Por Eduardo Baptista Correia
O conceito contemporâneo de democracia no século XXI, está intimamente ligado ao voto secreto, à separação de poderes, ao exercício da governação em função da causa pública, ao funcionamento da justiça, ao garante dos direitos e liberdades individuais, cívicas e ambientais e, por fim, à garantia da utilização de princípios e instrumentos que assegurem a meritocracia no que ao acesso e funcionamento de cargos públicos diz respeito.
Considero que o sistema da política e da governação na Terceira República Portuguesa pouco evoluiu relativamente ao estabelecido no último quarto do século XX, época em que as preocupações de regime focavam em matérias muito específicas resultantes do fim do sistema anterior. Como consequência, o sistema de funcionamento da política e da governação do Estado encontra-se exageradamente desenquadrado de eixos e requisitos que aos olhos do conceito de democracia são absolutamente essenciais. Se na altura parecia ter havido um salto qualitativo inimaginável, atualmente o patamar de funcionamento da política e da governação está excessivamente encastrado.
A manifesta interferência dos partidos políticos no funcionamento dos tribunais, na escolha dos juízes e na falta de recursos entregues ao sistema de justiça constitui prova inequívoca de interferência. O mau funcionamento, a lentidão dos processos e a falta de independência dos juízes do Tribunal Constitucional, são demonstrações claras de uma democracia profundamente fragilizada.
As frequentes demonstrações de nepotismo e favorecimentos dos membros dos partidos políticos, os recrutamentos massificados dentro dos partidos para o Estado e empresas publicas, os auxílios financeiros entregues aos partidos, a configuração obscura do funcionamento dos partidos e o modo como se fecham à envolvente, são a prova inequívoca da utilização do poder e do exercício de governação para favorecer interesses específicos.
A meritocracia e a transparência foram substituídas pelo favorecimento, nepotismo e opacidade. Esta prática altamente criticável torna o país uma zona infértil para quem quer evoluir em modo acelerado. Torna também pouco apetecível uma carreira de serviço publico. Constitui antes uma fonte de mau exemplo que contamina a sociedade portuguesa em geral.
A ausência de educação e incitamentos ao civismo e ao espírito de respeito pelo coletivo, e a falta de identificação de desígnios estruturantes, constituem prova da frágil evolução da democracia em Portugal.
Viver em democracia significa viver em transparência meritocrática, significa assistir ao funcionamento célere e independente da justiça, significa partilharmos causas e objetivos comuns, significa tomarmos conta e cuidarmos afincadamente da nossa terra. Por estarmos co dependentes necessitamos de melhor democracia.
Por termos combatido os favorecimentos do regime anterior, não estamos dispostos a aceitá-los neste.
Professor de Gestão no ISCTE e CEO do Taguspark,
Subscritor do “Manifesto: Por Uma
Democracia de Qualidade”