A qualidade da gestão pública e o intrínseco respeito pelo contribuinte, individual e coletivo, são funcionalidades muito positivamente correlacionadas. Quer isto dizer que maior qualidade na gestão pública é sinal de maior respeito pelo contribuinte, enquanto o inverso ao inverso corresponde.
A verdade é que existe uma frágil avaliação e respectiva comunicação quanto à qualidade da gestão pública.
Um pequeno e quase insignificante exemplo: Faz semanas que aguardo que a CML me envie as plantas de um imóvel do qual sou proprietário. São semanas para que me seja entregue um documento que me pertence e sem o qual não posso projetar o que necessito projetar. Semanas para que um documento digitalizado e guardado numa base de dados digital seja enviado. Nos tempos que correm, deixar alguém, digitalmente em espera mais do que 24 horas, constitui uma afronta às boas regras de civismo e respeito. Ter de esperar semanas por um simples documento é evidente sinal de mau funcionamento. Constitui sinal de má gestão, muito má gestão. Constitui sinal de falta de respeito pelo contribuinte, pelo munícipe. O mesmo se passa em muitas outras situações que diariamente se vivem, no que à gestão da limpeza, da segurança e da habitação municipal diz respeito. Má gestão que não é devidamente noticiada pela comunicação social e que é escamoteada pela fabulosa e dispendiosa capacidade de organizar eventos festivos.
Refiro a CML por ser o exemplo mais recente que tenho e, adicionalmente, porque o seu atual presidente vive um estado de graça fruto não do trabalho a favor da qualidade de vida do munícipe, mas antes pela organização de um mega evento, no qual as responsabilidades foram partilhadas por um conjunto muito alargado de instituições e organismos. O que se passa na CML constitui, infelizmente, prática demasiado corrente numa parte bem significativa das câmaras do país e numa parte não menos significativa dos organismos públicos. A justiça de proximidade nesta relação de direito, não é favorável aos contribuintes, aos munícipes, ao eleitor, nem ao cidadão em geral.
É evidente que esta forma, bem socialista de gerir a causa pública, já contaminou outros setores políticos que se deixam atrair pela popularidade que as festas, os eventos e os grande acontecimentos proporcionam, relegando para plano muito secundário o essencial do quotidiano. Faz lembrar o aluno que chumba o ano, por falta de estudo, por falta de empenho, mas que no final organiza uma grande festa onde, evidentemente, é apreciado por todos.
Esta forma de gerir a causa pública tem atrasado Portugal. Notoriedade e competência não apresentam correlações obrigatoriamente positivas e, no caso da gestão da causa pública em Portugal, essa correlação tem apresentado em demasiadas vezes níveis altamente negativos.
Seria adequado, perante tanta incompetência disfarçada de competência, que os eleitos frequentassem formação específica para melhor entenderem quais são as suas responsabilidades e objetivos. Há, na política portuguesa, excesso de espelho e deficit de observação.
Professor de Gestão no ISCTE
e CEO do Taguspark
Subscritor do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”