No mundo desenvolvido a educação é vista como um direito humano, e um fator de equidade, paz e desenvolvimento sustentável de uma sociedade. Até há poucos anos, tínhamos a Google, a Wikipedia e algumas outras ferramentas menos poderosas como uma fonte possível de informação para análise exploratória de temas e tópicos, e não estava ainda harmonizada a ideia de estas fontes de informação serem consideradas válidas no âmbito educacional e científico, assistindo-se com frequência a discussões relativamente à legitimidade do seu uso em trabalhos académicos.
Porém, como bem sabemos, vivemos numa sociedade que corre atrás do amanhã, em tudo, tendências, modas, tecnologia, etc. Assim, chegamos subitamente a uma nova e ainda mais poderosa ferramenta, o ChatGPT, quando muitos dos nossos educadores e investigadores não são ainda proficientes a utilizar as anteriores. Parece-me óbvio que a utilização de todos estes novos meios exige uma formação sistemática de docentes, nos vários níveis de educação, para que se possa tirar o melhor partido destes instrumentos, mas assegurando que são utilizados da forma mais adequada para os diferentes níveis de educação. Sem uma abordagem minimamente organizada, é provável que não se obtenham os melhores benefícios.
Não deveria por isso ser deixado a cada docente a decisão de utilizar ou não estas ferramentas. Necessitamos de orientações baseadas em reflexão pedagógica, para não deixar os resultados nas mãos do acaso e/ou do voluntarismo dos mais inovadores ou da resistência dos mais conservadores.
O ChatGPT é um modelo de linguagem que permite interagir com um computador de uma forma humanizada e informal, não requerendo conhecimentos profundos de informática. Isto é conseguido através de Inteligência Artificial, mais precisamente por técnicas de “machine learning” – o acrónimo GPT significa “Generative Pre-trained Transformer”. Os algoritmos são treinados com grandes conjuntos de dados e textos, que permitem respostas sobre dados, análises, até mesmo opiniões.
De salientar que a qualidade e quantidade das fontes condicionam a proficiência do instrumento. A versão gratuita do ChatGPT, acessível por qualquer utilizador, foi treinada com textos e dados disponíveis até 2021. Questões que requeiram conhecimento posterior a essa data vão obter respostas que não são confiáveis. Portanto, as respostas do Chat podem ser verdadeiras ou falsas, certas ou erradas, o que exige que o utilizador tenha capacidade de validar as mesmas, caso contrário poderá ser induzido em erro.
É inevitável que esta ferramenta, totalmente disponível, vai ser usada por qualquer estudante em qualquer nível, e podemos ser ingenuamente otimistas e afirmar que vai permitir saltos quânticos de conhecimento. Mas uma reflexão um pouco mais aprofundada leva-nos a questionar se não é necessário assegurar uma certa progressão do conhecimento para consolidar competências e capacidades profissionais, e aí torna-se evidente que é necessário encontrar formas de assegurar essa progressão.
Em Abril deste ano, a UNESCO, a agência das Nações Unidas especializada na educação, reconhecendo o potencial desta ferramenta na educação, quer como oportunidade quer como risco, publicou um breve documento, a que chamou guião, sintetizando as principais utilizações que o ChatGPT pode ter na educação superior e na investigação, e são muitas, e também elencando as questões que estão a ser objecto de discussão em vários países.
Em alguns países, a decisão foi proibir a sua utilização, com argumentos diversos sobre os impactos negativos sobre o processo de aprendizagem e a criatividade que lhe deve estar associada, noutros a posição é mais favorável, com algumas reservas. Não há respostas definitivas, o que é expectável, pois não há ainda experiência acumulada, sendo certo que um número considerável de países analisa as oportunidades que esta ferramenta oferece e como pode ser integrada no sistema de educação.
Esta atitude de análise e reflexão faz toda a diferença e distingue os países mais inovadores, que pretendem ser liderantes na oferta educacional, daqueles que serão apenas seguidores tardios.
Muito se fala em Portugal de inovação, de digitalização, até mesmo de inteligência artificial, mas muito pouco se faz com o propósito de efetivamente introduzir mudança e modernização sistemática nos nossos sistemas de educação e de investigação. As ações existentes são tipicamente dispersas e pontuais, normalmente iniciadas pelas escolas e setores mais vocalionados para a tecnologia, mas numa total ausência de estratégia nacional. O fio condutor é quase sempre o voluntarismo, e isso também faz toda a diferença quando estamos perante uma tecnologia de grande potencial, onde seguramente iremos assistir a uma forte adesão em Portugal.
Se quisermos aproveitar as oportunidades que estas tecnologias podem trazer aos nossos sistemas de ensino e investigação, temos de atuar de forma consequente e analítica. Voluntarismo não vai chegar.