Cooperação Económica da Ásia-Pacífico. Xi nos EUA: Um degelo fracassado?

Cooperação Económica da Ásia-Pacífico. Xi nos EUA: Um degelo fracassado?


Líder chinês regressa aos EUA  seis anos depois. Após reunião bilateral, Biden volta a chamar ‘ditador’ a Xi Jinping.


O líder chinês, Xi Jinping, está de volta a solo americano, seis anos após a última visita. Com uma agenda preenchida – focada na Cimeira entre os 21 membros da Cooperação Económica da Ásia-Pacífico –, o Presidente da China reuniu-se  com o seu homólogo americano, Joe Biden, assinalando o primeiro encontro de alto nível entre os dois países desde novembro do ano passado. É certo que a cooperação e entendimento entre as duas principais potências mundiais são imperativos básicos para a manutenção da tranquilidade geopolítica, numa ordem que se tem caracterizado pela sua geometria variável. No último ano, a relação bilateral atravessou um dos pontos mais baixos, mas as últimas declarações, marcadas pela necessidade de um entendimento, eram animadoras.

 

O papel de Newsom e o possível ticket presidencial para 2028

Gavin Newsom, o governador da Califórnia e uma das principais figuras do atual Partido Democrático, assume nesta visita presidencial um papel de relevo – polémico também – e que não se deve subestimar. Newsom tem emergido no cenário político americano, principalmente pelo carisma e pela relação que tem tido com os chineses, tendo feito uma visita a Pequim recentemente. É visto como sucessor de Biden e foi até considerado uma alternativa já para 2024, o que caiu por terra quando apoiou a candidatura do atual Presidente. A sua capacidade para organizar a receção ao líder chinês tem sido simultaneamente louvada e criticada: a rapidez com que fez desaparecer sem-abrigos das ruas, realocando-os em residências e hotéis levanta questões sérias de indiferença por parte da sua administração, tendo o próprio assumido que se deveu apenas à visita de Xi, afirmando: «Quando se recebem visitas temos de limpar a casa». A afirmação fez despertar os críticos, principalmente os naturais de São Francisco. Ainda assim, e com o aumento da relevância desta figura política no seio democrata, não é descabido colocar a hipótese de que será o próximo candidato democrata.

 

Balões, Taiwan e a aproximação

O programa de lançamento de balões levado a cabo pelo Governo chinês – com objetivos de espionagem, segundo a Casa Branca – foi o principal entrave da relação diplomática Washington-Pequim em 2023. Taiwan é também um tema delicado, uma ferida profunda da relação, mas com o equilibro entre Estados numa posição frágil, parece (ou parecia) que os dois principais atores internacionais chegaram à conclusão que as constantes tensões – e no pior dos cenários o conflito – se revelariam insustentáveis e aprofundariam cisões globais. O prolongar do conflito na Ucrânia e a eclosão da guerra no Médio Oriente foram também temas destacados.

Na reunião de quarta-feira, em São Francisco, Biden e Xi adotaram atitudes semelhantes, com base no desanuviamento, focando-se no diálogo e na cooperação. Sobressaíram declarações como «é importante que nos entendamos, líder para líder, sem más interpretações» e «a competição não deve acabar em conflito», palavras de Joe Biden. Xi realçou a importância da relação bilateral, considerando-a «a mais importante do mundo» e reiterou o papel fundamental da cooperação: «O conflito teria consequências insuportáveis para ambos os lados». Durante o encontro foi também sublinhada a possibilidade do sucesso simultâneo, independentemente das diferenças de fundo entre os dois regimes.

 

O passo atrás de Biden

Num clima de esperança e otimismo e na sequência de declarações animadoras, Joe Biden pode ter dado um passo atrás nesta tentativa de degelo diplomático. Na quinta-feira, em declarações à imprensa, o líder americano protagonizou um episódio polémico – com potencial para se revelar um incidente diplomático de relevo – ao chamar «ditador» a Xi Jinping. Esta posição é incompatível com a tentativa de aliviar as tensões e antagónica face à tomada no dia anterior, passando de «nem sempre concordamos, mas os nossos encontros são sempre produtivos» a «ele [Xi] é um ditador na medida em que lidera um país comunista que assenta numa forma de governo totalmente diferente da nossa». A mudança brusca de posição – fugindo do realismo e entrando numa vertente mais idealista – e por muito que se duvide do caráter do sistema chinês, se constitui ou não uma ameaça à ordem internacional liberal, é sempre pouco abonatória para o objetivo da visita de Xi Jinping.