Sistema Solar, como informa a Agência de Exploração Aeroespacial do Japão (JAXA). «A exploração da ciência solar futura exigirá o nível de precisão de navegação que a JAXA está a procurar através da missão SLIM. Como o conhecimento científico é construído através do objeto de estudo, mais pesquisas específicas serão necessárias. Colocar uma sonda de precisão facilita a experiência», afirmou a Agência japonesa.

O SLIM descolou da superfície terrestre no dia 6 de setembro do ano passado, e a demora até à superfície da Lua é explicada pelo trajeto definido: uma órbita terrestre baixa inicialmente, em conjunto com o observatório XRISM X-Ray, um satélite que observa o plasma nas estrelas e nas galáxias.

O contratempo

Ainda que a alunagem tenha sido suave e precisa – apoiada por um sistema de propulsores que funciona à base de Inteligência Artificial –, o SLIM sofreu um contratempo que, segundo previsões de especialistas, irá encurtar a sua passagem pela Lua. Os painéis solares apresentaram um problema e teme-se que a bateria da sonda espacial se esgote rapidamente. Pedro Pallotta, um especialista aeroespacial brasileiro, disse, na CNN, que houve até um momento de susto em que o SLIM «parou de comunicar e não tínhamos a certeza se tinha tombado ou não. A primeira coisa que vimos foi que as baterias começaram a perder carga, não subindo por causa [da falha] dos painéis solares. […] Pousou num local inclinado onde já era difícil de pousar, então depois de algumas horas, a própria JAXA fez uma conferência de imprensa em que explicou que pousou, o que já foi um grande alívio. […] Os painéis solares são apoiados, não são dobráveis, com vários outros projetos são. […] Pode ser instalação incorreta ou algum tipo de conexão que foi danificada durante a trajetória para a Lua».

A nova corrida espacial

Diferente da primeira, durante a Guerra Fria, em que duas superpotências se digladiavam pela conquista do espaço, e em particular da Lua, a nova corrida espacial emerge num contexto geopolítico diferente, instável e de geometria variável. Com mais atores em cena e cada vez mais perto de uma ordem internacional multipolar consolidada, as superpotências e as potências emergentes disputam não só o prestígio e a vanguarda aeroespacial, mas também uma série de fatores económicos e de exploração de uma nova forma de encarar o espaço. Tendo ocorrido já várias experiências e viagens empreendidas por vários multimilionários, a gestora do programa comercial de órbita terrestre baixa da NASA, Angela Hart, garantiu à DW News que «o objetivo é reduzir os preços para que seja um destino de férias, queremos que as pessoas vivam e trabalhem no espaço».

NASA em modo de pausa

Com anúncio da NASA, que adia a missão Artemis II e III por 1 e 2 anos, o projeto de voltar a levar o homem à Lua vai ter de esperar. Esta operação, prevista para novembro deste ano, seria a primeira, em várias décadas, que planeava um regresso humano ao solo lunar. Segundo o comunicado, uma passagem perto da Lua ficará para 2025, e uma alunagem já só mesmo em 2026. Na origem do adiamento estarão questões de segurança: «Para levar a cabo estas missões, os líderes da agência estão a ajustar as datas para a Artemis II e para a Artemis III para permitir às equipas trabalhar nos desafios associados aos desenvolvimentos, operações e integrações sem precedentes», explica a nota oficial da agência espacial norte-americana. Os problemas estarão associados com defeitos nas baterias e nos aparelhos de ventilação do ar e de controlo de temperatura. Também o Mobile Launcher 1, o sistema que impulsionará o foguete de enorme dimensão, «apresentou mais danos do que o esperado».

A primeira missão, a Artemis II, vem na sequência da bem-sucedida missão Artemis I, em 2022, responsável pelo voo de teste não tripulado que colocou a cápsula Orion à volta da Lua. Os astronautas que integrarão a Artemis II já foram selecionados: Reid Wiseman, Victor Glover, Christina Koch e Jeremy Hansen. Apenas o último, da Agência Espacial Canadiana, não faz parte dos quadros da NASA.

Cada vez mais, o espaço tem assumido preponderância na vida terrestre, e irá, sem dúvida, alterar a forma com as nações se relacionam. Além de já sentirmos os efeitos, através de formas de comunicação e de fatores económicos, o espaço será indissociável da política internacional e da vida quotidiana em si nas próximas décadas. A eficácia dos avanços tecnológicos determinará se será mais cedo ou mais tarde.